A barata

A barata Ian McEwan




Resenhas -


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edu basílio 21/10/2020

ao vencedor, as "baratas"

o ponto de partida é um elegante tributo invertido a "a metamorfose", o clássico de kafka:
uma barata acorda e se vê transformada em um ser humano. ela deve se levantar logo, pois está encarregada de levar a termo a implementação do reversalismo na inglaterra. a qualquer custo.

[reversalismo: uma nova forma de estruturação macroeconômica que consiste na inversão do fluxo de dinheiro (as pessoas pagariam para trabalhar e receberiam ao consumir) e que resgataria a soberania e a supremacia nacionais inglesas].

são a densidade da prosa e o brilhantismo técnico de mcewan (cuja obra aliás nunca foi "sócio-politicamente inócua") postos a serviço da construção de uma sulfurosa crítica ao BrExit -- e, de maneira mais ampla, aos populismos ultranacionalistas que começaram a pipocar globo afora nos últimos 5 anos... em um conto de apenas uma centena de páginas, ele conseguiu tecer mais uma superinteligente metáfora mesclada da con(tra)dição humana e da política retrógrada de seu país (mea culpa: pudera eu apontar o país dos outros como retrógrado com a cara limpa!).

... e permanece a questão: em que diferimos das baratas, esses insetos nojentos, se -- como atestam sem parar os noticiários sérios -- fabricamos o tempo todo com as próprias mãos os abismos cheios de esgoto em que vamos pular?

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andre 21/10/2020minha estante
esse último parágrafo, caramba, deu vontade!


edu basílio 21/10/2020minha estante
andré, eu que me enrolei, mas você leria em uma sentada...
o livro é ótimo! se ler, compartilha suas impressões! ;-)




Leila de Carvalho e Gonçalves 03/02/2020

Reversalismo
A Barata? é uma sátira política de autoria de Ian McEwan cujo tom remete a Jonathan Swift e seu ponto de partida é ?Metamorfose?, um clássico da literatura escrito por Franz Kafka.

Considerado como um conto longo, são apenas 103 páginas, o livro começa numa manhã, quando uma barata acorda depois de um sono inquieto e constata que não é mais uma barata... Tornara-se uma criatura gigantesca e monstruosa, um humano, e não se trata de qualquer humano mas de Jim Sams, Primeiro-Ministro do Reino Unido.

Apesar de McEwan afiançar que os nomes e personagens são produto de sua imaginação e qualquer semelhança com baratas reais, vivas ou mortas, é uma simples coincidência, fica claro para o leitor que a tal barata é uma projeção de Boris Johnson e a história é uma resposta literária para o dilema do Brexit. Por sinal, comecei a ler o conto em 31 de janeiro, dia que a Inglaterra saiu da União Europeia, fato que comprova a atualidade e o interesse que pode despertar a obra.

Entretanto, ?A Barata? não é apenas sobre um inseto transformado em Primeiro-Ministro. Também apresenta um governo que consegue convencer seus cidadãos de que a Inglaterra só voltará a ser a grande potência que foi no passado, caso adote uma doutrina econômica sem pé nem cabeça chamada ?Reversalismo?.

Sinteticamente, ela inverte o fluxo de dinheiro, logo quem trabalha, paga; quem gasta, ganha. Por exemplo: no final de uma semana de trabalho, o funcionário dá dinheiro à empresa por todas as horas que trabalhou, mas quando vai às compras, recebe uma quantia por cada item que leva.

Dividida em quatro capítulos e um Posfácio, a narrativa apresenta o desenrolar de um plano para aprovar essa medida. Ele conta com um Ministério aparentemente formado por outras baratas, uma população instável, sujeita a mídia digital e não digital, além do apoio de Archie Tupper, Presidente dos Estados Unidos, e da desaprovação de uma não nomeada Chanceler da Alemanha.

Se ficou curioso com o destino do Reversalismo e do ortóptero protagonista, adquira o livro, mas posso adiantar que o humor transcende qualquer reflexão mais séria aplicável à realidade. Afinal, como afirma McEwan: ?Se a razão não prevalece, talvez só nos reste o riso.?

