Futuro de uma Esperança

Futuro de uma Esperança Ricardo Machado




Resenhas - Futuro de uma Esperança


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Léo 09/06/2017

Criticas sociais à vista; a realidade das ruas em tese
O abandono infantil, um dos graves problemas da sociedade atual, é tema do livro Futuro de Uma Esperança, escrito pelo autor e graduado em química Ricardo Machado. O enredo conta com uma linguagem simples e muito contemporânea e começa de forma arrebatadora, apresentando uma realidade obscura, porém constante nas ruas do nosso país. Tem ainda a apresentação de dois protagonistas fortes e ainda jovens, inseridos na ambientação da miséria, da poluição ambiental — momento em que encontra-se muito conhecimento da área de formação do autor inserido no livro —, do caos urbano, da violência nua e crua — sem máscaras —, do racismo em forma direta. A luta pela sobrevivência nesse cenário delinquente das ruas — que aqui estão situadas na cidade de Porto Alegre —, passa a ser o primeiro objetivo das personagens, que durante o percurso tentam não se entregar a fadiga de uma luta muito mais social do que individual.

Usando os artifícios da mais pura realidade, Ricardo Machado explora o enredo com muita cautela, não ferindo os direitos humanos tão bem citados em Futuro de Uma Esperança, livro que aponta entre os já citados distúrbios civis, soluções e reflexões diretas a respeito de tais óbices. Vê-se na comovente história, onde crianças indefesas e necessitadas de afeto e de laços familiares, mas que mesmo em situações precárias e abatidas pela fome, demonstram esperança, coisa nem sempre encontrada em lares de melhores condições sociais. O autor remete à reflexão do leitor a possibilidade de crescimento mesmo em meio ao conturbado cenário da população de rua. Mostra que mesmo rodeados por um grupo extenso de perdidos sociais e corrompidos públicos, aqueles que têm e retém o mínimo de respeito, educação, ética e compromisso humanitário conseguem alcançar as mudanças imaginadas, os ideais sonhados e a sobrevivência diante a luta: "Não fale assim, Joel. Pense que essas crianças não tiveram oportunidades. Ninguém que olhasse para elas e as orientasse. Alguns levam uma vida tão desgraçada que...".

Ricardo Machado teve uma bonita atitude em usar a amizade como um dos recursos chaves para o seu enredo, transformando o pequeno protagonista Marquinhos em alguém cheio de ternura, amizade e com o coração tão afetuoso e prudente, capaz de usar o pouco de instrução que possui e jamais deixar de lado as suas raízes. Salienta ainda que, mesmo entre más influências, há opções, e mesmo que seja difícil de se desprender do universo corroído pela violência, uma vez tendo o adentrado, a luta pode ser valiosa e o triunfo conquistado.

A história, em muitos momentos é comovente e usa a realidade da população de rua como pano de fundo. Encontra-se, entre as personagens mais marcantes, Nando, irmão mais novo de Marquinhos, que no percurso não tem o mesmo destino do irmão; Zezinho, o menino da bagana de maconha; Tina, transgressora aliciadora de menores; Joel, o amigo de caráter inconstante; e o guarda Beto, que acaba sendo o espelho da sociedade. Todos acabam passando ensinamentos importantes na leitura num síncrono com a história dos irmãos negros que se defrontam à realidade do racismo, infelizmente tão comum e debatido no país. Uma forte analogia em relação à escravidão, é feita em: "...Parou e ficou olhando o guarda Beto agredindo fisicamente o Nando. O guarda batia nele com um cinto como se Nando fosse um escravo do século XIX". Nesse ponto, se chega a mais uma das doenças individuais e do poder público: a má gestão de algumas fundações que atendem menores com histórico de delitos garantindo suas recuperações sociais e educativas. Esse bom atendimento nem sempre é o que se vê: "Seja dentro da prisão ou dentro de uma instituição sócio-educativa, os maus tratos, em vez de recuperar uma pessoa, torna-a ainda pior quando sai do sistema, ameaçando ainda mais a sociedade, principalmente quando as pessoas a serem recuperadas são menores de idade". As personagens, em muitas ocasiões, são sitiadas pela falta de ação do poder público e pelo não cumprimento de leis ainda volúveis. Um ponto muito interessante é que o autor usa o enredo para expor algumas notícias de delitos sociais que vão sendo dadas ao longo da história, como forma de alertar ao leitor a variedade de violações praticadas por seus contraventores.

