e-zamprogno 06/02/2024Suspense salpicado de questões existenciaisO enredo deste segundo livro é centrado em um personagem principal que não aparece no primeiro livro, mas que, no passado, participou na construção do silo. Porém ele pouco sabe para que serviria aquela instalação, e vai descobrindo ao longo da história. Esta é uma das principais características deste segundo livro: o suspense e o mistério constante, que acho que chega a suplantar a categoria de ficção científica distópica em que ele primeiro se encaixa.
Uma outra característica do enredo são os saltos temporais, para frente e para trás, entre diversas épocas, como antes, durante a construção do silo e vários períodos após, incluindo o tempo presente, mas também momentos históricos dentro do próprio silo. Parece até que se está lendo um livro com viagens no tempo (não é o caso). Achei um pouco difícil de acompanhar, mas fui seguindo sem me preocupar muito com isso e no final tudo acaba se encaixando.
Este personagem foi envolvido na construção do silo devido ao cargo político e formação que possuía à época, mas, como subordinado, recebia pouca informação da finalidade do projeto em que estava trabalhando. Boa parte da história gira em torno das descobertas que ele mesmo vai fazendo, junto com o leitor. Aí entra uma outra característica da narrativa que me chamou a atenção: a humanização dos personagens. Para além dos objetivos de um projeto do porte do silo, boa parte dos acontecimentos gira em torno de relações humanas bastante mundanas. É quase como na história do premiado filme Titanic, onde o naufrágio do navio é o pano de fundo do relacionamento entre o Jack e a Rose. No caso deste livro a história não é uma história de amor recíproco, mas, como no filme, dá pano para uma série de reflexões sobre o sentido mesmo da vida, da sociedade, da política, da religião, e outras questões existenciais profundas, que podem até passar despercebidas para alguns leitores, pois aparecem de forma sutil, como o próprio questionamento de viver uma vida na rotina de turnos de trabalho – "shift" em inglês – que é o título original do livro. Este aspecto reflexivo e o estilo descritivo detalhista do autor tornam o livro longo (mais de 500 páginas, igual ao primeiro livro da série), e talvez enfadonho para alguns leitores. Eu particularmente gosto deste estilo.
Acho que não cabe a comparação de qual dos dois primeiros livros é melhor, pois são bem diferentes. Os enredos acontecem no mesmo universo, mas as histórias convergem apenas no final. É quase como se este segundo livro fosse uma obra derivada (spin off) da história "principal". Mas há um aspecto que acho que dá para comparar, que é como os livros terminam. Ambos deixam questões não respondidas no final, mais que isso, verdadeiros ‘cliff hangers’, mas achei o primeiro melhor acabado, com um corpo que tem mais cara de começo, meio e fim.