Ruan Ricardo Bernardo Teodoro 26/01/2023
Um Colírio Envenenado
Essa obra de título provocador do irônico e ácido Roger Scruton é uma pequena coleção das posições conservadores À inglesa do autor.
Nesse livro, Scruton discute temas comuns (como capitalismo, comunismo, liberalismo) sob um ponto de vista liberal-conservador-inglês, por isso, é importante notar que o público ao qual o autor se dirige (como ele próprio admite) é o público de língua INGLESA.
Realmente, é IMPOSSÍVEL ser conservador igual Scruton define em nossas terras lusófonas. Temos um país incrível, com uma cultura própria e com chagas sociais únicas que só nós (e os outros países latino-americanos) podem compreender.
Outro tema que me chama a atenção na obra, é sobre a decadência moral e religiosa dos nossos tempos (acusação já antiga), a qual, com o que se parece um pesar no coração, o filósofo lamenta a perda da religiosidade e dos valores espirituais. Logo, com a secularização, o que era sagrado (e, para Scruton, sagrado é aquilo que tem VALOR, mas não tem preço) se torna substituível.
O próprio Scruton demonstra uma espiritualidade frágil (ainda que reconheça os benefícios da religião), e ele mesmo está contaminado demais pelos princípios liberais-iluministas para acreditar em um filosofia/teologia essencialmente transcendente (como o fizeram Tomás de Aquino, Tolkien, Chesterton, Paulo de Tarso, Tomás de Kempis, etc).
Para Scruton, a última ponta de conexão entre o homem e Deus é a arte, por meio da qual ele mesmo (e nisso vejo sinceridade) encontra as últimas centelhas do sagrado no mundo opaco da pós-modernidade.
Acredito que o melhor de Scruton não está em suas posições políticas polêmicas (as quais, desgraçadamente, abundam em "Como ser um Conservador"), mas sim em sua percepção de que a beleza e o conhecimento pessoal de si serão sempre mais importantes do que movimentos políticos revolucionários.
Em resumo, para o público brasileiro, habituado a filósofos progressistas, materialistas e teólogos libertários, ler Scruton serve de colírio para "provocar" um debate filosófico riquíssimo entre essas duas visões políticas de mundo.
Apesar disso, embora seja um colírio, ainda sim, é um colírio envenenado, já que sua leitura não substitui os maravilhosos tratados espirituais que a cultura medieval, bíblica e transcendente nos legou ao longo dos séculos. Em verdade, se é que nós devemos ser conservadores, devemos ser conservados de amizades, de risadas e daquilo que de bom nós recebemos de nossos pais (conforme Oakeshott), mas não "conservadores políticos", já que, enquanto movimento político, o conservadorismo inglês é tanto ideologia quanto o progressismo o é.
Afirmo, sem medo, que em um país com uma prolífica tradição espiritual como o Brasil (predominantemente católica/cristã e subsidiariamente de religiões de matriz africana), vale mais nos aprofundarmos nos clássicos da fé e da filosofia, como os já mencionados Chesterton e Tomás, em Platão, além da Bíblia (principal), Agostinho e outros.