Lista de Livros 05/04/2019
Lista de Livros: A Nova Razão do Mundo – Christian Laval e Pierre Dardot
Parte I:
“O neoliberalismo não destrói apenas regras, instituições, direitos. Ele também produz certos tipos de relações sociais, certas maneiras de viver, certas subjetividades. Em outras palavras, com o neoliberalismo o que está em jogo é nada mais nada menos que a forma de nossa existência, isto é, a forma como somos levados a nos comportar, a nos relacionar com os outros e com nós mesmos. O neoliberalismo define certa norma de vida nas sociedades ocidentais e, para além dela, em todas as sociedades que as seguem no caminho da “modernidade”. Essa norma impõe a cada um de nós que vivamos num universo de competição generalizada, intima os assalariados e as populações a entrar em luta econômica uns contra os outros, ordena as relações sociais segundo o modelo do mercado, obriga a justificar desigualdades cada vez mais profundas, muda até o indivíduo, que é instado a conceber a si mesmo e a comportar-se como uma empresa. Há quase um terço de século, essa norma de vida rege as políticas públicas, comanda as relações econômicas mundiais, transforma a sociedade, remodela a subjetividade. As circunstâncias desse sucesso normativo foram descritas inúmeras vezes. Ora sob seu aspecto político (a conquistas do poder pelas forças neoliberais), ora sob seu aspecto econômico (o rápido crescimento do capitalismo financeiro globalizado), ora sob seu aspecto social (a individualização das relações sociais às expensas das solidariedades coletivas, a polarização extrema entre ricos e pobres), ora sob seu aspecto subjetivo (o surgimento de um novo sujeito, o desenvolvimento de novas patologias psíquicas). Tudo isso são dimensões complementares da nova razão do mundo. Devemos entender, por isso, que essa razão é global, nos dois sentidos que pode ter o termo: é mundial”, no sentido de que vale de imediato para o mundo todo; e, ademais, longe de limitar-se à esfera econômica, tende à totalização, isto é, a “fazer o mundo por seu poder de integração de todas as dimensões da existência humana. Razão do mundo, mas ao mesmo tempo uma razão-mundo.”
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Parte II:
“Tudo indica que a principal mudança introduzida pela avaliação é de ordem subjetiva. Enquanto as novas tecnologias orientadas para a produção da “empresa de si mesmo” pareciam responder a uma aspiração dos assalariados a mais autonomia no trabalho, a tecnologia avaliativa aumenta a dependência em relação à “cadeia administrativa”. Obrigado a realizar “seu” objetivo, o sujeito da avaliação é igualmente constrangido a impor ao outro (subordinado, cliente, paciente ou aluno) as prioridades da empresa. É o atendente dos Correios que tem de aumentar as vendas de determinado “produto”, exatamente do mesmo modo que qualquer consultor financeiro bancário, mas é também o médico que deve ora prescrever “ações” rentáveis, ora liberar leitos o mais rápido possível. Uma das consequências mais seguras é, sem dúvida, que as “transações” ganham cada vez mais espaço em detrimento das “relações”, a instrumentalização do outro ganha importância em detrimento de todos os outros modos possíveis de relação com o outro.”
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Parte III:
“Quando a empresa se torna uma forma de vida, a multiplicidade de escolhas que se devem fazer dia a dia, o encorajamento a assumir riscos continuamente, a incitação permanente à capitalização pessoal podem causar com o tempo um “cansaço do si mesmo”. Um universo comercial cada vez mais complexo faz potencialmente de cada ato o resultado de uma coleta de informações e de uma deliberação que tomam tempo e exigem esforço: o sujeito neoliberal deve ser previdente em todos os domínios (seguros de todos os tipos), deve fazer escolhas em tudo como se se tratasse de um investimento ( “fundo de educação”, “fundo de saúde”, “fundo de aposentadoria”), deve optar de forma racional, dentro de uma ampla gama de ofertas comerciais, ao contratar os serviços mais simples (a hora e a data da viagem que fará de trem, forma de encaminhamento de correspondência, seu acesso à internet, seu fornecimento de gás e eletricidade).
O remédio mais propalado para essa “doença da responsabilidade”, essa usura provocada pela escolha permanente, é uma dopagem generalizada. O medicamento faz as vezes da instituição que não apoia mais, não reconhece mais, não protege mais os indivíduos isolados. Vícios diversos e dependências às mídias visuais são alguns desses estados artificiais. O consumo de mercadorias também faria parte dessa medicação social, como suplemento de instituições debilitadas.”
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