Leticia.Machado 19/07/2024Que livro perfeitoUm romance com toques de suspense, muita contextualização histórica, valorização da escrita, literatura, poesia e memória, e uma reviravolta surpreendente. Esse livro vai falar sobre uma parte da história de Moçambique, sobre tensões e preconceito racial, sobre colonialismo, sobre memória, sobre literatura e poesia, sobre censura, sobre amor, sobre sexualidade, sobre liberdade, sobre a presença e os fardos do feminino. Poderia também dizer que o livro tem um quê fantástico em alguns momentos, coisa que pelo que pesquisei é típico da narrativa de Miau Couto, mas muito mais me pareceu algo da tradição oral e cultural da região, uma maneira típica de falar dos mais antigos que se âncora em crenças.
O título se faz compreensível ao longo da narrativa ao apresentar as várias ausências que marcam as vidas dos personagens, ausência paterna, ausência do marido, ausência da mãe, ausência de amor, ausência de liberdade, ausência de direitos. Como todas essas ausências definiram os caminhos dos personagens e daquele país.
Vi em algum lugar falando que os personagens e suas tramas eram rasos, unilaterais, sem profundidade. Crítica descabida essa, o desfecho do personagem do inspetor Campos nos mostra isso, como a complexidade dos personagens está mais do que presente e é uma camada a mais a ser interpretada na história.
Se tenho alguma crítica a fazer, não são bem críticas, alguns pontos da história não ficaram muito claros para mim, como o desfecho de Sandro e as relações que estabeleceu ao longo da vida. Ou a falta de profundidade em certos tópicos que permeiam a narrativa, mas acredito que nesse último caso, simplesmente eles não eram o ponto central da história, não havia razão para se aprofundar neles então, já que o ponto central é a memória.
A estrutura da história também merece atenção, talvez muitos não gostem(normalmente eu não gosto, mas dessa vez não me incomodou) pois ela ocorre em um tempo não linear. A narração é intercalada entre Diogo em 2019, os diários de seu pai em 1973, documentos do inspetor Campos em 1973 e também cartas e relatos dos demais personagens, transcritas ou relatadas por um dos personagens acima.
Esclarecido os pontos e características do livro, foi uma das melhores leituras que já realizei, tornou-se um dos meus favoritos facilmente. Vale a leitura e com certeza vale conhecer ainda mais do escritor moçambicano com quem tive aqui meu primeiro contato.