Jaqueline 20/12/2012“Erik nunca imaginara que pudesse haver tanto sofrimento num espaço tão reduzido. De alguma forma, quando o Füher falava em guerra, ele nunca pensava naquele tipo de coisa.” (pág. 359)
Inverno do Mundo é o segundo volume da trilogia O Século, do autor Ken Follett. Começando exatamente onde Queda de Gigantes terminou, este livro não pode ser definido com qualquer outro adjetivo a não ser “magnífico”. Acompanhando os desdobramentos políticos e ideológicos do século XX na Alemanha, Rússia, Estados Unidos, Inglaterra e no País de Gales, somos guiados através de uma história repleta de luta, coragem, humanidade e determinação.
Ken Follett continua a me impressionar a maestria de sua escrita. Mesmo com o conturbado cenário histórico onde a trama do livro se desenvolve, temos descrições bem trabalhadas e um encadeamento lógico impressionante dos fatos que mais marcaram o período entre 1933 e 1947, como o estabelecimento do Terceiro Reich, a guerra civil espanhola, o desenvolvimento de pesquisas nucleares, o ataque a Pearl Harbor, as tentativas de criação de uma força internacional de cooperação e apoio à paz e o alvorecer da Guerra Fria entre a União Soviética e os Estados Unidos. É simplesmente impressionante como o autor consegue entrelaçar de forma tão coerente as trajetórias de cinco famílias de origens diferentes, incomparáveis entre si, em um cenário político, histórico e econômico tão impressionante como a metade do século XX. Ficção e realidade se misturam e encantam o leitor, que se mantém ligado ao livro através de reviravoltas e jogos de poder envolventes e eletrizantes.
Apesar da enorme quantidade de páginas, é impossível ficar entediando lendo “Inverno do Mundo”. A ação do livro é rápida e nenhuma informação apresentada pelo autor é irrelevante. Algo que me chamou a atenção em especial foi o seu tratamento a Alemanha nazista: para além do drama dos campos de concentração, Follett mostra como a ascensão de Hitler afetou a política nacional e internacional da época nas mais diversificadas esferas da sociedade. Esta abordagem diferenciada trouxe um frescor especial ao livro, uma vez que esta temática da Segunda Guerra Mundial já foi tão amplamente trabalhada em incontáveis formas de arte e documentação.
Uma das características mais especiais dessa série, pelo o que pude perceber até agora, é a capacidade de transformação de cada personagem do livro. Narrado em terceira pessoa, “Inverno do Mundo” possui personagens completamente multiformes, que nos surpreendem ao longo da narrativa. As mudanças acontecem não apenas no mundo ao redor dos mesmos, mas também em um nível psicológico, e um grande exemplo disso é Daisy Peshkov, a filha do imigrante Lev Peshkov. Ela surge na história como uma jovem menina fútil de Buffalo, Estados Unidos, mas gradualmente se transforma em uma mulher de fibra e caráter, identificando-se enormemente com a política Ethel, uma das grandes protagonistas que “Queda de Gigantes” que agora atua como uma poderosa integrante do Parlamento inglês pela região de Aldgate. Neste livro, é seu filho Lloyd quem rouba a cena, voluntariando-se para ir até a Espanha para lutar contra o fascismo. É lá que ele conhece Volodya, o filho de Grigori Peshkov que faz parte da inteligência do Exército Vermelho stalinista.
Se você ficou confuso com a quantidade de nomes citados nesta análise, fique calmo: logo no início do livro temos uma listagem de todos os integrantes de cada uma das cinco famílias que protagonizam a série, assim como algumas das figuras históricas que aparecem no livro, tais como Josef Stalin, Viatcheslav Molotov, Franklin Roosevelt e Adolf Hitler.
Seria muito fácil recomendar este livro apenas aos amantes da História, mas a continuação de “Guerra de Gigantes” vai além e emociona o leitor com um relato sem rodeios das mais diversas formas de privação dos direitos básicos do homem. Fome, dor, medo, angústia, preconceito – tudo isto está presente nas páginas deste livro. O mais comovente, porém, é a contrapartida de tudo isso; as maneiras sutis de resistência, de perseverança, esperança na vida e busca pela liberdade que certos personagens trazem em si. Arriscando suas vidas, eles buscam um mundo melhor não apenas por uma causa idealista, como o comunista russo Volodya, mas também pela necessidade de mudar aquilo que está errado ao seu redor, como a jovem alemã Carla Von Ulrich faz. A despeito do fato de seu irmão Erik idolatrar o nazismo e acreditar nele como uma saída política e econômica para a Alemanha, Carla segue os passos de sua mãe, Maud (a deserdada lady Fitzherbert), e segue seu coração, lutando bravamente contra as injustiças ocultadas pelo governo hitlerista.
“Inverno do Mundo” é uma ótima dica de leitura não apenas para aqueles que buscam compreender melhor o século passado, mas também para todos os que curtem histórias emocionantes e bem desenvolvidas. Se você ainda não conhece esta saga de Ken Follett, corra atrás dela já!