O desastre, em certos casos, não poupa nenhum adulto. Você é criança de novo e sobrevive, perplexo, em uma ilha deserta. Todos os seus companheiros são garotos. No início, talvez ingênuos, e tão desaparelhados quanto você. Ficou atrás, sem qualquer utilidade, aquele mundo adulto das coisas aprendidas, das técnicas dominadas, ou de um saber que se acumulou em função de necessidades específicas — e, com freqüência, inteiramente artificiais. E é preciso, sobretudo, organizar-se. Que critérios presidirão a nova criatura e a nova sociedade, se só a infância se mobiliza? A inocência? Os jogos e brincadeiras? Você opina, discute, procura fazer valer o seu ponto de vista e as suas esperanças. Chegará, quem sabe, a figurar entre os líderes desse país de meninos. Mas cuidado: não existe liderança sem disputa. Não existe disputa sem um risco de briga, tumulto, guerra. Não vá contribuir para que nesse pequeno modelo de nova humanidade reapareça a antiga, e "adulta", com todos os seus vícios, enganos, fúrias, destruições. Por momentos,a tentação será forte. Afinal, criança ou não, você ainda pode ter muito das "pessoas grandes". E não é a pessoa grande ou pequena que está em jogo. É a pessoa humana. Se você quer ajudar a transformá-la, tem que partir de dados originais. Quais são esses dados? Serão eles compatíveis com a natureza em geral? Com as forças elementares que nos condicionam há milênios e milênios? Você pode achar que não. Pode mesmo, como outros garotos — por assim dizer —, fazer do novo projeto um projeto velho e sem nenhuma originalidade. Cair, decair, descer, regredir até a barbárie, até as cavernas, a fera. Mas também pode achar que sim: que tudo é renovável, que tudo é remissível, e não se deixar levar pelo SENHOR DAS MOSCAS.
Aventura / Ficção / Literatura Estrangeira