Jaqueline.Schmitt 30/01/2024Densidade, adolescência, medo, mulheres, horror e violência.Mandíbula, Mónica Ojeda. Tradução de Silvia Massimini Felix
Fernanda e Anelise são duas melhores amigas que estudam num colégio muito caro e católico de Guayaquil. Elas têm uma professora de Língua e Literatura chamada Clara, e em torno delas se desenvolve uma trama contada a partir das vozes das personagens, com diálogos, carta e narração em terceira pessoa.
Com muita pesquisa e referências que vão de Paulo Freire à Taylor Swift, passando por Lovecraft e Moby Dick de Melville, Ojeda constrói um enredo denso e amedrontador. A abordagem perpassa a adolescência, com suas transformações físicas e os sentimentos à flor da pele. Um momento intenso nas relações consigo, com amigos, escola e família.
A paixão pela literatura de horror e pelos filmes de terror dão o tom das personagens que criam histórias e se desafiam das formas mais assustadoras: ?O Deus Branco não tem rosto nem forma, mas seu símbolo é uma mandíbula que mastiga todos os medos.? O modo como as cores são usadas no romance também me fascinou: ?Clara não sabia que brigar com a melhor amiga podia ser tão vermelho.?
Podemos refletir sobre a imposição do medo como forma de controle na adolescência. Uma fase tida como intermediária, uma espécie de não ser, nem criança, nem adulto. O medo como uma estratégia para formatar as jovens para a sociedade, podar seus desejos por sentir, assim como nas religiões há um deus ao qual se deve temer e pedir por misericórdia. Ou seja, representam uma intenção parecida, manter corações revoltos sob uma determinada ordem, patriarcal e dogmática. Uma opressão que é reproduzida de várias formas, pela religião, escola e família.
Fiquei fascinada por tudo o que o romance me trouxe e com vontade de explorar um pouco mais dos temas trazidos, como o viés político e psicanalítico, que também está ali, não só com Lacan na epígrafe: ?Um grande crocodilo em cuja boca vocês estão. A mãe é isso.? Adoro essas histórias com personagens adolescentes, contadas com tanta força. Diante do horror da própria vida, elas criam suas próprias formas de sentir medo, um medo que elas podem controlar. Afinal, segundo Foucault, um corpo sobre o qual se exerce poder, também é um corpo que resiste.