z..... 05/04/2016
Que surpreendente! Até então não conhecia nenhuma adaptação para os quadrinhos de "A Divina Comédia". Seymour Chwast fez uma versão com uma simplicidade legal, na arte e roteiro, que permite uma visualização e compreensão de um ponto chave: a crítica à sociedade e religiosidade hipócritas.
O livro está sintetizado de uma forma atrativa, podendo ser lido de única vez, sem ser cansativo e sempre instigante. Parece aquelas tiras de jornal com humor politizado, tratando através de analogias, com uma velada crítica, o que talvez pudesse soar agressivo em um contexto mais direto. Afinal, tinha quer ser meio maluco e corajoso para peitar os dominantes (igreja e estado, que se misturavam) lá pelos idos do século XIV. Através de sua arte Dante faz isso.
A história em si, que faz uma viagem estereotipada pelo Inferno, Purgatório e Paraíso, tem encontros com várias personagens e situações inusitadas, provocando uma conclusão ao leitor. Inconscientemente ele vai reconhecendo algo daquilo em nosso universo, concordado ou não, mas constatando e tendo criticidade. Oras! Como ser impassível a colocações e exemplos diversos, da história e da realidade cotidiana próxima. Por que aconteciam aquelas coisas? Por que aqueles figurões da história e de mitos universais estavam ali? Aquelas almas tem coisas que reconheça, talvez em mim? Religiosos no Inferno, que houve? E por aí vai...
De certa feita li uma famosa obra da literatura cristã chamada "O peregrino", de Jonh Bunyan, que idealiza uma viagem do cristão à cidade celestial, mostrando várias situações e personagens instigantes a uma reflexão. "A Divina Comédia" é um pouco assim, às avessas, com uma viagem surreal também. As duas são analogias e, importante, provocativas a enxergá-las aqui e agora em nossa realidade.
Essa HQ me ajudou a consolidar isso, pois os textos originais sempre me pareceram esquisitos. Sou do tipo que tem que desenhar para que entenda certas coisas... KKKK. E nisto a HQ está bacana.
Algumas coisas não entendi, são próprias ao contexto do Dante, mas no geral é em uma disposição de criticidade que a história se constrói. Há citações bíblicas, apócrifas, de mitos antigos, de personalidades históricas, e do contexto de vivência do autor.
A arte, um pouco mais sobre isso, tem uma estética que lembra os anos 20, ou por aí, onde a simplicidade exaltou a complexidade da obra.
Gostei! Em uma releitura do clássico vou estar menos alienado.