Lira dos vinte anos

Lira dos vinte anos Álvares de Azevedo




Resenhas -


3 encontrados | exibindo 1 a 3


joao.vitor. 22/10/2022

Uma ode à melancolia
A obra "Lira dos Vinte Anos" (1853) é uma antologia poética publicada postumamente após a morte de seu autor, Álvares de Azevedo. Situa-se no ultrarromantismo (ou segunda geração romântica), período da literatura brasileira marcado, entre outros, pelo sentimentalismo e individualismo exacerbado, perspectiva idealizada do amor e da mulher amada, visão pessimista da vida e mecanismos de evasão da realidade, seja através do onírico ou do mórbido.

Um recurso interessantíssimo da obra original preservado por esta edição são os prefácios que, de modo geral, aparecem logo após o título de cada poema. Eles fazem referência a outros autores que provavelmente, exerceram forte influência no fazer poético azevediano, como Lorde Byron, Goethe e Shakespeare.
A Lira constitui-se em três grandes divisões:

Na primeira, predominam a supervalorização do amor (a sua pura contemplação faz-se recorrente) e o fascínio pela ideia de morte, ante a possibilidade de não concretização da relação amorosa. É sobretudo no cenário onírico que o eu lírico inebria-se com suas fantasias irreais, donde surge a mulher idealizada, a virgem intangível, causadora do sentimento platônico daquele. O erotismo também se faz presente, embora de maneira sutil.
Uma das minhas poesias prediletas dessa parte inicial é "Anima Mea", onde Azevedo manifesta o sentimentalismo do eu lírico relacionando-o às características da natureza:

"É a voz do sabiá: ele dormia
Ebrioso de harmonia e se embalava
No silêncio, na brisa e nos eflúvios
Das flores de laranja... Ilná, ouviste?"

Outro que considero fascinante é "A Tempestade" (deste restou somente um fragmento do original). Seguem alguns trechos:

"O céu enegreceu - lá no ocidente
Rubro o sol se apagou
E galopa o corcel da tempestade
Nas nuvens que rasgou!
[...]
Nas trevas o relâmpago fascina,
A selva se incendeia;
Chuva de fogo pelas serras hirtas
Fantástica serpeia...
[...]
Jeová! derrama em chuva
Os teus raios incendidos, Tua voz na tempestade
Reboa nos meus ouvidos!"

Neste, Álvares de Azevedo presenteia-nos com uma ode à natureza, construída num clima concomitantemente tempestuoso e belo. Creio que as forças sobrenaturais incontroláveis expostas no poema se configuram numa metáfora dos sentimentos apaixonados da voz poética, bem como uma forma de refúgio frente às desilusões do mundo objetivo. Nota-se também um caráter religioso, na medida em que o eu lírico exalta a Deus, reconhecendo a Sua grandeza em meio ao caos reinante.

Na segunda parte, conforme alerta o próprio autor, "[...] dissipa-se o mundo visionário e platônico [...]" (AZEVEDO, 2018, p. 121). Os poemas são mais extensos, muitos, inclusive, contendo várias subdivisões. Quanto ao conteúdo, evidencia-se, por exemplo, o apego a valores socialmente desmoralizados e característicos da vida boêmia, como a bebida e o fumo. “Spleen e charutos”, mormente em sua terceira parte, intitulada “Vagabundo”, ilustra muito bem tais questões:

“Namoro e sou feliz nos meus amores;
Sou garboso e rapaz... Uma criada
Abrasada de amor por um soneto
Já um beijo me deu subindo à escada...
[...]
Tenho por meu palácio as longas ruas;
Passeio a gosto e durmo sem temores;
Quando bebo, sou rei como um poeta,
E o vinho faz sonhar com os amores.”

Em contrapartida, há poemas que se distanciam desse estilo de vida hedonista. Nessa senda, acredito que o mais representativo seja "Ideias íntimas", que evoca um ambiente solitário e, de certo modo, claustrofóbico; por meio dele, acompanhamos o eu lírico em sua sensação de desconexão com o mundo:

“Pelo meu corredor, sem companheiro,
Sem ler, nem poetar. Vivo fumando.
Minha casa não tem menores névoas
Que a deste céu d’inverno... Solitário,
Passo a noite aqui e os dias longos;
Dei-me agora ao charuto em corpo e alma.
[...]
Reina a desordem pela sala antiga,
Desce a teia de aranha entre as bambinelas
À estante pulvurenta. A roupa, os livros
Sobre as cadeiras poucas se confundem.”

