jota 17/04/2012Sentimentos ilhados Este livro é bastante volumoso (558 páginas) mas sua leitura é fácil e agradável. Passa-se em ambientes extremamente masculinos (pescarias, bebedeiras, bares, prostíbulos, caça a nazistas, etc.) e vem recheado de palavrões. Muitos palavrões; e cabeludos. Tem mais de chance de agradar aos leitores do que às mulheres, penso (mas costumo de enganar de vez em quando, sim).
Há uma curta (apenas quatro páginas) porém excelente Apresentação do escritor Luiz Antonio Aguiar, que resume a história com primor e ajuda a esclarecer alguns pontos do romance que porventura pareçam meio obscuros para o leitor – especialmente no que diz respeito ao comportamento do protagonista, Thomas Hudson, abalado por duas tragédias em sua vida.
Este As Ilhas da Corrente foi publicado apenas em 1970 (nove anos após o suicídio de Hemingway) e é bastante autobiográfico, especialmente no que diz respeito à parte III do livro, a caça aos nazistas no Caribe, durante a II Guerra Mundial, em que se passa a maior parte da história. Mas a própria personalidade do personagem tem muito a ver com o verdadeiro Ernest Hemingway.
A história começa na década de 1930, quando o pintor Thomas Hudson (artista e aventureiro como seu criador) recebe, em sua ilha Bimini, no mar do Caribe (onde passa a corrente marítima quente do Golfo do México), a visita de seus três filhos adolescentes, Tom Jr., David e Andrew, frutos de dois casamentos.
Se não viaja com eles para Paris, uma vez por ano, durante cerca de um mês no verão, ele os recebe para passar as férias escolares na ilha. Hudson não gosta de viver cercado de muita gente, mas depois que os filhos vão embora, durante algum tempo ele sente muitas saudades dos três (também da mãe de Tom Jr., seu grande amor).
Depois passa, ele volta a sua rotina de trabalho, leituras, bebedeiras, pescarias, etc., tendo quase que apenas o criado e cozinheiro Joseph como companhia no restante do ano ou, eventualmente, a companhia de uns poucos amigos. Mas desta vez algo aconteceu depois da partida dos meninos. E vem uma notícia ruim, diretamente da Europa e ainda não é a guerra. É para lá que Thomas Hudson vai. E nisso termina a parte I do livro.
A parte II se passa quase toda em Cuba, já durante a II Guerra Mundial, depois do regresso de Hudson da Europa. Do mesmo modo que na parte I, em que quase toda a ação se concentrava numa pescaria em alto mar em companhia dos filhos e uns poucos amigos e empregados, a segunda parte, um capítulo único - depois de uma comovente declaração de amor ao gato Boise (e a outros animais, incluindo a cadela Negrita) -, é, na verdade um enorme diálogo (brilhante, pleno de humor, sutil) entre Hudson e uma velha prostituta, Honest Lil.
Essa parte termina com a chegada da ex-primeira esposa, uma estrela de cinema, mãe de Tom Jr. para uma breve visita de poucas horas. E fatos são revelados. Dolorosos...
A parte III se passa toda no mar, nas ilhas da Corrente. Aguiar nos informa que “num dos episódios pitorescos de sua vida, Hemingway, na Segunda Guerra, com amigos, armou e abasteceu um iate para ir à caça de submarinos nazistas nas proximidades de Cuba. Nenhum navio foi localizado pelo grupo, mas uma espantosa quantidade de bebida foi consumida a bordo em um curto período.”
Ao contrário da realidade, na ficção, a participação do personagem Thomas Hudson na guerra não se dá desse modo cômico, e termina de maneira trágica – ele se comporta como alguém que estivesse buscando a morte, o suicídio. Mais ou menos do jeito que Hemingway pôs fim a sua vida em 2 de julho de 1961.
Lido entre 13 e 17.04.2012.