spoiler visualizarKimIssaMoon 21/05/2024
Como uma coisa tão errada pode parecer tão certa?
Esse livro é muito mais do que parece, te faz questionar os conceitos de amor.
Em uma conversa com sua amiga, Maya, traz a reflexão de como a relação incestuosa é tão repulsiva que nem em um debate sobre amor livre ela sequer é pensada, e realmente é impossível imaginar dois irmãos se relacionando e não se chocar, não sentir repulsa e instantâneamente não pensar em uma relação abusiva. Mas será que é tão errado quanto meu próprio cérebro me diz? Afinal de contas, o que Lochan e Maya faziam de mal? No que o amor deles afetava o mundo? Será que realmente é tão antinatural quanto se imagina? Eu verdadeiramente continuarei com essas reflexões por muito tempo e não chegarei a uma conclusão.
Os próprios Lochie e Maya se questionam se a paixão existiria se eles não estivessem uma família disfuncional, minha opinião é que não, e eles mesmos provam isso. Quando a Maya mostra como seria inimaginável ter algo com Kit, ou pensar nele dessa forma, ela mostra que a paixão pelo Lochan é apenas consequência de uma vida fora dos eixos, até por que se não fosse isso ela só não sentiria nada pelo Kit, mas não veria como algo tão repugnante (não estou colocando em questão realmente existir uma relação com ele, ainda mais por ser tão novo, é apenas um ponto de reflexão). Mas pra mim o principal ponto que prova isso é fato deles fazerem tudo pela família, óbvio que eles ficam cansados e querem mandar tudo pros ares, não é pra menos, mas em hipótese alguma eles fariam isso, se a paixão existisse independente das circunstâncias eles simplesmente largariam tudo, fugiriam e viveriam esse amor sem nada no mundo pra atrapalhar, mas não, isso é só plano pro futuro, quando a família já estivesse encaminhada.
Em alguns dos "surtos" do Lochie eu fiquei com raiva, queria que ele se decidisse logo, mas é notável como eram apenas lampejos de consciência, de medo também, com certeza, mas de consciência em principal, era uma partezinha dele mostrando como aquilo não precisava acontecer pra eles terem o apoio um do outro. A Maya fala como ela >nunca< viu ele apenas como irmão, e sim como parceiro, e só tinha percebido agora, mas novamente isso só mostra como essa paixão não é verdadeira, ela confundiu a cumplicidade, apoio e amor fraterno com um sinal de que sempre foi paixão. Eles sempre estiveram ali um pelo outro, cresceram juntos, como gêmeos, são parceiros de vida, são parceiros de alma, e é lindo, uma relação de irmandade na sua mais pura essência, virar parceiros de cama foi só reflexo da alienação parental.
Um pai, que como muitos, abandona a família para viver com a nova, e mãe negligente e narcisista, que não superou e adolescência e nem o abandono. Lochan desenvolve fobia social, a mãe em todo momento o comparando com o pai, faz com que ele se sinta errado, e assuma o peso de não ser como o pai foi, ausente. Maya claramente apática, sem pretensões de futuro e ao mesmo tempo esperançosa, como uma boa adolescente, quer que tudo dê certo, anseia pela completude de um amor. Dois irmãos, tiveram que lidar com o peso da responsabilidade, com pais ausentes e negligentes, assumiram a família, sempre lado a lado, parceiros de vida que novamente só tinham um ao outro pra se apoiar, desenvolveram um papel que não era deles. As crianças, mesmo tão novas, já tinham ciência que a mamãe não era como as outras, e o papai? Bom, quem era o papai? Eles não tinham como saber. O Kit, ressentido, revoltado, magoado. Maya e Lochan segurando tudo e todos, como um band-aid em uma barragem, tentando cuidar dos outros e ainda de si mesmos. Eram irmãos, viraram pais. As crianças já percebiam e questionavam se eles eram seus verdadeiros pais, o próprio Kit sabia a muito tempo da relação deles e nunca falou nada, não se importava, a figura dos dois era tão paterna que existir algo não parecia um absurdo, muito provavelmente até as crianças não ligariam quando descobrissem. Supriram a necessidade dos irmãos e a própria, de um amor pleno, verdadeiro e fraterno. Tudo culminou para um sentimento platônico que terminou de forma desastrosa.
Penso que se as coisas tivessem acontecido de forma diferente, se eles conseguissem seguir com os planos, iriam parecer uma família comercial de margarina. Com as crianças crescidas e o Kit encaminhado pra própria vida, o passado tortuoso seria uma vaga lembrança de quem eles não querem se tornar. E muito provavelmente em algum momento a mãe seria abandonada por uma novinha, e beberia até cair, precisando de Lochan e Maya para ter o mínimo de dignidade, até que um dia beberia e não acordaria mais. E fim, eles estão livres, sem nenhuma sombra do que a vida foi antes. Irmãos, amigos, cúmplices, parceiros, amantes, irmãos, pais. A vida até tinha um futuro melhor.
Não vou mentir, fiquei com raiva do Kit, mas o que se pode culpar o menino? Ele tinha 13 anos, andava com gangue, mas em seu cerni ainda era só uma criança que queria pais normais. Aos fãs de Carla Madeira e A Natureza Da Mordida, o Kit não tinha culpa, mas tinha corpo. Duvido que consiga superar fácil o que aconteceu, não foi sua culpa, mas foi por sua causa...
A morte do Lochie me destruiu, mas não seria ele se não tivesse feito o que fez. E Maya não honraria sua vida se tivesse ido junto. Era isso que eles eram, família, em primeiro lugar, sempre.
Nota de repúdio: Adriana, minha amiga, que me indicou esse livro. Ela sabia que eu iria me apaixonar pelo Lochie e sofrer mais que tudo com sua morte. Ela fez de propósito. Reclamar em seu chat não foi o suficiente, então deixarei registrado aqui também.