laraanja0 14/01/2024
”Mas, acredite em mim, o Destino não se importa com o que acontece na maior parte das vezes.”
“O Castelo No Ar” é uma fantasia que explora a história (e as fanfics) de Abdullah, um jovem vendedor de tapetes de Zanzib, que, apesar de ter uma boa vida, é mensalmente perturbado pela insuportável família da primeira esposa de seu pai, que deixou pouco de sua herança para o filho, por causa de uma profecia feita no dia de seu nascimento — mas que o garoto não se importava muito. Adbullah é um jovem criativo; em seu tempo livre, ele fantasia ser um príncipe que foi sequestrado por um bandido horrível, adotado por seu falecido pai e destinado a se casar com uma linda princesa. Certo dia, o protagonista acaba comprando um tapete mágico de um homem estranho, e ao dormir em cima dele, acorda em um belo jardim, onde conhece Flor da Noite, a princesa de suas fantasias. Os problemas começam quando Flor da Noite é sequestrada por uma criatura inesperada, e Abdullah começa a perceber que mais de suas fantasias vão ganhando vida, tanto os bons como os maus momentos.
Opa, a partir daqui terão muitos spoilers.
“Eu não! — replicou Jamal. — Sou um defensor do livre arbítrio. Se meu cachorro opta por odiar toda a raça humana, com minha exceção, ele deve ter liberdade para isso.”
Estava muito animada para ler o segundo livro do box de O Castelo Animado. Essa série de livros se tornou extremamente especial para mim, e carrega um imenso valor sentimental. Aprendi com o primeiro livro da trilogia que adoro ler livros de fantasia com músicas… ambientais (?) como sons de florestas ou de vilas vindas direto de contos fantasiosos, o que provoca uma atmosfera verdadeiramente incrível, recomendo muito. É o primeiro livro onde decido escrever uma resenha que foque em mais pontos da história e que não seja só eu dando um geral sobre o livro e sobre o que senti (chorei ao som da música tema de Castelo Animado quando ela começou a tocar enquanto estava lendo) então sim, talvez seja bem maçante e ninguém de fato leia.
”Este tapete — disse Abdullah —, ao contrário de você, é de um encantamento tão puro e excelente que só ouve a linguagem mais delicada. Ele é, no fundo, um poeta entre os tapetes.”
Um aspecto do livro que me interessou muito foi o jogo de palavras, se é que posso chamar assim. Percebo que isso é bem comum em livros de fantasia, onde há várias barganhas e enigmas, que muitas vezes não mentem, apenas escondem a verdade, mas o livro explora um pouco mais, caracterizando os personagens do sul. Os cidadãos de Zanzib aparentam ser sempre muito cordiais ao se dirigir as outras pessoas, o que me deixava confusa e um pouco irritada no começo, mas foi me divertindo ao passar das páginas, de “nobre admirador da humanidade” e “coroa e o diadema da prancha de desenho” ao “safira dos soldados” e “jade azul dos gênios”.
”Beatriz diz que homens que não fazem nada além de belos discursos dão péssimos maridos.”
Gosto da forma com que o livro mostra grande variedade de pessoas ao decorrer de momentos importantes para a narrativa. Flor da Noite, por exemplo, tinha como figura masculina apenas seu pai, o sultão de Zanzib, por nunca ter saído de casa, então pensava que todos os homens eram iguais a ele: meio carecas e barrigudos. Abdullah conseguiu mostrar para ela, através de vários desenhos e pinturas, como as pessoas eram diferentes, e me diverti tentando imaginá-las. A diversidade entre as princesas sequestradas também foi algo que me cativou: princesas diferentes, desde Valeria que tinha apenas quatro anos, até princesas idosas e outras que já eram mamães (de, meu Deus, 14 filhos). Sou o tipo de pessoa que tenta imaginar a história de personagens secundários como se esses fossem os protagonistas de seus próprios livros.
Mesmo assim, o livro contém algumas falas que apontam o aspecto físico de personagens gordas como algo negativo. Achei importante a Galera Record ter posto uma nota contextualizando o momento em que o livro foi escrito, o que não justifica comentários preconceituosos, mas se torna um pouco mais compreensível tendo em vista que pouco se falava sobre isso em nossa sociedade, décadas atrás.
”Era hora de uma mulher determinada assumir o comando. Abdullah estava contente por Sophie ser essa mulher.” ou ainda, ”Ele é o melhor mago em Ingary ou em qualquer outro lugar. Se tivesse tido tempo, teria derrotado aquele djim. E ele é manhoso, egoísta, vaidoso como um pavão e covarde, e não se consegue força-lo a nada.”
