"Socorro! Socorro!" - uma sugestão imprevista e fria de acontecimentos cruéis ou injustos que pairavam no ar, em círculos distantes dos interesses imediatos, mas que emitiam os seus fluidos de inquietação e exigiam responsabilidades, como garras que sufocassem a vida de mil seres.
Então esse alguém possivelmente despertasse para uma dimensão maior e pudesse ver uma esperança comum - uma fina e delgada rede de esperança comum-, naquela multiplicidade de vidas que se cruzavam nas ruas e praças. E pudesse também, a partir daí, imaginar uma sequência de pequenas multidões nos campos, nas fábricas, nas minas, nos escritórios, em infinitas
areas da terra e do mar, todas vivendo, morrendo, comendo, respirando, reproduzindo-se na invisível teia dessa imponderável esperança comum.
Deveria ele - o alguém - então caminhar mais apressado na tarde conquistada, guardando nos olhos o fulgor tão novo, que reproduzia a vibraçao nervosa da sua carne. E recordar que os sentimentos que o assaltavam de modo tão súbito eram incompreensíveis, talvez insolúveis, mas necessários, como pássaros de fogo sobre um mar tranqüilo.
(UMA VOZ ABAFADA)