spoiler visualizarMarcelo Lino 13/07/2016
ARTIGO SOBRE O LIVRO
No livro Pós-Guerra, o historiador Tony Judt reconstitui um período complexo e decisivo da história, da derrota do nazi-fascismo à consolidação da União Europeia, passando pelos anos da Guerra Fria, em um texto esclarecedor, sendo sempre didático em suas colocações e outras vezes sendo bem demorados em alguns capítulos, devido ao cuidado dos dados colocado por ele, como por exemplo, referentes aos projetos de reconstrução da Europa, o autor começa seu discurso dizendo que logo em sequência da segunda Guerra mundial a perspectiva da Europa era de miséria e desolação total, porquanto uma guerra que envolveu civis e militares, deixando todo um continente traumatizado e uma Europa dividida; o autor ainda diz que neste período, na Segunda Guerra Mundial, onde pela primeira vez, foi mobilizado todo o poderio do Estado europeu moderno, e com o objetivo principal de conquistar e explorar outros europeus, e em meio a tamanha devastação é de se admirar como a Europa conseguiu se recuperar nos anos que se seguiram. Como diz o próprio Judt ``A Europa não renasceu do projeto otimista, ambicioso e progressiva imaginado com bons olhos pelos idealistas que hoje defende o euro. A Europa foi uma filha insegura da ansiedade´´ Com um olhar crítico, faz um relato detalhado das perdas e danos matérias após a guerra com o fim de mostrar que além das perdas humanas houve muitos danos e que as cidades ficaram em ruinas, como a própria cidade alemã que estava reduzidas aos escombros de metal retorcido soltando fumaça, a riqueza dos dados com que o autor faz sua exposição é importantíssima, assim há uma clara ideia das consequências da destruição nos vilarejos, nas florestas, e dos números assombrosos dos mortos, dos interiores até as grandes cidades de inúmeros países, fome, doenças, tudo multiplicado devido aos conflitos armados, a luta dos deslocados e refugiados que faziam de tudo pra sobreviver não apenas a guerra generalizada, mas a uma série de guerras civis local; dados assustadores, segundo o Judt, Stalin e Hitler expatriaram, deslocaram, expulsaram, deportaram e dispersaram cerca de 30 milhões de pessoas, destes, segundo autor, 19 milhões tenham sido civis não combatentes. Neste período onde alemães do leste europeu fugiam para o oeste, segundo Judt, estes não tinham escolha, era questão de sobrevivência e claro que estes refugiados não eram recebidos de braços abertos onde chegavam, o autor diz que pesquisas nos EUA e na Europa revelava isto.
Com relação aos judeus que viviam o problema da guerra e foram perseguidos, a princípio, as autoridades acidentais lidavam como qualquer outro grupo, reunindo-os em acampamentos na Alemanha ocidental; o autor diz que embora recebidos no ocidente, não eram bem-vindos, e não se cogitava devolver os judeus para o leste da Europa. Em meio a tamanha dificuldade de se manterem vivos e sendo destituídos de dinheiro, bens, casas, lojas e empresas, os Judeus ironicamente permaneceram na Alemanha até ter sido resolvido esta situação com a criação do Estado de Israel em 1948. Judt afirma que, com o fim da Guerra e a vitória sobre os nazistas e fascistas só significou o fim das batalhas armadas, mas não o fim de inúmeras perseguições políticas e religiosas, tudo isto para punir fascistas, e segundo o autor, pessoas eram perseguidas e severamente punida simplesmente porque seu maior crime era pertencerem ao grupo social errado, estarem associados a alguma comunidade religiosa ou partido político inoportuno, ou apenas disporem de visibilidade ou popularidade na comunidade local. Entre tantos pormenores que Judt narra, segundo ele o que causava mais indignação em meio a uma Europa destruída era que em alguns locais a pena de morte eram comuns à época e suscitavam pouca oposição, ele deixa claro que a evidente falta de coerência das punições tenha mesmo comprometido a validade dos processos, sem falar que muitas penas eram determinadas por juízes e júris cujo histórico pessoal durante a guerra era bastante maculado. Tony Judt descreve ainda a magnitude da calamidade europeia e como isto abriu novas oportunidades a reabilitação da Europa, era impossível voltar ao estado em que estava a Europa antes das guerras, mas devido a movimentos que operaram na época, a existência de grupos clandestinos, na sua maioria jovens de ambos os sexos na maioria dos países da Europa ocidental, Judt narra como cada país fez medidas para ser recuperar, uns com mais eficiência que outros, e durante o pós-guerra era o investimento público uma das formas de saídas, numa época de aguda escassez de capital e de imensa demanda por investimento em todos os setores, planejamento governamental envolvia escolhas difíceis: onde alocar os limitados recursos do Estado e às custas de quem? Segundo o autor, no Leste Europeu, a ênfase recaía, inevitavelmente sobre gastos com infraestrutura básica, como rodovias, ferrovias, fábricas, serviços públicos essenciais. Mas, com isso, restavam poucos recursos para alimentação e moradia, menos ainda para serviços de saúde, educação e assistência social, e absolutamente nada para bens de consumo supérfluos e com isto devido a depressão econômica, tanto o fascismo quanto o comunismo prosperaram com o desespero social, com o abismo que separava os ricos dos pobres. Passados os primeiros anos de crise, e a economia se restabelecendo no continente, acontece algumas alianças, uma nova geopolítica, marcada pela divisão dicotômica dos países devido as diferenças, mas esquecendo o passado para construir um novo futuro. E foi assim que aconteceu em muitas regiões e países, que tiveram que salientar uma memória de totalitarismo ou de democracia a fim de se reajustarem a novos modelos políticos, diz o autor que também foi devido o surgimento de Estados previdenciários onde de modo geral os europeus puderam viver mais e com mais saúde. Outro ponto importante de destaque que merece atenção é que após a morte de Stalin o governo foi assumido por um colegiado, e a secretaria do partido ficou com Nikita Kruchev que iniciou a política de desestalinização, após denunciar as arbitrariedades de Stalin no Congresso do Partido Comunista da União Soviética antigos dirigentes ligados a Stalin foram substituídos por pessoas mais jovens e dinâmicas no Comitê Central do Partido Comunista, enquanto isto na Europa ocidental se viu subitamente numa era de extraordinária estabilidade política.
