spoiler visualizarO Livro da vez por David Thomas 27/08/2020
Resenha: Jubiabá, de Jorge Amado (Youtube: O Livro da vez por David Thomas)
Análise da Obra
Informações técnicas da obra:
• Título da Obra: Jubiabá;
• Autor/Autora da obra: Jorge Leal Amado de Faria;
• Editora da Obra: Círculo do Livro;
• Data de publicação: 1935.
Espírito/ Essência da obra:
• Gênero textual: Romance Proletário;
• Escola Literário/Período literário: É um romance do Modernismo. “Nessa fase os escritores revelariam em suas obras uma grande preocupação com os problemas sociais de seu tempo”;
• Ambiente físico e temporal da obra: Morro do Capa Negro, Salvador;
• Tipo de narrador: Narrado em 3ª pessoa, narrador-onisciente.
Enredo:
No auge de sua militância política em 1934, Jorge Amado se dedicava a escrever sua quarta obra a ser publicada e quinta a ser escrita: Jubiabá. Foi o quarto romance de Jorge Amado que o tornou de fato famoso como escritor, pois foi o que teve mais repercussão. Foi também o primeiro romance a trazer um negro como protagonista na Literatura Brasileira. Indicado como o “Romance da Raça Negra do Brasil” e não é por acaso que esse romance é protagonizado por um personagem negro: Antônio Balduíno ou o Baldo. O escritor no início dos anos 1930 se tornava cada vez mais comunista e não escondia a posição que preferia para seu herói. Os personagens Amadianos são figuras do povo que Jorge Amado conhecia muito bem e nesse romance não será diferente. Em todo território brasileiro nos deparamos com a desigualdade convivendo lado a lado e em Jubiabá conhecemos o negro protagonista, Antônio Baduíno, observando as luzes da cidade no morro do Capa Negro e refletindo como deve ser viver naquele lugar. Menino vagabundo, típico moleque de rua, tão cedo já era chefe da quadrilha de moleques que praticava molequices no morro do Capa Negro. Não conhecera o pai nem a mãe, mas construiu para si mesmo a imagem de um pai herói que nada era capaz de desfazer, ainda bem! Além de ver as luzes da cidade, Antônio Balduíno se divertia e aprendia muito ao ouvir as inúmeras histórias contadas pelos moradores da região. Morava com a tia Luísa (irmã do pai dele), que para ele era o pai e a mãe. Ela para sobreviver e sustentá-lo fazia mungunzá e mingau para vender no terreiro do personagem que leva o título da obra: Jubiabá. Jubiabá era o homem mais respeitado e também temido, especialmente pelos moleques de todo morro do Capa Negro. Era o patriarca daquele grupo de negros e mulatos, quando ele falava todos o escutavam atentamente. Jubiabá era o Babalorixá do morro do Capa Negro, mais conhecido pelos meninos como “O Feiticeiro”, por esta razão era muito temido, curava todas as doenças e fazia feitiços fortes. Há também Zé Camarão, um malandro desordeiro que vivia sem trabalhar, mas que a garotada o queria como ídolo, pois Zé Camarão ensinava-lhes capoeira e Antônio Balduíno era capaz de passar horas ouvindo suas histórias, assim como as mulheres que também não perdiam a chance de vê-lo falar e cantar. À vida no Morro do Capa Negro era muito dura e difícil para seus moradores, os homens trabalhavam carregando e descarregando navios, conduzindo malas de viajantes e outros trabalhavam em fábricas, em cargos pobres, sapateiros, alfaiates, barbeiros, sem a mínima possibilidade de mudança. Já as mulheres negras trabalhavam fazendo a comida em casas ricas de bairros nobres; os meninos mais velhos eram engraxates, vendiam jornais; os mais novinhos, como Baldo, passavam os dias no morro se divertindo com brincadeiras, travessura e brigas de moleques. Este é o universo que o protagonista é apresentado ao leitor. Embora se olharmos a nossa própria estrutura social e à vida dos mais pobres, especialmente os moradores das “favelas” de nossas cidades, veremos que não é nada difícil desenhar essa imagem na nossa cabeça, muito pelo contrário, não é mesmo? Apesar de novo e tendo suas reflexões influenciadas por todas aquelas histórias que o povo do Morro contava, Antônio Balduíno questionava a si mesmo sobre essa estrutura social que não permite que pessoas como os moradores do Capa Negro ascenda socialmente e nesse momento ele tem um “momento epifânico” que será de muita importância para o personagem dele e também para todo o enredo. Outra personagem é a Augusta das Rendas, mulher misteriosa quanto ao seu passado, que chegou no morro e ficou. Além disso ela vê constantemente um espírito muito familiar, mas que ela nunca dizia de quem se tratava (tal como Fadul Abdala, de Tocaia Grande e também Dona Flor e seus dois maridos). Um dia tia Luísa enlouquece e vai parar