Maria 04/05/2024
Deus é o choro de todas as mulheres
Ler Estela sem Deus de início me pareceu que iria ser algo rápido, poético e sensível. Eu não sabia o que estava por vir, pois apesar de suas poucas páginas, o que encontrei aqui foi mais e mais e mais de mim mesma, em recortes de muitas mulheres, nas dores delas, na violência delas, em seus prantos, em suas indagações, em suas mágoas. Estela vem para ser muitas de nós, um retrato cru do que nos é oferecido da vida, e do que nos sobra para fazer com isso. Desde muito cedo é apresentada a crueldade, beleza e a incerteza do mundo, aos seus princípios e ao que ele toma como verdade, e então de frente disso tudo, quem ela deve então se tornar?
Estela é os pensamentos que me assombram a noite, e o chamado que as vezes sinto em minha mente, bem no fundo, é o silêncio que carrego desde muito cedo, ela é muitas, que se tornam uma só em suas dores.
"Deus sempre foi mulher. Seria mais honesto pensar dessa forma. Suportar a vida como elas fizeram, dar conta de tudo era sobre-humano. Tive uma dor no peito que me trouxe outra revelação: a de que Deus era, na verdade, a minha mãe limpando o chão na casa das madames. Deus era a minha mãe tendo de sustentar a casa sozinha porque meu pai nos esquecera. Deus era a minha tia cuidando do tio Jairo com derrame. Deus era a Melissa querendo voar pela janela. Deus era a minha madrinha Jurema suportando o Padilha. Deus éramos nós sendo violentadas."