Fran 06/07/2021
Sob o Céu do Nunca possui grande chance de causar uma primeira impressão negativa para a maioria das pessoas: parece apenas mais uma distopia que segue um roteiro semelhante a várias outras por aí. Somando isso ao fato de poder ser considerado pequeno e com uma capa não tão criativa, é fácil imaginá-lo como um livro fraco. No entanto, as aparências enganam. Para aqueles que não esperam muito, podem acabar encontrando uma agradável surpresa.
Como diversas outras coisas no decorrer da obra, o universo em que a história se passa é singularmente atraente, e com bons motivos para isso. Ele é abordado de forma pouco vista em outros do gênero: em vez de longas explicações sobre como tudo funciona logo no começo, as informações são entregues aos poucos ao leitor, por meio de conversas ou reflexões dos personagens, construindo gradualmente e de modo natural os contornos de o que é aquele mundo. Dessa forma, estamos sempre instigados a querer saber mais, esperando por quando mais repostas serão reveladas.
O livro segue o modelo já clássico de possuir dois pontos de vista com personagens de vivências praticamente opostas, e isso também conta a favor da construção de mundo, pois nos permite ver lados distintos daquela realidade. Também funciona muito bem com a tática de elaborá-lo progressivamente, já que tanto Ária quanto Perry são praticamente ignorantes em relação ao modo de vida do outro.
Os personagens são outro ponto positivo dentro da narrativa, se não o maior. Conhecemos uma quantidade considerável deles até o momento, mas o destaque fica apenas em alguns poucos. Entre esses, mesmo os com menor importância conseguem ser carismáticos ou interessantes de alguma forma, seja positivamente ou não, no caso dos antagonistas.
O foco principal está com Ária e Perry, e uma boa parte da história se passa com apenas eles presentes. São dois ótimos protagonistas, muito diferentes entre si e extremamente cativantes a seu próprio modo. Embora as personalidades de ambos possam desagradar no começo, o grande feito do enredo é o desenvolvimento dos dois, que é amplo e incrível. Eles formam uma dupla que funciona muito bem, obrigando um ao outro a evoluir e abandonar os preconceitos que possuíam a respeito de seus povos conforme o livro avança e é necessário que mergulhem nessas culturas opostas para atingir seus objetivos. Mesmo separados, a evolução deles fica evidente.
O romance é um componente do enredo, porém não ofusca o resto. O relacionamento entre os protagonistas é trabalhado de forma agradável e delicada, complementando o desenvolvimento deles.
O enredo acaba sendo o elo mais fraco da composição, contudo não é ruim e não a torna pior. Com uma leve inclinação aos clichês, é uma trama bem básica, com algumas reviravoltas previsíveis, mas outras nem tanto, garantindo que ainda é interessante acompanhá-la. Além disso, se trata apenas do primeiro livro de uma trilogia, e deixa perguntas o suficiente para serem exploradas em sua continuação. Mesmo não sendo a mais inovadora das histórias, ainda é uma leitura divertida, e os outros pontos que a compõem compensam por essa falta.
Sob o Céu do Nunca é um livro que sabe trabalhar bem seus elementos, e tira o melhor deles sem se comprometer muito com a complexidade. É uma leitura rápida e leve, porém também fascinante e envolvente, provando que um livro pode ser bom sem necessariamente deixar de ser simples.
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