num hospício, morrendo logo depois. Numa cena muito triste Antônio Balduíno é levado do morro do Capa Negro para ir viver com o Comendador Pereira, sua esposa Maria e sua filha Lindinalva, na Travessa Zumbi dos Palmares, que é descrita como uma rua agonizante, com casas velhas, parecida com um cemitério e que morava uma legião de trabalhadores. A família tenta educá-lo, chegando até mesmo a matriculá-lo numa escola (que logo é expulso), proibindo-o de fumar e corrigindo-o quando ele fala palavrões. A empregada da família, Amélia, bate nele constantemente por ser negro. Contudo há uma atração no garoto para tudo que não presta, que o afasta do correto. Agora trazendo um pouco mais para a nossa realidade, será que não conseguimos observar inúmeras semelhanças entre o personagem Baldo e os inúmeros meninos de rua espalhados pelas cidades brasileiras? A empregada da Família, Amélia, era uma mulher racista que batia constantemente em Baldo e um certo dia o acusa de olhar com desejo para a menina Lindinalva. Apesar de não ser verdade, na noite que isso ocorre, ele percebe que está apaixonado por ela. A personagem Lindinalva foi uma recriação de uma prostituta que Jorge Amado conheceu em Maceió em um determinado momento de sua vida (Jorge Amado teve vários envolvimentos com prostitutas ao longo de sua existência). Nessa noite ele foge da Travessa Zumbi dos Palmares sentindo um grande ódio no coração por todos os brancos. Após fugir Antonio Balduíno se torna de fato um mendigo, tanto que o próprio título desse capítulo leva esse nome. Agora Antônio Balduíno não é mais o chefe dos meninos do Morro do Capa Negro e sim dos meninos de rua que vivem de “malandragens” piores e também de pedir dinheiro, usando sempre de mentiras e apelos emocionais, passando também a roubar. Os meninos crescem e cada um toma um destino diferente. Antônio Balduíno volta para o Morro do Capa Negro e vai "vagabundear" junto com Zé Camarão. Aos dezoito anos Antônio Balduíno já se torna um negro homem e muito desejado pelas mulheres da cidade. Se envolve sempre com Joana, mas pensando sempre em Lindinalva. Um dos principais lugares do livro trata-se do Terreiro do pai Jubiabá. Lá os negros do Morro do Capa Negro se reúnem para praticar sua religião, conversarem sobre as coisas da vida. Jubiabá é procurado pelos moradores do morro para solucionar diversos conflitos pessoais, especialmente amorosos, mas também é procurado por doutores, pessoas ricas que vêm de longe para procurar os famosos trabalhos espirituais desse sacerdote candomblecista. Antônio Balduíno (Assim como Tição de Tocaia Grande, vi muita semelhanças nos dois personagens) se envolve com várias mulheres e um dia ele se encanta pela beleza de Maria dos Reis, noiva do soldado Osório. Os dois entram numa luta corporal e desde então Antônio Balduíno se torna um boxeador famoso, participando de vários campeonatos. Outro evento que constantemente se repete na narrativa é quando Baldo fica observando no cais os navios saindo e chegando, sempre sonhando em um dia ser marinheiro e assim viajar pelo mundo. No meio do livro esse sonhado dia chega após um breve "momento epifânio” e Antônio Balduíno embarca no “Viajante sem Porto” e vai se aventurar em outras terras, indo buscar o seu caminho. Nem bem se estabelece numa dessas cidades, ele mata um homem para defender a jovem Arminda e acaba fugindo pelos matos. Quando está voltando para à Bahia, Antônio Balduíno vai trabalhar em um circo e lá conhece “Rosenda Rosedá”, uma dançarina que logo ele se encanta. Mesmo tendo se relacionado com inúmeras mulheres ao longo da vida, Antônio Balduíno nunca esquecera Lindinalva. A filha do comendador que um dia adotara Baldo, acaba sendo abandonada grávida pelo noivo logo após a falência e morte do pai, sem muitas alternativas, torna-se “Mulher da vida”. Pouco depois ela morre e pede para ele e Amélia (a empregada racista da família de Lindinalva) cuidarem juntos do seu filho. Um fato curioso é o momento que Amélia, que detestava o negro quando era menino, reconhece seu erro e de forma indireta pede desculpas, dizendo que só queria o melhor para a menina Lindinalva. Por conta da pobreza inúmeras vezes vamos nos deparar com Baldo pensando em se jogar no mar e cometer suicídio. Ele que enxergava no sistema capitalista um sistema opressor e dizia que jamais seria um escravo, que seria livre, torna-se a partir de então um escravo das horas, do trabalho, dos “donos de capital”. O romance termina com Antônio Balduíno participando de uma greve que paralisará toda a cidade e culminará na vitória de todo o proletariado.
