Michele Soares 23/01/2024
Um lance de dados etc
Aqui tem poemas excelentes. Não pouco excelentes. Muito. Aqueles de desenhar "!" e "gênia" no final da página. Esses poemas excelentes e que me dão vontade de escrever uma carta (rídicula e, portanto, de amor) dizendo "Adília, eu entendi" convivem com poemas que me deixaram "então tar". É assim, o incrível convive com o mediano, como o bem convive com o mal. Inclusive, o livro é todo nuançado nas coisas do coração humano, coisa difícil que exige o melhor dos melhores romancistas. Um poema é todo terno, a amargura muito bem diluída que de tão diluída parecendo ausente. E esse poema doce logo se segue a um poema amargo, dos incômodos, dos desencontros, das desavenças. E dos vazios. O último poema pra mim já vale a leitura do livro inteiro. No final, gosto do que entendi e gosto do que não entendi. Do doce porque doce, do amargo porque amargo. Fora que ela é dona de uma dicção muito própria, que você logo reconhece e reencontra na voz de outros poemas, se for leitor mais ou menos ávido dos contemporâneos. Atualmente, o fazer poético nas línguas lusas não passa ileso dos versos prosaicos da Adília. Da sua tragicidade tão cômica quanto mordaz. Gosto disso na poesia dela. Não dá voz aos mocinhos, mas também aos vilãozinhos. Jogo perigoso esse de se encontrar nesse texto. E por isso mesmo, duplamente recomendado.