spoiler visualizarLeonardo.Dalcin 03/06/2024
O Amante de Lady Chatterley - D. H. Lawrence
Publicado originalmente em 1928, em Florença, "O amante de Lady Chatterley", escrito pelo autor inglês D. H. Lawrence, narra a história do casal Constance e do aristocrata Clifford Chatterley, que foram diretamente afetados pela Primeira Guerra Mundial, com Clifford tendo perdido o movimento de suas pernas e tendo que se locomover em uma cadeira motorizada. O casamento deles, que nunca fora perfeito, parece piorar ainda mais após esse ocorrido. Pela "falta de contato", se referindo à falta de relações sexuais, Connie acaba se deprimindo, mas parece encontrar salvação no guarda-caça da família, Oliver Mellors. E eles, Connie e Mellors, acabam se envolvendo romanticamente. E nesse relacionamento, acompanhamos diversas relações sexuais descritas explicitamente, daí que vem a polêmica que envolve esse livro. Devido as suas cenas explícitas, ele só foi publicado no país de origem do autor, a Inglaterra, somente no ano de 1960. Mas esse livro não se restringe apenas ao romance dos amantes, também é discutido sobre o prazer feminino, a luta de classes, e diversas vezes ao longo da narrativa vemos várias críticas ao processo de industrialização e urbanização.
Já aviso de antemão de que essa resenha contém possíveis SPOILERS!
Confesso que minha relação com esse livro é conturbada, originalmente, eu teria dado apenas duas estrelas, mas após estudar um pouco mais sobre as questões abordadas, aumentei a nota para 3,5 (e ela tem chance de aumentar). Inicialmente, a escrita não estava me convencendo muito, a história era muito devagar, com poucos acontecimentos, muito repetitiva (Connie vai ao bosque - encontra o Mellors - algum monólogo que envolve a industrialização/amor - os dois tem uma relação sexual, e esse padrão se repete algumas vezes ao longo do livro), e também os personagens não me agradavam muito, me irritei com praticamente todos.
Mas apesar disso, eu reconheço o IMENSO valor desse livro, que possui MUITAS CAMADAS, com cenas repletas de simbolismo. O fato de Lawrence ser poeta ajuda muito nessa parte do simbolismo, alguma cena que parece simples a primeira vista, na verdade, possui um significado profundo por trás dela. Algumas cenas que desejo comentar:
- O andar da cadeira motorizada critica o processo de industrialização?
Numa das cenas do livro, Clifford e Connie estão passeando pelo bosque, até que em um momento Connie para e observa Clifford se movimentando na cadeira motorizada. Nessa contemplação, Connie percebe as flores que são esmagadas no processo de locomoção de Clifford, essa cena que inicialmente parece simples, revela o incômodo da personagem com o processo de industrialização, mostrando a destruição e a feiura que as máquinas causam na natureza. Feiura essa que é várias vezes comentada, principalmente em como as mineradoras tiram a beleza do campo; e também a nova Inglaterra que vem surgindo, deixando as mansões para trás e dando lugar a pequenas casinhas que abrigam os mineradores.
- O emperrar da cadeira motorizada representa a ilusão de autonomia da aristocracia?
Logo após a cena comentada anteriormente, durante esse passeio, a cadeira de Clifford emperra no meio do caminho. Ele insiste diversas vezes que a cadeira vai funcionar e de que não vai precisar da ajuda de Mellors, cuja classe social é menor que a de Clifford. Mas no final, ele, com muita raiva, acaba sendo ajudado por Mellors. Essa simples cena de Mellors empurrando a cadeira de Clifford mostra a ilusão de autonomia da aristocracia, que se diz independente, mas que na verdade, apenas se sustenta devido ao trabalho das classes mais baixas.
Uma outra parte interessante é de que a história tem várias características autobiográficas. Como os problemas respiratórios que Mellors tem devido a uma pneumonia, é também uma característica do autor, que sofreu grande parte da sua vida de tuberculose, que inclusive o matou. A impotência de Clifford também é uma característica de Lawrence, que sofria desse problema em consequência de seus problemas respiratórios.
Um outro ponto que eu gostaria de comentar são as opiniões um tanto que problemáticas de Mellors, que diz que mulheres que satisfazem a si mesmas são lésbicas e de que homens que não "fazem o seu papel de homem", como ser dominante/machão, são homossexuais.
Também achei meio esquisito o romance entre a Connie e o Mellors, que basicamente se resumia a relações sexuais. E também me incomodava muito que, mais no início do relacionamento, me parecia que Mellors estava usando Connie para esquecer os problemas do mundo e valorizava apenas o corpo dela e não quem ela era, enquanto ela queria algo mais sentimental com ele. Ela era até um pouco obsessiva, perguntando incessantemente se Mellors a amava (basicamente obrigando ele a dizer isso, mas é curioso que ele não dizia que amava ela, e sim a sua vagina) e de que nunca mais ia deixá-la.
Acho que é isso que tenho a dizer sobre essa obra. Apesar de reconhecer a profundidade que ela tem, ela não funcionou muito comigo. Mas tem chance dela funcionar com você! Por isso que, apesar de não ter gostado muito, recomendo a leitura pois acredito que vale a experiência!
Também agradeço a Antofágica, que melhorou muito a compreensão dessa obra com os textos de apoio e as videoaulas sobre o livro!