Pablo Paz 16/08/2023
Um livro sério
Este é um livro sério sobre as competências necessárias para se ensinar no século XXI. É uma coletânea de sete artigos de diferentes autores e, nele - até que enfim! - encontrei uma explicação acadêmica, precisa e didática sobre as diferenças entre competências e habilidades que não explicarei aqui, mas que estão nas pp. 137-155.
As palavras-chave do livro são: aprendizagem a partir de situações-problema, projetos, autoavaliação, avaliação formativa, capacidade de gerenciar diferenças, profissional reflexivo. Philippe Perrenoud (1944- ) é um sociólogo e pedagogo suíço, que se insere na escola construtivista de Jean Piaget (1896-1980) e com influência da sociologia francesa, especialmente de Pierre Bourdieu (1930-2002).
Grosso modo, não há originalidade no que propõe, mas a qualidade da obra está em sistematizar conceitos e dar um direcionamento prático para o ofício de professores. O que impressiona é que este livro já tem 20 anos desde sua publicação, mas parece que fui publicado em 2023, tamanho o atraso da educação brasileira, que parece caminhar sempre com um passo à frente, dois atrás.
O que me chama atenção em todas essas propostas porém é que a maioria desses especialistas, ainda que bem intencionados, partem de uma premissa irreal: eles pensam que os professores, melhor, professoras em sua maioria, têm uma energia e vitalidade cujos profissionais de outras áreas não possuem ou, pelo menos, não lhe são exigidas por seus pares. A maioria das propostas, como disse, é séria e são boas, mas é difícil exigir dos profissionais de educação toda essa energia dada as condições de trabalho, afinal trabalhar com situações-problema envolve muito planejamento de atividades, motivação de alunos e desenvolvimento de projetos algo que toma muito tempo.
Tenho para mim que tais exigências só poderão ser cobradas quando os professores da educação básica passarem 50% em sala de aula e 50% em reuniões pedagógicas e, principalmente, em atividades com seus pares, algo difícil de acontecer num horizonte próximo. Só para citar um exemplo: o ensino superior funciona porque os professores passam, salvo exceções, cerca 1/3 do tempo em sala de aula e 2/3 em atividades de pesquisa, orientação e extensão.
E faço tais afirmações sem levantar a questão de gênero que, segundo pesquisa do INEP/MEC de 2022, 77% dos professores da educação básica são do sexo feminino (o professor típico da educação básica brasileira é uma mulher, branca, de meia idade e da classe C). Muitas dessas professores têm dois empregos, filhos e ainda levam trabalho para casa. Ou seja, não dupla, mas tripla jornada! Enquanto não resolvermos este gargalo, até lá, propostas boas e sérias como as deste livro dificilmente tornar-se-ão realidade. Mas esperanças não podem morrer.