Julia Agnes | @pontoparagrafoo 13/10/2023"O homem nasce bom e a sociedade o corrompe" - Rousseau“Piranesi” é um livro de literatura fantástica e mistério, composto por 250 páginas ao todo, e gerou à Susanna Clarke o prêmio Women’s Prize for Fiction (um dos mais prestigiados prêmios literários no Reino Unido).
Publicado no Brasil em 2020 e apesar de não ter popularizado rapidamente, é um livro que divide opiniões entre os leitores. “Piranesi” conta com uma escrita de fácil compreensão e é dotado de outras referências literárias, como “As Crônicas de Nárnia”, de C. S. Lewis e experimentos pessoais do autor de “Admirável Mundo Novo”, Aldous Huxley, que inclusive, os inspiraram a escrever “As Portas da Percepção”.
O livro começa a ser desenvolvido em um cenário totalmente desconhecido para o personagem principal e para o leitor. Trata-se de uma dinâmica diferenciada a qual a escritora optou por seguir e que pode ter gerado resultados divergentes. Por ser tudo muito sugestivo nos primeiros capítulos, a leitura começa um pouco densa (detalhe este que, como mencionado no parágrafo anterior, modifica ao longo da leitura). Ademais, pensamos em inúmeras possibilidades do que seja “A Casa”, cenário no qual boa parte do livro é descrito, bem como quem o próprio Piranesi possa ser e como ele chegou à um lugar tão instável e surpreendente.
Ao longo destas 250 páginas, me surpreendi pela enésima vez com o quanto um livro pode trazer significados diferentes para cada etapa de nossas vidas. A cada nova descoberta e relato feito em seu diário, sentia as transformações que o personagem sofria e via sua inocência se esvaindo. Importante salientar como Susanna Clarke conseguiu causar a sensação de que viramos amigos de Piranesi durante a leitura e, sentimos por ele todos os anseios e medos que um amigo enfrentaria perante pessoas e situações perigosas. Conforme Piranesi descobre não ser o único a viver na Casa, sente uma felicidade genuína e este foi o ponto chave no livro em que me fez refletir sobre as más companhias durante a vida. Por nos sujeitarmos, às vezes, à tão pouco, à situação em que não cabemos mais ou que nunca fomos bem quistos e bem vistos. O segundo personagem, conhecido por Piranesi como “O Outro”, é a personificação de todas essas situações sociais descabidas pelas quais, pelo menos uma ou duas vezes na vida, já passamos e toleramos.
Consegui ver neste livro bem mais que uma crítica social. Houveram momentos em que me recordei de “A Esfera”, de Michael Crichton, autor de “Parque dos Dinossauros”. Ambos fazem uma reflexão sobre disputa de poder, do ego inflado e da manipulação que muitos líderes exercem sobre as massas, fato este existente desde o início da exploração econômica dos novos mundos.
Ensejando uma crítica fundamentada nestes dois tópicos, a autora levanta questões filosóficas sobre a essência humana. O homem nasce bom e a sociedade o corrompe, como nos deixou bem claro Rousseau. Um indivíduo que tinha tudo e beirava a arrogância com seu conhecimento, afastando de si as essências da vida, encontrou o que tanto que buscava ao fim de tudo? É exatamente isso que “Piranesi”, de Susanna Clarke traz ao leitor.
Gostei do fim e do livro como um todo. É uma experiência indescritível e um livro que leva o leitor a pensar muito, não apenas na leitura, mas na vida de modo geral. Mesmo que a autora tivesse optado por um desfecho diferente do escolhido, teria feito sentido de igual maneira. Mas, este mostra como o protagonista era forte e em busca de ser ele mesmo, escolheu aquilo que realmente o motivava e o fazia feliz.
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