Dhiego Morais 12/09/2020Eleanor & ParkTalvez um dos relançamentos mais aguardados entre os fãs de romances românticos para o ano de 2020, Eleanor & Park, de Rainbow Rowell marca uma nova fase para os livros juvenis da autora aqui no Brasil, desta vez pelas mãos habilidosas da Editora Seguinte (Companhia das Letras).
Tendo sido lançado pela primeira vez pela editora “Novo Século”, Eleanor & Park ressurge no mercado nacional com nova roupagem: nova capa e processo gráfico, além de uma nova tradução por Lígia Azevedo.
Como nós já havíamos conversado nas resenhas passadas, decidi nesse meio de ano que me aventuraria mais por romances mais leves, por comédias românticas e outras histórias menos “pesadas”, que pudessem me proporcionar um calor agradável no coração, ao invés dos costumeiros arrepios e medos pelo suspense constante. Pois bem, assim estou seguindo. Então, tão logo recebi de parceria a cópia física de Eleanor & Park, não pense mais que duas vezes e iniciei a leitura – uma leitura que me surpreenderia enormemente, quem poderia imaginar?!
“Segurar a mão de Eleanor era como segurar uma borboleta. Ou as batidas do coração. Como segurar algo completo, e completamente vivo”.
Neste primeiro livro de Rainbow Rowell pela Seguinte, os leitores são convidados a embarcar em uma jornada juvenil ao ano letivo de 1986, nos EUA, pelo descobrimento do primeiro amor.
Eleanor acabou de se mudar. Com uma série de problemas familiares envolvendo sua mãe e seu padrasto arrogante, a jovem teme nunca conseguir se encaixar verdadeiramente no microcosmo de sua comunidade. Insegura quanto a tudo que a rodeia, de seus cabelos ao seu peso e suas roupas, Eleanor precisa encarar os desafios de sua nova escola e seus novos colegas – e esses desafios já começam durante o trajeto rotineiro no ônibus escolar.
Park é talvez o único garoto com descendência asiática de sua escola. Sempre ansioso por ficar fora do radar dos colegas, ele se mantém quieto no ônibus escolar, de canto, ouvindo suas bandas favoritas de rock no seu walkman ou passando o tempo lendo seus gibis de X-Men e outros super-heróis. Embora não seja alvo do bullying dos demais alunos, Park é um ponto à margem do padrão.
Quando Eleanor sobe ao ônibus e percebe ser alvo de risadas e deboches dos demais alunos, seja por seu cabelo ruivo volumoso, seus acessórios ímpares, seu corpo ou suas roupas fora da moda de 1986, encontra refúgio em um dos pouquíssimos acentos ainda disponível e discretamente cedido por um garoto aparentemente irritado: Park.
Aos poucos observamos como ambos os jovens, Eleanor e Park se atraem, como se uma força invisível e irrepreensível tencionasse os unir. Nos trajetos do transporte escolar, Eleanor parece se interessar pelos gibis de Park, conseguindo lê-los de canto de olho. Seu jeito discreto e quieto, suas roupas pretas, suas camisetas parecem contrastar com todo o jeito confuso e colorido, vibrante de Eleanor.
Da indiferença mútua à cumplicidade divertida, a autora realiza com primazia a transição da desconfiança juvenil até o interesse e o florescimento do amor entre dois adolescentes que nunca experimentaram sentimentos tão revolucionários em suas vidas.
É possível que num primeiro momento, para o leitor desavisado, essa história inspire apenas mais um romance romântico bobo, uma história adolescente e completamente previsível. Todavia, Eleanor & Park foge de todo clichê ao inserir em sua trama assuntos valiosos e contemporâneos, tópicos que merecem ser discutidos e analisados com cuidado, pois refletem e muito a realidade de muitos jovens e muitos berços familiares. Da violência doméstica às práticas de abuso psicológico e misoginia; das discussões de gênero envolvendo o que é ou não “coisa de garoto ou de garota”; inseguranças envolvendo o corpo; bullying na escola, etc.
Em Eleanor & Park descobrimos junto destas duas personagens como a presença de cada uma é importante para as suas vidas. Eleanor parece resistir apenas por poder “consumir e respirar” um pouco do que é ser e estar com Park, mesmo diante de um caos familiar envolvendo um padrasto violento e controlador, uma casa pequena demais para a família e uma mãe que já não parece ser capaz de ajudar a si própria. Park encontra em Eleanor uma nova face de si mesmo, verdadeiramente se apaixona como todo primeiro amor deve ser: poderoso, misterioso e inflamável.
“Quais eram as chances de encontrar alguém assim na vida?, ele se perguntava. Alguém que você seria capaz de amar para sempre, e que sempre te amaria também?”
Rainbow Rowell consegue retratar uma história de primeiro amor entre dois jovens de dezesseis anos com naturalidade, demonstrando uma visão precisa e não menos reconfortante sobre o entendimento de que, às vezes, o primeiro amor pode não durar para sempre, mas nunca substituirá a importância de se aventurar e arriscar.
Com um final agridoce, Eleanor & Park pode ser capaz de deixar um final consideravelmente amargo ao leitor, principalmente pelas atitudes e decisões difíceis de uma das personagens. Entretanto, acredito que seja válida uma reflexão sobre o porquê dessa mesma personagem ter agido assim, que, num mapeamento breve e sem rancores, conseguimos encontrar as raízes de tanta insegurança e de tanto medo em meio aos traumas de sua adolescência.
Ler Eleanor & Park é acompanhar acalentado por um mar de palavras como cada uma das personagens é importante o suficiente para salvar a vida do outro.
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