Polly 09/02/2022
Drácula: um livro que acontece nas entrelinhas (#167)
Drácula é o responsável pelo senso comum que habita o imaginário da cultura ocidental do que seja um vampiro, excetuando, é claro, uma geração inteira de millennials (e eu me incluo dentro dela) que acha que vampiros brilham no sol e podem ser “vegetarianos“. Em Drácula, vampiros são seres essencialmente das trevas, uma alma humana aprisionada em um monstro, que só podem ser derrotados com muito alho, crucifixo e estacas, além é claro de muita fé.
Mas não pense que o livro é uma sequência infinita de ação e de cenas horrorosas de monstros sugando pescoços alheios. Elas quase não acontecem, assim, diretamente nos nossos olhos. O que prevalece na narrativa é o mistério, é o relato indireto do que acontece quando se encontra o terrível Conde Drácula. O que vemos mesmo são pessoas muito confusas, adoecendo sem explicação e tendo suas vidas sugadas aos poucos sem se dar muita conta do que está acontecendo consigo mesmo. Há também a busca desenfreada do Dr. Van Helsing pelo monstro sugador de sangue, o qual está sempre escapando de suas mãos como se fosse água.
O livro é essencialmente bom, te prende porque ele está sempre prestes a falar o que você quer ler, mas ele também sempre adia por mais algumas páginas essa revelação, até que você chega ao seu final sem nem perceber. No entanto, tenho que falar de algo que me incomodou: a narrativa é machista. Mina Harker é a única, tirando o Dr. Van Helsing, que consegue solucionar os problemas causados pelo temível e misterioso Conde Drácula, mas ela é sempre deixada de lado só por ser mulher e “ter uma constituição delicada” (aceitando isso de muito boa vontade, inclusive). Ela não serve para enfrentar o monstro, apesar de ser mais inteligente que todos ali, e, juro, passei o livro todo querendo ver ela fazer isso. Para você ter noção, existem passagens mais ou menos do tipo “Mina tem cérebro de homem, pois é muito inteligente, mas ainda tem a doçura de uma mulher”. Difícil ler isso no século XXI, né? Mas, bem, a gente põe na cabeça que é um livro do século XIX e segue. Está tudo certo.
Por fim, é inegável que Drácula é um clássico, não à toa se tornou a mais famosa história do terror gótico sobre vampiros. Se Bram Stoker tivesse escrito um século depois, talvez, o livro fosse perfeito (risos). Indico a leitura.