Comprei o box pela vontade de conhecer mais da história de Howl e Sophie, então estarei sendo honesta em dizer que fico aguardando ansiosamente por migalhas de aparição dos personagens do primeiro livro nos outros dois. Adorei como os introduziram pois me pegou de surpresa, não uma, mas três vezes. Imaginei que Howl, Calcifer e Sophie apareceriam porque Abdullah precisaria encontrar um mago que o ajudaria na sua busca por Flor da Noite, mas na verdade, esses personagens estiveram presentes por grande parte da trajetória do protagonista.
Sempre acho que não consigo expressar o que sinto ao ler sobre O Castelo Animado, porque foi (e ainda é) um conto que me marcou muito; me senti nostálgica ao ler e imaginar como a vida dos protagonistas do primeiro livro continuaram, agora com um bebê, Morgan, vulgo o gatinho Atrevido! Foi divertido ver as peças se encaixarem também, perceber que a personalidade forte do gênio e da gata preta faziam sim sentido, por serem Howl e Sophie respectivamente, e que o tapete mágico era na verdade Calcifer, que gostava de ser bajulado por Abdullah (e que mesmo agora, não consegui entender qual é a tal palavra que o fazia voar). Eu deveria ter notado antes que o Castelo no Ar e o Castelo Animado eram, no fim, a mesma coisa, parece que só há espaço para um castelo diferente nas terras de Ingary.
”Esse é o tijolo solto onde eu costumava esconder dinheiro. Espero que eles tenham espaço.” — Sophie como eu estava com saudades de você, sério
”Você está sendo infantil — disse o gênio. — Ou heroico. Ou talvez louco.” — Amo ele
”Se estiver escrito na profecia de que Flor da Noite vai se casar com um sapo, então me transforme em um.”
Ao meu ver, o maior ponto negativo da história foi o romance fraco. A história tenta seguir pela trope de amor a primeira vista, e, de fato, não li muitos desse tipo para falar com propriedade sobre, mas acredito que não é assim que as coisas deveriam funcionar. Apesar de todas as coincidências e profecias terem construído uma dinâmica legal, quando analisada ao final do livro, o romance entre Abdullah e Flor da Noite não é cativante e chega a ser muito mais sobre como Abdullah está diante de uma fantasia dele, que agora era real, tendo medo de perdê-la e ter que voltar para sua realidade (onde a família da primeira esposa de seu pai queria que ele se casasse logo com as jovens que escolheram para obter vantagens sobre a profecia), e não sobre amor de fato.
No segundo encontro dos protagonistas, ainda no jardim, eles decidem se casar, e como uma fã de slow burn, achei um absurdo: eles mal se conhecem e me irrita um pouco o fato de que o garoto passa praticamente o livro inteiro em busca de um princesa que duvido que ele soubesse qual a comida preferida dela, por exemplo, ou algo que ela gostasse de fazer. Abdullah frequentemente pensa sobre como Flor da Noite é incrivelmente linda ou como nunca conseguiria imaginar que ela faria certas coisas, como simplesmente dar uma risadinha feia; esses pontos só reforçam que, ao meu ver, foi um romance forçado onde eles não estavam de fato apaixonados, e sim diante de uma figura que sempre foi idealizada e uma oportunidade de um futuro igualmente idealizado, cheio de outras fantasias, ignorando a imperfeição e a realidade (quem diria que eu, leitora de romance, estaria metendo essa). Na minha visão, o protagonista chegou a ter mais intimidade com Sophie, que passou metade do livro na forma de um gato, do que com sua noiva. Simplesmente não consigo ver esse romance dando certo do jeito em que foi construído, mesmo que eles tenham, realmente, se casado.
Sobre o conflito da história, cheguei a pensar que não fazia sentido algum uma criatura tão poderosa ter um problema tão mesquinho: Dalzel era um djim, mas não conseguia encontrar um esposa, o que vez toda a história se mover. Mesmo assim, no final, não achei de todo mal; às vezes, um conflito bobinho é o que me faz passar horas navegando por cerca de 350 páginas, e mesmo entidades têm uma parte de si que são egoístas. Mesmo assim, acho que o conceito dos djins do bem e do mal é confuso, porque em muitos momentos, Hasruel acaba sendo tão malvado quanto o irmão.