O livro proporciona boas reflexões sociais ao leitor mas, por outro lado, a linguagem dos diálogos não remete muito ao universo delinquente das ruas; sente-se falta de uma maneira mais própria de expressão da dita população em situação de rejeição social. O autor, em muitos momentos, também não situou o leitor tão bem sobre a questão do espaço-tempo, não oferecendo boas e fundadas informações com relação aos acontecimentos. Na verdade o leitor fica um pouco perdido em alguns instantes e não entende quando aconteceu tal ocorrido, quanto tempo durou e quando foi resolvido. Assim como há um grande desentendimento quanto ao estilo de escrita, que não foi muito bem definido pelo autor. Ora temos uma linguagem um pouco mais juvenil, ora essa forma de narrativa muda para um modelo de apresentação mais adulto. Isso acontece mais nos diálogos, que em muito são feitos por personagens crianças e adolescentes, mas que terminam passando a ideia de possuírem muito conhecimento sobre tais assuntos, problemas e soluções, como se fossem pessoas maduras e tão bem instruídas. Marquinhos também foi um personagem que, ao mesmo tempo tão bem construído, apresenta alguns pontos contraditórios. Mesmo após o trauma de duas perdas, o menino mostra-se muito autoconfiante, e também com certo excesso de confiança em pessoas desconhecidas. Essa ingenuidade não condiz com toda a esperteza que o menino demonstra desde o início da história. Assim como toda a sua esperteza não condiz com o tipo de formação instrutiva que ele teve em seu lar. A criança abandonada, em situação de rua ou que tem perdas sucessivas tende a apresentar problemas psicológicos além dos causados pelo contexto violento cujo se encontram, e infelizmente isso não é apresentado de um jeito acentuado como deveria no comportamento do protagonista.

Entretanto, o livro aborda por meio de uma triste, massacrante mas singela história, a realidade de uma população que a cada dia cresce mais nas ruas do país. A presença forte de pedidos subentendidos a recursos que levem a melhorias da educação e cultura tornam o enredo do livro um dos mais atraentes e firmes já lidos até agora entre tantas outras publicações. O pensamento em torno da situação apresentada transcorre âmbitos não somente da sociologia e antropologia, mas também da psicologia e filosofia, afinal soluções podem surgir de todos os lados. Tantos são os recursos disponíveis para se obter melhorias mas infelizmente as falhas dos órgãos competentes ainda são graves. O livro não chega a ser um apelo desesperado em favor da reinserção social de menores abandonados ao eixo familiar e social mas a essência do exercício da cidadania está presente em cada pedaço escrito por Ricardo Machado. A educação é primordial, defende o autor no trecho: "Jorge é um daqueles que defendem a sociedade em geral, a grande maioria, pela qual sofre nas mãos de uma minoria. Sempre foi um grande estudioso de Foucault, seu autor preferido; sempre dizia que o discurso corrompe a maioria com a fala mansa, e que a educação, por sua parte, deveria ser essencial para prevalecer o bom senso e do pensamento próprio, o pensamento crítico e autônomo, e não se deixar vencer pela fala manipuladora, como a hitleriana, que convence as massas".

Por fim, o que o leitor encontra em Futuro de Uma Esperança é realmente a essência da esperança em todas as suas formas. Em alguns trechos, os sonhos de Nando, deixando de lado todos os problemas e tornando o mundo ideal em suas fantasias, deixa claro a persistência na busca por tal expectativa agradável. O título, que já diz muito do que há nas entrelinhas da obra de Ricardo Machado, marca um desejo não só do autor, mas de muitos que ainda enxergam soluções e guardam em si o sentido humanitário.

Grande satisfação em conhecer a obra. Recomendo!

Sucesso ao autor.

site: www.marcasliterarias.com.br
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Ricardo.Machado 12/02/2017

Futuro de uma Esperança
Talvez uma das frases que melhor define "Futuro de uma Esperança", seja: Se queremos transformar a realidade devemos ser tolerantes.
Nos dias de hoje essa frase está cada mais em voga em virtude das discussões políticas no Brasil, mas nesta obra está atrelada ao racismo e à exclusão social. Enfim, esperanças... ou o que podemos esperar: um mundo com vidas melhores, mais solidária e tolerante? Parece que estamos longe de avançarmos em relação a isso quando lemos este livro.
A discussão social e a fome, abordadas tanto nesta obra como em "Vidas Secas", de Graciliano Ramos, por exemplo, se diferem mais porque esta apresenta uma paisagem bucólica e de enfrentamento à seca; enquanto a outra, pela falta de perspectiva em uma cidade caótica.
"Futuro de uma Esperança", no entanto, desvela algo que não nos deparamos quando não olhamos para dentro de nós mesmos: os outros que se tornam invisíveis à própria sorte. De qualquer maneira, há uma luta cáustica e desesperada por parte dos sofredores; e por outro lado, um medo constante de pessoas que lutam contra a violência, tentando combatê-la também com violência.
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