Auristela 05/01/2024
A CONSTRUÇÃO DA MALDADE – COMO OCORREU (…) *
Li. Achei assustador. E bem generalizado também. O Brasil, no assunto da Segurança Pública, foi comparado com outros países e ficou feio (perigoso) na foto.
Segundo o autor: 1) temos jovens presos de menos, 2) pessoas armadas de menos, 3) fuzis demais nas favelas, 4) legislação penal frouxa e, 5) se o STF deixasse de existir, tecnicamente faria um favor à polícia, porque lá no STF decidem errado, sabe?
Ademais, nos rotulou de povo inocente que não acredita na existência da maldade.
Falou muito na “escolha das palavras”, mas sem dizer explicitamente, sugeriu que ser alguém bondoso, ter compaixão, crer no arrependimento e regeneração de uma pessoa que cometeu um crime, ou acreditar que o bem sempre vence no final, é ser culpado de estar cometendo um crime moral que favorece os bandidos, ou de que os bandidos se aproveitam.
Mil juízes garantem, todos os dias, que nenhum menor infrator será espancado fortuitamente pela polícia, ou por outros cidadãos se aproveitando de uma situação de flagrante indefeso, o escritor acha isso ruim, também. Mas, e se fosse teu filho sendo levado à delegacia porque sem querer se viu no meio de uma confusão ou encrenca, você não ia querer que algum juiz garantisse a segurança do teu filho, prioritariamente?
Se só podemos ter às mãos os casos pinçados pelo escritor – dados sequer segregados por Estado – , e se temos que pensar como ele, obrigatoriamente, sob pena de sermos considerados idiotas, isso já é a nossa própria prisão.
Sou grata pelas explicações sobre a dinâmica da lei, de detalhes que conjugados promovem a insegurança jurídica de quem combate o crime. Também sobre a audiência de custódia, a progressão da pena, a liberdade condicional, equívocos dos Códigos Penal, Processual Penal e de Execução Penal, Lei dos Crimes Hediondos, ECA, etc. Tudo isso ajuda a reformar o pensamento. Mas, antes de ler Roberto Motta, li Victor Hugo: Os miseráveis; O último dia de um condenado; Claude Gueux. Estas obras não prosperaram no tempo em vão – ficaram para a construção da bondade.
O que eu li no Roberto Motta não foi bem bondade. Foi mais um discurso inflamado, dividido em vários capítulos. Teve, é claro, aquela cena em que ele tira os fumantes de maconha da praia, porque a família dele estava ali. Achei bem legal saber que qualquer pessoa pode pedir para as pessoas que fumam maconha na praia saírem da praia, inclusive recorrendo ao auxílio da polícia. Eu não sabia. Vou tentar praticar no verão.
Um parêntese: voltando meus olhos para nossa linda Santa Catarina, aproveito dizer que o calçadão (parque linear) que o município de Penha fez lá no final da praia, com balança Instagramável e tudo, de lugar de paisagem natural, agradabilíssimo para se ir passear, agora reformado, democrático e acessível, virou, antes, um lugar insuportável, com vendinha de tudo gerando lixo, multidão se esbarrando, ponto de fumar narguilé, maconha, cigarro de cravo. Não vá para lá em hipótese alguma numa tarde de sol em final de semana, principalmente com crianças, que não merecem ter essa ideia de praia – o lugar é impróprio para banho também.
Temos em mãos um caderno de anotações de um homem que esteve, de passagem, ocupando dois cargos públicos relacionados à Segurança Pública do Rio de Janeiro, com acesso privilegiado a pessoas, histórias, números, quais catalogou, editou e nos vendeu. A despeito da nossa ingenuidade ideológica: nós compramos o livro, confiamos nele, não sei se é certo ou errado. É uma boa leitura, por fim, desconsiderada a capa, sutilmente tendenciosa – essa faz de todo aquele que pensa diferente do autor – a maioria, segundo ele mesmo -, defensor da MALDADE. Demérito da Editora, que se prestou a isso.
(*) Título completo do livro: A construção da maldade, como ocorreu a destruição da segurança pública brasileira, de Roberto Morra, Editora Avis Rara.