Nath @biscoito.esperto 09/05/2024“Nesse momento o senhor Golyádkin não só queria fugir de si mesmo, mas deixar-se destruir completamente, não ser, virar pó”.Apesar de ser fã de carteirinha do Dostoiévski, eu nunca tinha me identificado muito com as personagens dele. Não me entenda mal: as personagens que povoam as páginas dostoievskianas são geniais, mas não se parecem em nada comigo, uma professora de 27 anos do século XXI. No entanto, ao ler “O Duplo”, pela primeira vez eu pude me ver numa personagem, e não foi uma experiência muito confortável.
A trama de “O Duplo” começa quando nosso protagonista, Yákov Golyádkin, está se preparando para comparecer a um jantar importante. Ele é um funcionário público comum que não pode sair ostentando por aí, mas neste dia ele aluga uma carruagem para o dia todo, vai ao médico e faz compras como se fosse herdeiro da realeza. No entanto, quando ele de fato chega ao jantar, descobre que o dono da casa mandou os criados não o receberem, e Golyádkin é enxotado sem mais explicações.
No dia seguinte, ao chegar em seu departamento para mais um dia de trabalho, Golyádkin descobre que contrataram um novo funcionário. O que ele não esperava é que o novo colega de trabalho fosse exatamente igual a ele na aparência, nas vestimentas e até no nome. A única mudança é na personalidade: enquanto o Golyádkin original é inapto socialmente, seu duplo é uma pessoa cheia de carisma, automaticamente adorado por todos.
Vou explicar por que me identifiquei tanto com Golyádkin: em 95% do tempo este personagem não faz ideia do que as pessoas esperam dele e não sabe agir corretamente em nenhum contexto social em que se encontra, e minha vida sempre foi assim. Sabe a expressão em inglês “read the room”? Ela é usada para falar: “Preste atenção ao seu redor quando for fazer ou dizer algo”. Bom, eu tento ler o ambiente a todo momento, mas parece que estou lendo como uma criança que está sendo alfabetizada. Com Golyádkin é a mesma coisa, e é DESESPERADOR vê-lo ser humilhado, ignorado e ofendido por todos ao seu redor sem saber o que ele está fazendo para receber este tratamento.
A narrativa do Dostoiévski normalmente já é sinuosa e febril, mas este livro tem trechos tão tortuosos que às vezes eu precisava pausar a leitura no meio de um capítulo para dar uma respirada. Este livro definitivamente não é uma obra fácil de ler e eu não o recomendaria para quem nunca leu nada do autor. Mas não se engane: este é mais um livro absolutamente brilhante do Dostô. Se você já conhece a narrativa do autor, eu recomendo demais esta leitura!
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