Tauami 20/07/2016
"O ponto que chama atenção nos contos de Lord Dunsany é o tom de oralidade que eles possuem."
A fantasia, juntamente com o terror, sempre foi um gênero que me atraiu. Como não se encantar com seres míticos que rasgam os céus com asas repletas de escamas douradas e poderosas baforadas de fogo? Como não se sentir arrebatado diante da beleza dos vales de Valfenda ou estarrecido com a desolação do mundo de Conan, o Bárbaro? Esses expoentes encontram em Lord Dunsay um denominador comum, em termos de inspiração. E em Contos Maravilhosos conseguimos ter um pequeno vislumbre do porquê disso.
Contos Maravilhosos é uma obra dividida em dois agrupamentos de contos. Na sua primeira parte, nomeada O Livro das Maravilhas, somos apresentados a um universo fantástico vastíssimo. No primeiro conto, A Noiva do Cavalomem, nos deparamos com a história de Shepperalk, o centauro, que em seu quinquagésimo aniversário cumpre as tradições que lhe foram passadas pelos seus antepassados, antigos conquistadores que haviam ganho a batalha contra dezessete cidades humanas junto à muralha da cidadela dos deuses. Aqui já temos uma pequena ideia da grandiloquência desse universo esparso, repleto de histórias e lendas, criando por Lord Dunsay. Entre essas várias lendas narradas nesse tomo, está o incomparável sr. Nuth; um ladrão tão hábil que até as sombras fazem mais barulho que seus passos. Seus feitos são citados mais de uma vez nessa obra. Em Como Nuth Teria Praticado Sua Arte Contra os Gnoles, nos é contado o destino de Tommy, um rapaz com potencial que se torna aprendiz do insuperável ladrão.
No segundo tomo da obra, chamado de O Último Livro das Maravilhas, os cenários das narrativas se modificam. Somos transportados por vilarejos, localizados em regiões rurais, por onde histórias são contadas de modo discreto, quase buscando não serem ouvidas. O vislumbre de locais onde os humanos não deveriam pousar os olhos, como em A Cidade na Charneca de Mallington, e segredos aterradores conhecidos por apenas alguns poucos escolhidos, caso de Por Que o Leiteiro Estremece Quando Percebe a Chegado do Amanhecer, parecem histórias contadas por anciões vividos, que há muito abandonaram a agitação das cidades e que em meio a reclusão do campo tivessem se dado conta de coisas maiores que a própria vida. Coisas que nunca deveriam ser reveladas.
Ainda nesse tomo somos reapresentados a outras lendas que pouca significação tiveram no primeiro livro. O grande Capitão Pirata Shard tem sua derradeira aventura contada em Uma História de Terra e Mar. Aqui, presenciamos o grandioso feito de capitão, que após decidir voltar a pirataria, se vê cruzando o deserto do Saara com o seu navio, o Desperate Lark, que ganha rodas para efetuar essa arriscada travessia enquanto é perseguido por um gigantesco exército de Árabes. Também não poderia deixar de falar de O Clube dos Exilados, que se tornou o meu conto favorito dessa belíssima reunião. Aqui temos um estudioso de mitologia que, ao ser apresentado a um clube de adoradores de Deuses Antigos e Inomináveis, descobre segredos irão abalar sua vida para sempre.
O ponto que chama atenção nos contos de Lord Dunsany é o tom de oralidade que eles possuem. Sendo que a maior parte das histórias narradas é contada em terceira pessoa, o leitor tem a impressão de estar lidando com um conjunto de lendas que se dissemina no boca a boca. A ausência de resolução da maior parte das narrativas, deixando pairar um mistério sobre a veracidade daquilo nos é contado, também traz essa sensação de que estamos diante de algo que aconteceu com um amigo de um amigo meu.
Embora muito erudito, Lord Dunsay desenvolve suas tramas com uma linguagem clara, quase econômica. Descrições mais detalhadas sobre os ambientes por onde atravessam os desenrolares das narrativas são feitos muito rapidamente, identificando um número suficiente de características dos espaços para que nossa imaginação possa trabalhar.
Contos Maravilhosos é um excelente apanhado daquilo que foi escrito por esse consagrado autor do século XX e agradará especialmente aqueles que se divertem com curtas e bem trabalhadas histórias de literatura fantástica.
Sobre o Autor –
Edward Plunkett, 18º Barão de Dunsay, foi um escritor e dramaturgo irlandês reconhecido especialmente pelos seus trabalhos envolvendo fantasia. Entre aqueles que dizem ter sido influenciados por suas obras, encontramos nomes notáveis como Gillermo Del Toro, J.R.R. Tolkien e H.P. Lovecraft. Extremamente erudito, Dunsay publicou mais de oitenta títulos e concorreu a um prêmio Nobel.
Ficha Técnica –
Lord Dunsay - Contos Maravilhosos
Tradução: Gabril Oliva Brum
Lançamento no Brasil – 2011
Editora Arte & Letra