edu basílio 16/05/2023+ exorcizar ghost(er)s +
"se você perguntar o que isso tem a ver com nossa história, te respondo
que se responsabiliza também quem vai embora. (...) todos têm o direito
de desistir a qualquer hora, todos podem retirar suas promessas. mas isso
é diferente de fingir que elas não foram feitas".
li este livro em razão de sua temática, bastante séria e delicada para mim: o "ghosting".
não achei um livro memorável. não vi um carisma real na protagonista e, no texto, faltou um tempero qualquer que o fez insípido para mim. uma pena, pois esse tema é matéria-prima rica para histórias de melancolia e dor, mas também de resiliência e superação, o todo com muita poeticidade e lirismo... mas aqui o que saiu foi a mais literal "sofrência" (eu quase podia ouvir na mente aquelas músicas horrendas de sofrência enquanto lia). tudo isso, infelizmente, tornou minha leitura cansativa, meio irritante.
leitura terminada, cerca de 10 dias se passaram.
mais cedo, uma grande amiga (que me conhece bastante bem) me lembrou que um podcast que nós dois ouvimos quase todo dia se dedicava hoje a esse tema. ao ler a sinopse do episódio, vi que uma das entrevistadas era justamente a autora. diferente do livro, o pod está excelente, e não darei spoiler nem de um, nem de outro.
(https://g1.globo.com/podcast/o-assunto/noticia/2023/05/15/o-assunto-960-ghosting-o-sumico-em-relacionamentos.ghtml)
mas quis me manifestar, e quis fazer isso por meio de uma reflexão mais intimista:
para quem o sofre, o ghosting é uma experiência de abuso e, como ocorre com muitas vítimas de violência, o abusado pode reagir procurando a culpa em si próprio. já cheguei a achar que ghosters se assemelhavam mais a sociopatas e sádicos... mas ao escrutinar minhas experiências na psicoterapia, retraçando o perfil de ghosters (no plural) de quem fui vítima, percebo que eles são sobretudo fracos, meio masoquistas até. têm em comum uma intoxicação por mães, pais, patrões, ex-orientadores ou ex-parceiros opressores e sufocantes, e a despeito disso onipresentes em suas falas. eles "amam odiar" essas pessoas, que encarnam a única forma de conexão que eles parecem conhecer.
por isso, ser acolhido, ser respeitado, ser tratado com carinho por você, tudo isso lhes é tão NOVO, tão BIZARRO às suas vivências, que eles preferem a "segurança do velho", o tratamento miserável e precário a que se habituaram em suas vidas. os sinais já estavam lá, piscando em neon, você é que não pôde ou não quis ver... então, como fantasmas, desvanecem, se silenciam sem explicação, por fraqueza, por vergonha, ou por um mix das duas coisas. retornam aos seus mundos "seguros", cuja toxicidade pode ser -- e frequentemente é -- bem maquiada com "super fotos no insta", "super CVs lattes"... mas estão lá, visíveis para os mais atentos (coisa que você não era), suas psiquês doentes, em cacos -- e cacos podem cortar. em poucas palavras: agem com deselegância e falta de educação porque não aprenderam sobre responsabilidade afetiva. e ninguém pode dar o que não tem, isso é matemática elementar da pré-escola.
entender isso é em alguma medida libertador, porque largamos no chão uma culpa que não nos pertence. talvez consigamos até trocar a eventual mágoa por uma espécie de dó... e, sobretudo, seguimos com o coração aberto, pronto para acolher quem tenha merecimento e coragem para habitá-lo.
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