aretaaparecida 02/03/2024
Em muitos momentos, o livro pareceu uma autobiografia, indo além de aspectos que envolvem somente o pai mas também aspectos da sua vida pessoal desassociadas a ele, em certos momentos, pertinentes por dar um contexto de sua psique, de como era estar inserida na família, ser filha, mas em outros, desnecessários.
Suas memórias, a construção da narrativa, demonstra as enormes contradições, sua percepção ilusória do pai, os momentos de sua vida associado aos assassinatos ocorridos na mesma época. Os crimes e a visão dela como filha, vê-lo como pai, é extremamente contraditório, e é palpável como ocorreu uma disrupção enorme para ela. Em sua descrição, em determinados momentos parecia até irreal como realmente pareciam pessoas diferentes. O choque inicial que ela teve de pensar que o pai dela não seria capaz disso, que, como ela descreveu: ?era um homem de bem?, é um sentimento que ela conseguiu estabelecer bem para os leitores. Havia momentos, no entanto, em que ocorria episódios de violência psicológica, física, momentos em que conforme descritos pareciam ser raizes de muitos traumas, da sensação descrita por ela de ter que saber lidar com o pai, ou o episódio de estrangulamento de seu irmão mais velho em que nós, leitores, situados do caso ficamos ?.
Acredito ser importante pontuar que é um livro sobre a perspectiva de uma filha, ponto que vem com diversos aspectos sociais, psicológicos, simbólicos que envolvem esse aspecto. É sobre ser filha de alguém que foi um ser humano perverso, de maldade incalculável, mas que além disso, não se trata de uma perspectiva maniqueísta, visto que ele também foi um pai presente, que proporcionou muitos momentos, muito descritos nos livros, e que também levam em consideração as vitimas dos crimes. Acho muito complicado pontuar que ela procurou se vitimizar ou não teve respeito pelas vítimas quando é muito palpável quando ela procura descrever o quão desolador foi a quebra da ideia que ela tinha do pai e de quem ele realmente era, o sofrimento que ele causou as vítimas e aos familiares com as perdas, mesmo sabendo que sua própria família passaram por perdas desoladoras para eles, todas as implicações que estão associadas a isso, todos os momentos e memórias associadas a ele. Acredito que o ponto do livro não é ser investigativo, então o foco da narrativa não tem realmente esse intuito, mas que não significa que eles estejam nulos, ou desconsiderados.
Acredito que Kerri entende a responsabilidade do pai, muito de seus traumas, de suas quebras, não estavam apenas envolvidas com a ruptura da imagem de seu pai mas também da perversidade realizada com dez vítimas sem escrúpulos ou remorso. Espero genuinamente que toda a família seja envolvida por um acolhimento, apesar dela ter se encontrado na religião, mas também profissional, visto que foi um trauma que permeou a vida dela de forma incalculável e que eu ? particularmente ? não acredito que apenas o perdão possa ser um ponto de partida. Os danos permearão e permeiam em sua vida e na vida dos familiares das
vítimas por gerações.
Quanto a edição, tenho uma consideração as frases destacadas, que nem sempre se encaixavam aos capítulos que estavam inseridas e criavam uma quebra com algo sem relação alguma. No mais, a edição, como sempre linda.