Por fim, na Terceira Parte tem-se um misto da forte idealização amorosa e da obcecação pela morte como libertação para os conflitos internos do eu lírico. É relevante enfatizar que Álvares de Azevedo, segundo estudiosos, sempre teve uma saúde frágil, e foi fortemente afetado por mortes de pessoas próximas a ele; ademais, já na vida adulta ele foi acometido pela tuberculose, doença sobre a qual, na época, não havia perspectiva de cura. Daí a fixação pela vontade do fim à sua existência. Sobre isto, destaco alguns trechos de “Lembrança dos quinze anos”, um dos poemas mais marcantes e de alto cunho autobiográfico dessa última parte:

“Nos meus quinze anos eu sofria tanto!
Agora enfim meu padecer descansa;
Minha alma emudeceu, na noite dela
Adormeceu a pálida esperança!
[..]
Já não sinto ambições e se esvaíram
As vagas formas, a visão confusa
De meus dias de amor, nem doces voltam
Os sons aéreos da divina Musa!
[...]
Repousa no meu peito o meu passado,
Minh'alma adormeceu por um momento...
Sou a flor sem perfume em sol d'inverno...
Uma lousa que encerra?... o esquecimento!...”

Belíssimos versos taciturnos... mais do que uma questão estética, é um mergulho no âmago da consciência humana. Triste fato, porém, que o poeta cogitasse a ideia de morte como alívio para todos os seus problemas. Infelizmente, nem todos nós reconhecemos que Jesus fez-se o Cordeiro Imolado na cruz, numa experiência terrivelmente dolorosa e agonizante como nenhuma outra; e que por amor a nós, revelou a profundidade do amor de Deus e, consequentemente, enquanto mistério divino, visou garantir a nós a plenitude da vida.

Se eu pudesse escolher o aspecto mais marcante na obra de Álvares de Azevedo, seria a intensa manifestação da subjetividade. O eu lírico materializa a voz do poeta, em especial suas experiências particulares com os dissabores da vida, constituindo o centro da sua expressão poética. Embora constantes nas produções poéticas ultrarromânticas, os temas a elas intrínsecos são retratados de forma singular por este notável jovem do século XIX.

Pessoalmente, foi uma experiência deleitável: trata-se do meu primeiro contato integral com um livro de poesias, e descobri-me imerso nessa dialética de leitura, onde, para além da simples apreciação estética, busquei explorar os inúmeros sentidos que os versos são capazes de nos proporcionar.

Com Lira dos Vinte Anos, Álvares de Azevedo deixa um impacto significante para a poesia brasileira, influenciando, para além de seus contemporâneos românticos e posteriores, incontáveis poetas de hoje que sentem o desejo de materializar o seu espaço íntimo por meio da escrita.
comentários(0)comente



jubaru 12/08/2022

Bom...
Os poemas são lindos, mas a maioria é sobre o mesmo assunto, as 3 noites em que ele esteve com uma mulher, musa da obra do autor.
Por isso, a leitura do primeiro momento se torna entediante e pedante.

Mas o livro não se torna ruim por isso! A segunda parte é muito boa, não consegui parar de ler. No meu poema favorito, o Álvares conta uma história, a história de um poeta, em várias "partes", cada uma representando uma escola literária.

Já na terceira parte, ele volta a abordar a saudades e o amor que sente, com um pezinho na religião. Se arrepende e pede perdão, afirmando que sente que irá morrer (e o autor realmente morre pouco tempo depois).
comentários(0)comente



Rayssa 14/09/2021

Essa não é uma resenha útil
Li esse livro porque nunca tinha tido contato com algo do tipo e queria ver se gostava. Não gostei. Não gosto dessa coisa suplicante e sentimentalista que o autor traz na maioria dos poemas, mas isso não diz nada sobre a qualidade do livro, afinal, de acordo com o período em que ele está inserido é característico esse tipo de escrita. O que posso dizer é que não entendo nada sobre poesia então provavelmente isso influencia muito na minha impressão sobre a leitura.
comentários(0)comente



3 encontrados | exibindo 1 a 3


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR