Gramatura Alta 17/04/2017
Terror juvenil
Embora a sinopse de ESTRELA DA MANHÃ descreva uma história de terror, o que você encontra na leitura é algo um pouco diferente. Realmente existem rituais, demônios e mortes, mas com uma roupagem totalmente infantil (não pejorativamente), que assemelha a história com um episódio de SUPERNATURAL, ou algum daqueles filmes antigos de adolescentes que passam na televisão de tarde.
Na verdade, é complicado definir a faixa etária do público alvo de ESTRELA DA MANHÃ. Ele pode afastar as crianças, por causa das mortes pesadas de alguns personagens, e pode afastar os adolescentes, pela necessidade de uma enorme crença na forma como o autor aborda o contato de Rafael, nosso protagonista de onze anos de idade, com o mundo do além. Ou o inverso, e agradar.
Rafael, para conseguir se livrar de um garoto de quem sofre bullyng diário, descobre um aplicativo para celular chamado Pé na Tumba, que oferece vários demônios de aluguel para resolverem os problemas do cliente. Para contratar o serviço, basta a pessoa realizar o pagamento com um cartão de crédito, aceitar o contrato, e a criatura é enviada pelo celular. Um desses demônios, o Estrela da Manhã, tem a função de proteger uma pessoa de sete pessoas durante sete dias.
Assim, Rafael usa o cartão do irmão mais velho, aluga Estrela da Morte, e entrega para o demônio o nome de seis pessoas que o tratavam mal, como o garoto do bullyng e a sua professora, ou que não lhe davam atenção, como a sua mãe e o seu irmão. Só que no primeiro dia, a primeira pessoa morre. E depois, a segunda. Logo, Rafael percebe o tipo de proteção que Estrela da Manhã oferece, é uma proteção bem definitiva. O garoto começa, então, a correr contra o tempo para tentar anular o contrato e salvar as pessoas que ainda restam da lista que passou para o demônio.
Rafael e Renata, a menina que gosta dele, e de quem ele gosta, são opostos em termos de coragem e esperteza. Ela apresenta para ele as respostas corretas para a situação do bullyng, mas o garoto, por covardia, não aceita e passa a buscar a solução menos óbvia. Algumas atitudes dos dois vão além do que uma criança de onze anos faria, ou pensaria, mas isso não chega a atrapalhar a leitura, ou a veracidade dos personagens.
A mesma coisa em relação ao irmão mais velho, Beto, e a namorada, Darla. Eles são o casal mais velho que, aos poucos, descobrem o que está acontecendo, reconhecem as próprias falhas pela falta que fazem ao Rafael, e acabam entrando na aventura para ajudarem o casal mais jovem a destruir Estrela da Manhã. Por essa união, entre crianças e adolescentes, contra forças sobrenaturais, que acontece a similaridade com os filmes de aventura dos anos oitenta. E isso é ótimo!
Toda o contato e controle do demônio é feito pelo celular, de forma bem semelhante aos aplicativos que nós usamos diariamente. Isso não é um defeito. Eu mesmo achei divertido o autor usar algo tão presente nas nossas vidas como uma forma de controle das criaturas vindas do inferno. O leitor pode até considerar isso uma crítica à quantidade de serviços oferecidos pelos aplicativos, pela Internet e redes sociais.
Existem outras críticas leves no enredo, com o próprio bullyng, a falta de atenção familiar e a solidão, além das mensagens morais, como a força interior que surge nos piores momentos, o aprendizado através dos erros, o arrependimento quando as faltas são compreendidas. Mas tudo isso é feito de forma muito sútil, sem muito aprofundamento. E isso, novamente, não é um defeito, uma vez que essa não é a proposta do livro.
A proposta de ESTRELA DA MANHÃ é, principalmente, divertir, sem compromisso, com algumas mensagens como brinde. E isso, a obra consegue, mas para um público que consiga aceitar a ideia do celular como forma de contato com o além, e não se incomodar com as mortes sangrentas da maioria dos personagens. Para quem aprecia uma boa aventura, com pequenas doses de terror, e tenha liberdade criativa, é uma ótima pedida. Para quem não tem assim tanta criatividade, bem, sugiro que exercite esse lado do cérebro, porque sonhar, mesmo com o absurdo, é sempre gostoso.