fra5n 18/09/2024
O futuro não é esperançoso
Eu sou uma pessoa pessimista. De verdade, não é uma afirmação exagerada. Na terapia, descobri que meus pensamentos caminham com muita facilidade para uma linha altamente catastrófica (risadas nervosas). Isso significa que minha distorção mental sempre foca nos piores contextos possíveis para os problemas que vivencio. Ler Futuro Ancestral, como era de se esperar, não me deixou nada otimista. Isso é totalmente um problema dos meus problemas mentais, e não do livro. Não estou dizendo que Ailton Krenak remove esperanças; na verdade, acredito que ele tenta ajudar nós, não indígenas, a encontrar um rumo para sair desse limbo desesperançoso.
Não acho que posso acrescentar qualquer comentário útil à discussão sobre o que o futuro nos espera. Não que eu ache que toda resenha literária precise contribuir com algo. A questão é que, sendo naturalmente pessimista, nem mesmo o consolo de Krenak me permitiu sentir esperança. Dizer que pensar demais sempre foi meu problema é um vasto eufemismo. O futuro sempre me assombrou, e não me refiro apenas às questões ambientais emergentes que estamos vivenciando. O sentimento de desconexão com a realidade e o desapego em relação à minha própria existência me afligem desde os 11 anos, sim, eu sei. Com 23 anos, e finalmente aprendendo a lidar com a enxurrada de pensamentos que tenho, ainda não consigo me desapegar totalmente da desesperança. Foram muitos anos tendo-a como aliada. E Ailton fala disso e muito mais.
Ler Futuro Ancestral não me foi incômodo; para uma pessoa que vive há muitos anos apenas pensando no pior, refletir sobre a atual situação do Brasil e do mundo não me incomoda, me enfurece. Tanto que, por vezes, fico sem ar. Confesso um quê de prepotência da minha parte em escrever sobre este livro sem realmente discuti-lo. Eu poderia mencionar que, em 2022, o desmatamento no Brasil, sobretudo para o agronegócio, respondeu por quase metade das emissões de gases de efeito estufa, ou que, nos primeiros seis meses de 2024, o Cerrado perdeu 347 mil hectares de vegetação nativa, uma área equivalente a três vezes a cidade do Rio de Janeiro. É mais comovente ser específico ou trazer fatos gerais?
Pensando que está longe das minhas capacidades acrescentar qualquer argumentação que já não esteja sendo discutida mundialmente, me limito apenas a citar alguns trechos do livro.
Em ?Saudações aos rios?, Ailton fala sobre o abuso aos rios e o descaso da humanidade com esse bem tão precioso. Como um recurso abundante e renovável pode estar se tornando escasso? Simples, rios e lagos são os ecossistemas mais degradados do planeta.
Em ?Cidades, pandemias e outras geringonças?, ele escreve que a pandemia não veio para ensinar nada, mas para devastar nossas vidas. ?Se você está achando que alguém que vem para te matar vai te ensinar algo, só se for a correr ou a se esconder. Os brancos que me perdoem, mas eu não sei de onde vem essa mentalidade de que o sofrimento ensina alguma coisa. Se ensinasse, os povos da diáspora, que passaram pela tragédia inenarrável da escravidão, estariam sendo premiados no século XXI. Eu não tenho nenhuma simpatia por essa ideia; não quero aprender nada às custas de sofrimento?.
De forma geral, Futuro Ancestral é provocativo e reflexivo (e bota reflexão nisso). Krenak, grandiosamente, nos apresenta sua percepção de mundo e nos oferece a oportunidade de refletir não sobre o futuro, mas sobre o presente, sobre o cotidiano e o que estamos fazendo com ele.