spoiler visualizarGioMAS 01/07/2023
A conclusão do livro e seu teor psicológico
Arriscando-me soar prepotente, explicarei a conclusão do livro.
Sim, é isso mesmo. Peço desculpas de antemão pela atitude um tanto quanto pedante. Não pretendo me justificar, mas, vejam bem, a maioria das resenhas anteriores expressa incompreensão.
Parece-me que alguns leitores estranharam o final, julgando-o abrupto ("terminou do nada"), outros consideraram pouco explicativo, outros, ainda, questionaram-se sobre suposta intenção dos fantasmas ("o que os fantasmas queriam?").
Não pretendo justificar o pedantismo, mas dadas as circunstâncias, é deveras justificável, não é mesmo?
Os fantasmas são, na verdade, espectros da mente. São resíduos das dores, dramas e traumas que, na atmosfera do hotel, manifestavam-se para pessoas mais sensíveis.
Os espectros, não eram apenas de Cookson, mas também das demais pessoas envolvidas no contexto.
As fragilidades moldavam as manifestações psíquicas travestidas de fantasmas.
Não por acaso, esses fenômenos eram mais comuns durante o sono do narrador. Também não por acaso, sua esposa, extremamente racional, apegada a emoções e situações palpáveis, como, por exemplo, a maternidade, não era susceptível a carga psicológica emanada no local.
No decorrer do livro, o narrador estabele sua conexão com os fantasmas que o assombram. Os problemas familiares, a indefinição da sexualidade, a saudade da filha, a relação com o pai violento e assassino.
Percebem? Não se trata de mera interpretação, o livro deixa isso bem explícito, sobretudo no epílogo. Ainda assim, citarei alguns dos fatos que justificam e amparam essa conclusão.
Inicialmente, Cook se depara com uma menina e, imediatamente, vê nela os traços da sua própria filha. A menina indica que a mãe é parecida com Ellen, esposa de Cook. Nesse momento, ele também se recorda da penosa infância, quando era forçado a se vestir de mulher por sua mãe e irmã.
No adiantar do livro, a alteração de personalidade de Victoria faz referência à dualidade comportamental vivenciada por Cook na infância, ora menino, ora compelido a se mostrar como menina.
Walter Jebons, assim como Cook, tinha problemas com vícios.
Cook é atingido na cabeça por diversas vezes, uma referência à ocasião em que cogitou suicídio com um tiro na cabeça.
Grande parte dos seus sonhos se passam no consultório do quiroprático que consultara antes da viajem à Londres. A presença do seu cachorro de estimação também é recorrente durante os devaneios.
No primeiro encontro com o menino fantasmagórico, Cook relembra novamente da própria infância.
A todo momento, o narrador se recorda de situações marcantes em sua vida, como a ocasião em que retorna para casa bêbado e entorpecido e confronta a esposa, queixando-se da vida que levam. Não há semelhança com seus surtos de repentina violência ao ser despertado no hotel?
Realidade e fluxos do pensamento se misturam para aterrorizar Cook. Antes de ter ciência das circunstâncias da morte de Victoria, o narrador acredita que ela tem uma madrasta, um irmão e menciona cortes no pulso da menina, indicando impossível suicídio. Quando o casal asiático revela o que de fato ocorreu, a versão inicial se altera, adequando-se aos novos elementos.
Ao fitar a chave no pescoço de Vitória, o narrador percebe se tratar, não dá chave de um diário, mas de um cofre, assim deduz sobre a motivação financeira de seu assassinato, o que não é incorreto. Porém, a realidade era bem mais complexa do que poderia imaginar naquele momento.
Evidentemente, havia, sim, algo sobrenatural no hotel, algo captado por Cook em razão da sua sensibilidade mediúnica.
Apesar disso, a maioria dos elementos ganharam força, manifestando-se espectralmente a partir da vibração mental das pessoas envolvidas.
Pascal se assemelhava muito a James, sequer é necessário explicar porque (carência, abandono, sensação de não pertencimento da família). No epílogo, percebemos que a postura chorosa do garoto fantasma, o seu sentar no escuro, era uma reprodução de um comportamento adotado pelo pai de Pascal.
Tudo parece muito óbvio, mas para não deixar dúvidas, vejam como todo o ocorrido serviu para que Cook se desprendesse do sentimento de vazio e auto depreciação, aceitando sua realidade, tomando gosto pelas coisas simples da sua vida.
É isso. O final não é inconclusivo, tampouco repentino. A estória não é monótona e sem propósito. Os fluxos de pensamento do narrador são intencionais, pois o livro trata do poder do inconsciente, da materialização dos medos mais profundos.