Iarelena 23/02/2009
"O povo de Iemanjá tem muito o que contar" (Jorge Amado)
Uma história do povo do mar, povo da Bahia, num lugar que é possível de se ver e conhecer em cidade ou outra deste estado. Num tempo determinado, num lugar determinado, numa estrutura narrativa marcada pela simplicidade dos contadores de histórias. Com conteúdo socialista. E ajudou a dar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras ao Imortal Jorge Amado. Objetivamente, é isso, mas quem leu sabe que 'Mar Morto' é muito mais.
A história de um pescador, num vilarejo extremamente pobre, cheio de crendices, aventura e coragem. Um clichê do herói e da pobreza nordestina. Mas Guma é muito mais que isso.
Conceitos e supostas lições que bebem da sabedoria do povo, isto é, sem qualquer tipo de validação acadêmica, comprovados apenas pela escola da vida. Menores ou maiores, dependendo de quem os lê e ouve. Mas não seria para Guma, Rosa Palmeirão e Iemanjá, ao mesmo tempo mães e amantes do pescador? E os sentidos, que imperam entre os moradores? E os Deuses que dançam?
Mar Morto é muito mais que uma obra socialista e regionalista de Jorge Amado. Mais do que socialista porque não é uma mera denúncia e luta de classes, há mais envolvido nisso - E explicar o quê acabaria denunciando partes importantes a quem não leu. Mais do que regionalista porque Jorge não fala simplesmente de pessoas de uma região, mas fala por elas. E com uma verdade que não torna aquilo simplesmente característico de um lugar e de um tempo, mas torna particular. Particular a quem escreve, particular a quem faz parte da história, particular a quem lê. Cria-se um relacionamento com cada um dos fascinantes personagens, e não menos reais por isso: Críveis. E incríveis.
Jorge, "menino grapiúna" e imortal da Academia Brasileira de letras, reveza-se nos dois papéis como um contador de histórias da beira do cais. Sem sê-lo de fato, admitindo, pois como disse: "Se ela não parecer bela, a culpa não é dos homens rudes que a narram. É que ouvistes da boca de um homem da terra, e dificilmente um homem da terra entende o coração dos marinheiros. Mesmo quando esse homem ama essas histórias e essas canções e vai às festas de dona Janaína, mesmo assim ele não conhece todos segredos do mar. Pois o mar é mistério que nem os velhos marinheiros entendem." Mas fazendo mesmo assim. E de forma magistral, deliciosa e inesquecível.
Um romance que foi traduzido para inúmeros idiomas, porque não fala simplesmente o português da linha do cais. Mas a língua dos sentimentos, dos sentidos e dos sonhos, que é geral ao homem.