Aspectos influenciadores da obra:
• Querendo escrever o romance honesto da raça negra do Brasil, Jorge Amado procurou Martiniano Eliseu do Bonfim (filho de escravos nigerianos, mas nasceu livre, considerado o maior sábio da época nos estudos de língua e cultura Iorubá). Quando o romance terminou Martiniano foi um dos primeiros a recebê-lo. Era uma época que poucos buscavam conhecer a contribuição negra na formação do país. Jorge Amado garantiu que não se baseou em Martiniano na construção dos personagens;
• O personagem Jubiabá foi sim inspirado no Babalorixá Severiano Manoel de Abreu que foi além de babalorixá, também um capitão do Exército de Salvador. Jubiabá era o nome que Severino se fizera conhecido havia décadas. Em fúria ele disse que leu junto com sua família e que todos detestaram a obra. Disse que não se podia ler de tanta pornografia. Severino em sua época também ajudava a população a se comunicar com os espíritos, mas que jamais tinha morado em casa de barro, que sempre teve posses e que não praticava "Macumba" e sim "Espiritismo". Diferente do personagem Amadiano.
Minha opinião sobre a obra:
1. Trata-se de um “Romance Proletário”, portanto haverá muitas denúncias ao longo da leitura ao Capital e a opressão que ele exerce nos mais vulneráveis socialmente. Vamos encontrar também muitas críticas ao Racismo;
2. Antônio Balduíno me lembrou muitas vezes o negro Tição do livro: Tocaia Grande.
• Aspectos negativos observados:
1. É claro que temos que olhar para essas obras com a visão do autor, do local e da época em que foram construídas, mas eu particularmente não consigo ver o personagem do Baldo como uma vítima do sistema capitalista e/ou do racismo. Baldo, assim como muitos desses personagens reais que se denominam “vítimas do Capitalismo e do Racismo”, teve sim a oportunidade de mudar a sua trajetória. No caso desse protagonista, vê-se todo o apoio que ele recebeu no início do livro e mesmo assim o narrador deixa claro que Baldo queria mesmo era viver nas ruas, não queria estudar, etc. Na época que Jorge Amado escreveu esse livro ele estava no auge da sua obsessão comunista, portanto a completa vitimização desse herói é compreensível. Já o que não podemos fazer é olhar para ele e achar que todos os meninos de ruas da realidade são tão vítimas quanto Baldo, pois eles não são;
2. Ler “Jubiabá” foi quase que ler uma obra Marxista. O Romance transborda críticas ao Capitalismo e coloca o povo trabalhador como uma eterna vítima do sistema. Não quero dizer com isso que não haja de fato a relação: “opressor vs oprimido”. Contudo no livro isso acabou ficando exagerado e chega ser um pouco cansativo o excesso dessa característica no decorrer da leitura;
3. O final (em minha humilde opinião de leitor, é claro) é cansativo e tedioso. Antônio Balduíno e todo o proletariado realizam uma greve, fazendo várias reivindicações e esse evento irá se desenrolar em cinco capítulos extremamente maçantes. Além do fato de Jorge Amado fazer um verdadeira apologia a realização de greves, chegando a endeusá-las. Claro que em determinadas situações elas podem se fazer necessárias, mas não realizam milagres e cada caso é um caso, não é mesmo!?
• Aspectos positivos observados:
1. Ler as obras Amadianas é entrar em um léxico repleto de expressões regionais e também de algumas palavras que já caíram em desuso. Algumas que me deparei ao longo da leitura e confesso que não as conhecia são: Xibungo, termo pejorativo para se referir a homossexuais masculinos; Cabrocha, termo da língua usado para classificar uma pessoa mulata escura; "cutuba", adjetivo que significa força, coragem, valente; “Tocar bronha”, masturbar-se.
site: https://www.youtube.com/watch?v=eboueFxTon0&t=2s