Pela primeira vez em quatro décadas os Estados da metade ocidental do continente não estavam em guerra, Judt coloca que a década de 1960 testemunhou o auge do Estado europeu e que este Estado passa a servir os cidadãos, diferente do passado, que o contrário prevalecia; O sucesso do capitalismo europeu afirma ele ``no pós-guerra foi acompanhado pelo aumento da importância do papel do setor público; Outro ponto, era a intervenção do Estado em indústrias, transporte público, comunicações, mas respeitando a liberdade da livre iniciativa``. Dadas as circunstâncias do pós-guerras, Judt destaca também a postura da Igreja católica que com o Papa João XXIII que convocou novo Concílio do Vaticano II, com o propósito de lidar com essas dificuldades e atualizar as atitudes práticas da Igreja, que foi discutindo importantes mudanças na estrutura da Igreja Católica e procura deixar claro qual é o papel da Igreja no mundo moderno e tecnológico.
Judt destaca alguns pontos importantes dos EUA que ao contrário da Europa que sofreu diretamente com a guerra em seu continente os EUA não tiveram seu território e sua população civil atacados em intensidade, devido a isto, segundo o autor a percepção da guerra nos EUA foi deferente porque eles não conheceram a crueza e o horror da guerra. Um dos grandes índices para se mensurar os danos de uma guerra é a baixa de civis. Os EUA tiveram pouquíssimas guerras comparativamente. Os momentos de guerra foram positivos para a economia norte-americana. Judt afirma que os EUA se projetaram internacionalmente após a Primeira Guerra e com o Plano Marshall, tornou-se potência hegemônica no Ocidente e polarizou a Guerra Fria com a URSS. Por isso, a guerra e o militarismo estão no imaginário de figuras públicas, tornando-se sua principal opção quando há problemas e quando se sente ameaçada em nível internacional. Outra observação feita é a administração do terrorismo tem sido um desastre, pois financiou o Iraque contra o Irã durante 8 anos, depois quis esmagar a ditadura de Sadam Hussein, desde que este invadiu o Kuwait petrolífero; defendeu e patrocinou golpes militares na América Latina, depois se apresentaram como guardiões da democracia no continente. E este mesmo EUA influenciaria diretamente na recessão europeia causando grandes turbulências e colocando um fim na década mais próspera já registrada na História, segundo Judt, além das altas inflações monetárias, quando os EUA anunciaram unilateralmente que seu país abandonaria o sistema de taxas de câmbio fixas. O dólar norte-americano, âncora do sistema monetário internacional desde Bretton Woods, passaria a flutuar em relação às outras moedas. O pano de fundo para essa decisão era o imenso ônus militar causado pela Guerra do Vietnã, Tony Judt vê as décadas de 1979 e 80 como sendo muito complicadas para a Europa, visto que nessas décadas ele dá destaque as lutas dos movimentos de libertação das mulheres; as revoluções ambientalistas em alguns países.
Já nos anos 90, após uma transformação surpreendente causada pela divisão territorial na Europa oriental, Judt relata o surgimento e o desaparecimento de nações e o impacto sofrido no continente e o resultado foi a transição da velha Europa para a nova Europa na crescente multiplicidade no final do século XX. Uma das conclusões mais interessantes a que Judt chega é apresentada no último capítulo da casa dos mortos, no qual analisa o efeito do holocausto sobre a personalidade coletiva do continente, ainda que tenha levado mais de quarenta anos para ser assimilada, é exatamente a tragédia da segunda guerra que confere unidade à Europa. Seguindo essa linha de raciocínio, o autor critica também a atual posição política de Israel, que, apoiado pelos Estados Unidos, distorce o significado do Holocausto e o simplifica ao nível de uma matança de judeus. Judt, que também é judeu e viveu o período do pós-guerra na Europa, afirma que, com isso, o momento histórico fica esvaziado de significado. Para ele, a compreensão da importância do Holocausto passa pela percepção da universalidade do mal que um povo pode impingir a outro em qualquer genocídio. Ele destaca o drama do Kosovo e da Iugoslávia.