CooltureNews 26/01/2013
Publicada em www.CooltureNews.com.br
"A casa estava desolada e vazia. O frio penetrava em cada canto. Uma fina camada de gelo tinha se formado na banheira. Ela tinha começado a adquirir uma coloração levemente azul. Ele achava que ela parecia uma princesa ali deitada. Uma princesa de gelo."
Culpem o fim do mundo e, some-se a isto o fato de ser uma sexta-feira 14, a última do ano (o que não significa absolutamente nada), mas escrever duas resenhas num mesmo ano é um recorde pessoal. Preciso dizer que ultimamente estava desesperada por algum livro que não envolvesse tons de coisa alguma. Algum tempo atrás, enquanto todas as mulheres estavam loucas com vampiros que brilham no sol, a única coisa que eu queria de Stephenie Meyer era distância. Agora que o único assunto literário nas rodinhas femininas é o Sr. Grey, não poderia ser diferente. De toda forma, apesar de não me interessar pela série e seus genéricos, confesso que me sinto meio hipnotizada e intrigada pela capa do livro "Toda Sua"... sempre que vejo fico alguns minutos pensando em como aquele salto parece desproporcional ao sapato e, se isso é a única coisa que me chama atenção no livro, é melhor que eu passe longe dele. Enfim, devaneios à parte, na verdade mesmo, a única coisa que tudo isso tem em comum com Camilla Läckberg é o fato de que a conheci tentando fugir da onda erótica que assola as livrarias do mundo.
Camilla Läckberg é uma autora sueca, o que de início me deixou bastante animada, já que um dos meus livros favoritos, "Deixa Ela Entrar" também é de um sueco, John Ajvide Lindqvist (o que uma coisa tem a ver com a outra eu não sei, já que tenho consciência de que o fato de terem a mesma nacionalidade não os torna indivíduos iguais, mas a incoerência faz parte da alma feminina :)).
A Princesa de Gelo é seu livro de estréia, a história gira em torno da morte de Alex, uma mulher sempre elogiada por sua beleza, mas ao mesmo tempo totalmente inatingível. Ao longo do tempo, Alex ergueu uma muralha em torno de si, o que a tornava indecifrável e distante, mas ao mesmo tempo era uma pessoa amável e que não cultivava inimizades. Tinha uma vida aparentemente normal, trabalhava em uma galeria de artes, tinha uma irmã com quem não tinha muita proximidade e era casada, mas mantinha um estranho relacionamento com Anders, um decadente pintor que dividia seus dias entre a bebedeira e as drogas.
Amigas muito próximas, num passado agora distante, Erica e Alex têm novamente seus caminhos cruzados quando numa manhã, enquanto fazia uma caminhada, Erica se depara com os pedidos de socorro de um estranho que a levam direto a uma cena de horror. Sua amiga de infância estava morta, congelada na banheira de sua casa, em circunstâncias que, inicialmente apontavam para um suicídio, mas que mascaravam um cruel assassinato e um passado de histórias ainda mais horrorizantes. Foram anos sem contato com Alex e uma despedida um tanto traumática da época em que eram amigas, mas mesmo assim, ela se vê em meio à investigação de seu assassinato, não só pelo que Alex representou em sua vida, mas Erica, que agora é uma biógrafa bem sucedida, viu no mistério da morte da amiga uma oportunidade de se firmar como uma romancista. Acho que, justamente esse embate moral, se seria certo que ela usasse esses fatos em benefício próprio estando tão intimamente ligada aos principais personagens da história, poderia ter sido mais bem explorado pela autora. No início a personagem se questiona se a família de Alex a julgaria mal por isso, se a veriam como uma oportunista, mas no decorrer do livro isso vai ganhando menos espaço e não é bem desenvolvido.
Junto com o detetive Patrick Hedstrom, que tem uma queda por ela desde os tempos de juventude, Erica descobre segredos e mentiras do passado de Alex que mudaram o rumo de várias vidas. Ela, que está de volta à sua cidade natal por conta da trágica perda de seus pais, tem que se dividir entre seu livro, a investigação e a preocupação com sua irmã Ana, casada com Lucas, um homem desprezível, cruel e manipulador. Lucas é um homem vil e, infelizmente não tão diferente de muitos na vida real. Seu casamento com Ana era marcado pelo terror psicológico, humilhações e violência física. Só dói uma pena não ter tido um final mais bem explorado, não achei que teve um desfecho a altura.
A primeira parte do livro é realmente empolgante, me lembrou um pouco Tess Gerritsen, rainha dos romances policiais, pela tensão que a história proporciona. É ao mesmo tempo cativante e revoltante e é impossível você não se pegar ao longo do dia tentando ligar os pontos que solucionam esse mistério. É uma história densa, que envolve relacionamentos familiares, mentira, poder e ganância. Me fez pensar em como o dinheiro, de fato para alguns, pode comprar qualquer coisa. Talvez para contrabalancear todo esse clima pesado a autora tenha investido num romance para Érica, o que, a meu ver fez com que a trama perdesse um pouco dessa tensão. Nada que fizesse o livro não valer a pena.
Não chega a ser "a nova Agatha Cristie", como alguns críticos exageradamente (ou, na base do jabá, o que é mais provável) a descreveram, mas, se por um lado pecou na conclusão de alguns personagens, por outro, Camila Läckberg construiu uma história envolvente, com muita tensão e, um pouco de romance que, se não acrescenta, pelo menos diverte, além de personagens reais, que enfrentam problemas reais, como mulheres que tem de lidar com maridos abusivos, pedofilia, submissão, num lugar onde nem tudo o que parece é e, onde absolutamente ninguém está acima de qualquer suspeita