Confissões de uma leitora 24/12/2020
Não costumo ler darks nacionais por motivos... melhor evitar a fadiga.
Esse me atraiu e eu pensei “por que não?”. Não é a primeira vez que vejo/ouço algo dessa autora nos grupos de leitura, e como sigo na vibe de ler quem nunca li, cá estou.
Curti demais a escrita objetiva, sem enrolação, deixando a leitura dinâmica.
Não parei de ler até ver o ponto final.
Handrey é uma força da natureza, regozijando de cada segundo de liberdade crua que o grupo neonazista, ao qual pertence, oferta. Não se trata apenas de fazer parte de algo independe se esse grupo faz ou não uso do juízo de valores éticos e morais de sua sociedade, é sobre a representação simbólica por trás desse pertencimento, o apoio e a força que isso dá ao sujeito, de ter um lugar no mundo, um porto seguro. É compreensível e verossímil dado seu histórico de vida familiar e sua faixa etária. Isso não é achismo, é ciência.
Então, um acontecimento terrível faz sua vida dar um giro de 180°.
É possível sentir que o momento é determinante na vida de Handrey. Um acontecimento tão poderoso tal qual é o seu amor e lealdade por seu irmão Jonny.
Não apenas isso, mas as consequências que o ocorrido gera.
Há conflitos, há confusão sobre suas escolhas, feitos e valores, mas também há clareza e surpresas quando ele se vê sozinho e a ajuda surge da onde menos se espera.
Existe um antes e um depois de sua prisão. E é interessantíssimo assistir o Handrey depois, é como se ele estivesse reaprendendo uma realidade até então desconhecida e inacessível, a qual lhe dá novas perspectivas, cores e sabores, novos sentimentos.
Handrey é agraciado com pessoas e situações improváveis.
E como podem imaginar, a mudança tende acompanhar os conflitos e vice-versa.
Eme é maravilhosa e uma guerreira. Aliás, tenho que ressaltar, achei fantástica a forma como a autora tratou o racismo estrutural, sem militar, tanto por parte de Eme (vítima) quanto por Handrey (agressor), mas, sobretudo, por Eme. Reproduzindo em palavras a vida real tal qual ela é, de como é viver em uma sociedade corrompida pelo racismo e preconceito enraizados até as entranhas, e reproduzido por todos, incluso pelas próprias vítimas.
Eme e suas irmãs fizeram meu coração inchar e ficar miudinho em muitos momentos.
Em relação ao romance, curti a forma como foi construído..., a curiosidade que os atrai juntos ainda que lutem contra, a tensão crescendo cada vez que estão próximos, bem como os desejos não verbalizados flutuando entre eles, é muito bom mesmo.
É, sem sombra de dúvidas, um casal com muita química.
Há ainda um suspense que nos coloca no modo on detetive e nos faz cogitar todo mundo, exceto quem, de fato, é o assassino. Aliás, que plot twist foi aquele, Jesus Cristo?
Simplesmente SENSACIONAL.
No entanto, há ressalvas, algumas coisas que me incomodaram como, por exemplo, a facilidade com que o grupo aceita seu desligamento.
Há um excesso de explicações, bem como da situação de abuso sofrido por Eme, por vezes isso é repetido de várias formas dando um tom apelativo e desnecessário.
Há também um excesso de cenas hot.
Gostei da mudança de Handrey, até certo ponto é crível então, há uma corrida contra o tempo para transformá-lo no bom moço. O mesmo ocorre com o romance.
Enquanto a atração e desejo foram lindamente construídos, o romance, o amor entre eles, foi tão rápido que pareceu ocorrer de forma abrupta, a la piscou, amou. Faltou um melhor desenvolvimento nessa parte, que seria facilmente arrumado com a exclusão dos excessos e dos pontos de vista do detetive Foster, que não acrescentaram em nada na história.
No mais, leitura recomendada.