Um livro que busca desmistificar por completo a vida e a obra de Caravaggio, para que seja mais efetiva a leitura de suas invenções pictóricas. O acontecimento do título segue um conceito de Alain Badiou: o acontecimento como erupção do inédito. O mito dará lugar aqui a uma leitura ligada à pintura. Ao longo dos quatro capítulos que compõem o volume, defende-se que a visão de mundo do pintor é influenciada pela espiritualidade da época: por São Filipe Néri, nomeadamente (que por sua vez é influenciado por Francisco de Assis). Por outro lado, como alguns biógrafos já indicaram, a vida violenta do pintor foi antes uma vivência no seio do clima violento da Roma de então. A sua ausência de desenhos não se relaciona com nenhum tipo de ausência de reflexão formal ou composicional; antes enfatiza as particularidades da sua pintura, na qual fundo e figura se interpenetram, o que é reforçado pelas suas invenções luministas. Essas invenções não simbolizam, nem apenas modelam. A luz de Caravaggio não é “instrumental”, ela é pictórica, e apenas na pintura encontra as palavras que a explicam. E será através desta concepção moderna do seu ofício que o pintor vai procurar relacionar-se com as figuras da sua devoção.
“Como esperaríamos de um estudo inscrito no âmbito da teoria da arte, o presente livro nos oferece relevantes elementos para a contextualização da figura de Caravaggio em sua época, para a demarcação dos principais períodos da produção do artista, para o reconhecimento das filiações e especificidades técnicas de sua produção, assim como para o levantamento de bibliografia autorizada sobre a vida e a obra do pintor. Contudo, penso que o aspecto mais valioso de O acontecimento Caravaggio esteja justamente no fato de contribuir para uma reflexão, em certa medida também paradoxal, acerca do ineditismo da poética caravaggesca e, ao mesmo tempo, da vocação de toda a pintura para a invisualidade. Nesse jogo dialético entre o sui generis (próprio ao conceito de “acontecimento” formulado por Alain Badiou e seguido por Vidal, tanto neste livro como em sua tese) e o que é comum à arte pictórica, são examinados os “traços” mais definidores da obra caravaggesca: a luz, a escuridão, a relação entre ambas, seu suposto realismo e seu vínculo com a mística cristã.”
Artes / Filosofia