Sadiraiang 12/08/2022Hoje sou grata por ser mulher, e também por não ser afegã?Adoraria ser qualquer coisa na natureza. Mas não uma mulher. Não uma
afegã?. É uma frase que sintetiza que ser mulher no Afeganistão não é sinal de desejo. O livro As meninas ocultas de Cabul - Em busca de uma resistência secreta
no Afeganistão(2014), da jornalista sueca Jenny Nordberg, conta as dificuldades de
ser mulher no Afeganistão, sobrevivendo à segregação social em um país em que a
separação de gênero é uma das mais rigorosas do mundo, trazendo a visão e as
pesquisas da jornalista no período de cinco anos em que passou por uma expedição
no país.
O título da obra faz paralelo tanto a tais dificuldades, como a falta de voz das
mulheres no Afeganistão, quanto as Bacha Posh, meninas que se vestem como
meninos, e que existem como uma forma de resistir e ter um pouco de liberdade
sobre si, em uma sociedade disfuncional em que os homens detém todo o poder.
Dividido em quatro partes, a autora transita sobre temas como a sexualidade,
guerra, religião, direitos, comportamentos e vestimentas, socialização, e muitos
outros sobre o que é certo e o que é errado diante das fortes crenças afegãs.
Ao longo do percurso, há como foco principal para as pesquisas, as Bacha
Posh, a maneira como são tratadas, e como é algo que todo o afeganistão está
ciente da existência, mas que trata de forma oculta, fazendo com que Nordberg
tenha que ir destrinchando de fonte em fonte, procurando e se arriscando para
entender a necessidade das famílias em converter suas meninas em menino no máximo de tempo em que for possível.
Em um país cheio de povos diferentes em que o gênero determina a sua
importância, fica claro que nascer mulher e afegã não é motivo de prestígio, e que
para ter um espaço há um enorme caminho de resistência. No afeganistão, para os homens as diferenças que possuem das mulheres é que elas são sensíveis e são o
sexo frágil, já para as mulheres a diferença é a questão de liberdade que eles
possuem, e elas não.
Os leitores não podem pensar em ler o livro em uma ?sentada?, pois não foi
produzido para prender o leitor, mas sim para documentar, assim como não ir sem
nenhum conhecimento prévio sobre o país em questão. E justamente, por
documentar, a história não é tão concisa pelo excesso e a necessidade de
apresentar dados históricos - que para alguns pode ser cansativo e levar tempo -
para o entendimento do contexto, fazendo retrospectivas históricas e paralelas
explicando a situação tanto legislativa, religiosa e conflituosa, presenciada pelos
personagens, em seus momentos de glória e sofrimento, e levou o país a tal
segregação social.
Apesar dessa falta de concisão quanto aos dados, algo em não há problemas
em vista de ser um livro reportagem de narrativa subjetiva, há reafirmação dos
argumentos várias vezes como se fosse para comprovar ou reexplicar o
acontecimento. A obra também mantém a coerência, atribuindo bem a cronologia das histórias das mulheres que a jornalista conheceu, e em que dedicou o seu livro.
Defendendo a liberdade das mulheres, e deixando um pouco da sua opinião
e seus pensamentos ao longo dos capítulos sem atrapalhar a absorção das histórias
contadas, Jenny Nordberg, fecha a obra pondo uma espécie de explicação final,
sobre uma das personagens principais, Azita, ter a vida que teve, além de mostrar o
lado de um pai afegão que desde começo se mostrou se importar com a filha. Além
de deixar claro a visão de Jenny, sobre o que as mulheres e os homens precisam
para chegar, mesmo que pouco, perto do fim desta segregação social que acontece
no mundo todo.
A todas meninas que já tiveram que usar calças para ter o mínimo de
liberdade, este livro é para vocês