Resenhas - A Canticle for Leibowitz

bardo 09/02/2024

Releituras são sempre experiências curiosas e claro um tanto perigosas, nem todos os livros passam pelo teste da releitura e da passagem dos anos e aprimoramento de bagagem. Não se trata, entretanto, do caso desse livro, se a releitura em português é um deleite a releitura no original possibilita uma experiência ainda mais interessante. Cabe dizer e o tempo de leitura deixa isso claro, não é uma leitura tão fluída. Certo que o andamento dessa leitura foi comprometido por outras leituras densas para o Traçando, parte da demora advém do próprio texto.
Explico, uma das coisas que o autor faz e que se perde na tradução (pelo menos nas traduções mais antigas, a da Aleph não li) é emular um texto antigo e arcaico, entre o literário e o bíblico/religioso. Para isso o autor utiliza muitas vezes pronomes e formas arcaicas do idioma inglês.
Cabe comentar também a abundância de textos em latim (não traduzidos que eu saiba em nenhuma edição). Ainda que muitos desses textos refiram-se a passagens ou ritos relativamente fáceis de serem identificados, o leitor não tão inteirado da liturgia e ritos católicos pode se perder um pouco.
Essas características de forma alguma trazem demérito a experiência de leitura, ao contrário, no texto original percebemos toda a sagacidade do autor.. Nada é desperdiçado, nada é jogado, aqui e ali o autor solta referências, deixa pistas: sejam citações bíblicas indiretas, citações literárias que podem passar desapercebidas ou a paródia escancarada, o texto de Miller é inventivo e instigante.
É preciso relevar a clara parcialidade do autor ao descrever seus monges, pode-se dizer que temos um singular exemplo de Sci-Fi católica aqui, tal predileção porém não tira o brilho das questões profundas e duras abordadas. Aliás a capacidade de Miller de fazer rir e no momento seguinte ou mesmo no meio do gracejo tratar questões complexas é impressionante.
A Canticle For Leibowitz é um livro enganosamente simples, que permite desde de uma leitura mais superficial: uma sombria perspectiva da burrice humana, a outras bem mais complexas e profundas. Obra imperdível que merece ser lida e relida que só cresce nas releituras.