Nicole 07/06/2024
"A primeira coisa que nos diz uma obra de arte é que o mundo da liberdade é possivel, e isso nos dá força para lutar contra o mundo da opressão"
Vidas secas foi o primeiro contato que tive com a escrita de Graciliano Ramos, e me supreendi bastante com a forma que ele abordou temas tão recentes em um século diferente do nosso.
O livro em si tem pouca comunicação entre os personagens, que, em meu ver, não se falavam muito devido a luta diária para sobreviver na seca. A história começa quando os cinco membros da familia: Sinhá Vitoria, Fabiano, a cachorrinha Baleia e o Filho mais velho e o mais novo (cujos nomes não são ditos no livro), procuram alguma sombra no meio da seca, famintos e cansados. Por sorte acham um pequeno sitio, onde moram de favor e ,em troca, Fabiano se oferece a ser Vaqueiro do local para o proprietário.
Durante todo o livro, é perceptível o sofrer dessa familia, sendo eles submetidos a fome, escassez de água, desprezo e enganação, tornando o enredo um baque para o mundo literário idealizado que a maioria consome.
"...mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra. Olhou em torno, com receio de que, fora os meninos, alguém tivesse percebido a frase imprudente. Corrigiu-a murmurando:
— Você é um bicho, Fabiano."
O trecho acima mostra Fabiano se autodenominando de ´bicho´. Isso nos mostra que Fabiano passava por uma insegurança habitacional, morava de favor e, por esse motivo, era um bicho, pois era incerto quando iria possuir ou não uma moradia digna para o conforto de seus filhos e sua mulher.
Fabiano sonhava em dar uma vida digna para sua familia; Sinhá Vitória sonhava em ter uma cama igual a do Seu Tomás da Bolandeira, pois dormiam desconfortavelmente em uma cama de taipo; O Filho mais velho era muito interessado em palavras, e o Mais novo queria ser vaqueiro igual o pai; Baleia sonhava em um mundo cheio de preás, os quais poderiam encher sua barriga esquelética.
E durante todo o livro é assim, uma familia esperançosa tentando sobreviver à seca e a fome, com sonhos e desejos igual todo ser humano, porém, sem o direito basico de uma alimentação garantida e uma vida digna.
“Pois não estava vendo que ele era de carne e osso? Tinha obrigações de trabalhar para os outros, naturalmente, conheciam o seu lugar. Bem. Nascera com esse destino, ninguém tinha culpa de ter nascido com um destino ruim. O que fazer? Você poderia mudar uma espécie? Se você dissesse que era possível melhorar a situação, espantar-se-ia. Tinha vindo ao mundo para amansar brabo, curar feridas com rezas, retornar cerca de inverno a verão. Era sina. O pai vivera assim, o avô também. E para trás não existia família. Cortar mandacaru, ensebar látegos — aquilo estava no sangue. Conformava-se, não pretendia mais nada. Se você dissesse o que era dele, estava certo. Não davam. Era um infeliz, era como um cachorro, só recebia ossos. Por que seria que os homens ricos ainda lhe tomavam uma parte dos ossos? Fazia até nojo pessoas importantes se ocuparem com porcarias semelhantes.”
― Graciliano Ramos, Vidas secas