livrosepixels 02/08/2023Mr. Nobody ou complô inimigo?Este deve ser o livro mais "pé no chão" dos que eu já li do autor, pelo menos (devem faltar uns dois pra eu ler todos os publicados pela Aleph). Apesar de ele se passar no futuro distópico e caótico de 1988 (foi escrito em 74 por ai), tem muita coisa que se mostra bastante atual, como por exemplo, o excesso de fama, a extravagância dos que são ricos e populares, bem como o abismo que pode levar uma pessoa que perde a sua "identidade", ou seja, que se torna anônima.
Acontece um evento curioso logo no começo, que motiva o miolo da história, que é o personagem ser atacado por um tipo de esponja/polvo alienígena. Porém, ficou bem mal contextualizado esse negócio e custei a entender o que estava acontecendo. Além disso, o autor joga um conceito que só lá pelo final é que vai ter uma certa explicação, que é o tal dos Seis. O tempo todo o personagem fica falando "sou um Seis" mas é quase lá pro final pra ter um sentido nisso.
Um problema recorrente das histórias de PKD é não saber retratar personagens femininas. Todas, sem exceção neste livro, são histéricas, sexualmente famintas e instáveis. Não tem nenhuma personagem com uma personalidade forte e que se preze. Ao contrário, o protagonista é tido como o todo poderoso, atraente, desejado por todas e sabedor das coisas. Se acha demais na verdade.
O background da trama também é outra coisa que não foi bem explorado: aqui temos um futuro altamente dependente de entretenimento televisivo, depravação e pior do que os atuais, já que uma lei controversa aprovada faz com que a população negra diminua gradativamente, até desaparecer. Sim, isso mesmo, o autor imagina um futuro onde, além de várias coisas intragáveis, controle policial constante, houve pessoas do poder que acharam uma forma de acabar com culturas e povos inteiros. Eu diria até que o cenário do livro é uma metáfora para o que foi o Nazismo.
Outro ponto também não muito gratificante do livro é a explicação de como Jason de um dia para outro se tornou uma despessoa, alguém que não existe naquele universo, apesar de estar ali, de carne e osso. Não me convenceu muito e achei bem corrido, como se o autor precisasse dar um fim pra história.
Por outra perspectiva, o autor discute bastante a relevância das interações sociais, limites do aceitável, poder da mente em acreditar em coisas que são irreais e até mesmo discute sobre o papel do amor como força mantenedora da razão. Pontos interessantes e que por si só fazem a leitura valer a pena.