Ivandro Menezes 20/09/2016
"[...] a maior das experiências é EXISTIR." Craig Thompson
Há aproximadamente dez minutos concluí a leitura de Daytripper e confesso que não sei bem o que dizer a respeito. Não sei como descrever os traços, as cores de beleza ímpar, de tons introspectivos e profundos, na sigularidade dos detalhes realistas e vibrantes a ponto de nos fazer sentir a pulsação dos personagens, o cheiro incômodo do Continental e, sobretudo, as emoções tão alheias e tão nossas.
Aliás, o sentimento de pertencimento parece ser uma constante a cada quadro, a cada página, a cada frase, em cada detalhe que compõe o contexto em que as personagens transitam. Não há como negar que somos Brás, filhos de Benedito, marido de Ana, pai de Miguel.
Somos crianças correndo atrás de guinés, soltando pipa; jovens desbravando a vida e seus continentes. Somos assim cheios de sonhos e de realidade, cheios de vida e morte, dores e alegrias, perdas e ganhos, erros e acertos, fidelidade e traição.
Moon e Bá compreenderam e nos chama a compreender que só quando encaramos a outra face, que só quando temos um vislumbre do fim é que somos realmente livres.
Daytripper me levou a uma viagem profunda e densa, feliz e tensa às minhas memórias. Levou-me aos pés da cadeira de balanço de meu pai, às suas estantes cobertas de livros, às suas histórias no balanço do terraço. Levou-me às discordâncias adolescentes com minha mãe e no quanto nos tornamos companheiros fiés, amigos íntimos e eternos após a morte de meu pai. Lembrou-me o quanto a ausência dele nos fez enxergar tanto dele e de nós mesmos um no outro. Me fez lembrar do primeiro beijo na janela de um colégio público na minha esposa, no primeiro choro do meu primeiro filho, no primeiro olhar terno e emocionado em minha filha recém-nascida, do abraço gostoso de minha irmã, do carinho e amor pelos meus sobrinhos.
Levou-me, ainda, às minhas derrotas, aos "nãos" que a vida me trouxe, aos momentos de dificuldade e nas tantas perdas acumuladas ao longo do caminho.
Confesso ter chegado a última página com os olhos marejados, com o coração confuso e melancólico, mas com uma estranha sensação de que o vislumbre de meus dias até aqui e a certeza da morte que me aguarda no fim, trouxe-me, além da emoção, a certeza e a esperança de que a vida ainda tem muito mais para cada um de nós.