Nota: Adquiri o e-book e recomendo.
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Diego Rodrigues 12/04/2021

"Se a razão não abrir os olhos e prevalecer, então talvez só nos reste o riso"
"Naquela manhã, Jim Sams, inteligente mas de forma alguma profundo, acordou de um sonho inquieto e se viu transformado numa criatura gigantesca." Com essas palavras Ian McEwan dá início a essa "Metamorfose" às avessas, na qual uma barata acorda no corpo de um humano, mas não de um humano qualquer, Jim Sams ocupa o cargo de primeiro-ministro da Grã-Bretanha. As referências a obra de Kafka param por aí e a partir desse a ponto McEwan, no melhor estilo Jonathan Swift, trilha o caminho da sátira. "A Barata", novela publicada pela primeira vez em 2019, foi inspirada nos acontecimentos que giraram em torno do Brexit (a saída do Reino Unido da União Europeia) e reflete as tensões políticas que têm assolado o mundo atual. Aqui McEwan constrói um intrincado jogo político que envolve movimentos populistas, patrióticos e de extrema direita. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência!
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Na trama o ministro-barata usa do populismo e se aproveita da polarização do povo para implantar um sistema que promete "purificar" o país: o reversalismo. Sistema no qual o fluxo do dinheiro é invertido: paga-se para trabalhar e ganha-se ao adquirir um produto ou serviço, e é estritamente proibido economizar dinheiro. Apesar de todos os alertas que recebe de especialistas para as consequências que uma ação radical como essa pode trazer, Sams, impulsionado pelo grito popular, decide levar seu plano adiante, custe o que custar, e para isso vai usar de ferramentas como fake news, cortina de fumaça e todos os ardis políticos que sua privilegiada posição lhe permite.
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Muito mais que uma homenagem a Kafka, a escolha da barata para desempenhar o papel de um político é muito significativa. Logo após a transformação nosso primeiro-ministro lembra com nostalgia dos seus dias de barata, quando rastejava em meio a excrementos e comia moscas à vontade. Mas ao longo da narrativa ele vai percebendo que os jogos políticos podem ser tão excitantes e divertidos quanto. Aliás, o humor se faz muito presente na obra e como o autor diz em seu posfácio: "Se a razão não abrir os olhos e prevalecer, então talvez só nos reste o riso". Rir é bom, mas que a nossa razão desperte o quanto antes, e esse livro é um ótimo despertador!

site: https://discolivro.blogspot.com/
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Peleteiro 26/04/2020

Uma sátira perfeitamente bem desenvolvida a partir da modelagem da metáfora de Kafka, onde, certo dia, uma barata acorda metamorfoseada num repugnante primeiro-ministro. Apesar de não me prender a atenção por conta da minha falta de aproximação ao tema, o posfácio conclui com uma excelente crítica sobre o problema da estupidez que assola todo o mundo, e ajudou a contextualizar o que foi apresentado. Para aqueles que estão cientes de todas as intempéries da Brexit, é um prato cheio.
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Desireé (@UpLiterario) 27/08/2020

A inteligência dos insetos. (@upliterario)
A Barata é uma excelente sátira política sobre o Brexit, que busca retratar, ainda, a instabilidade política global atual. Nossos governantes, seja no Brasil, na Europa ou nos EUA parecem tomar atitudes cada vez mais contraditórias e, muitas vezes, irrefletidas. Mas não seria isso o sinal de que há alguma explicação (i)lógica por trás de seus absurdos? Logo na primeira página, A Barata já entrou para a lista dos meus livros favoritos.
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Utilizando como base o clássico A Metamorfose de Kafka, outro livro que adoro e admiro, Ian McEwan conta a história de uma barata que, certo dia, acorda no corpo do primeiro ministro britânico. E, a partir daí, todas as decisões políticas do país e sua luta incansável para estabelecer o Reversalismo nos mostram como um líder político tem grande poder sobre uma nação.
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Fiquei bastante surpresa e empolgada com a leitura, que flui rapidamente, de forma divertida e bastante inteligente. Admiro e sou fã de carteirinha de McEwan, mas sua sátira me convenceu, ainda mais!, de sua genialidade. Os feitos de Jim Sams - primeiro ministro inglês na história - e suas peripécias para aprovação da teoria monetária de reversão da cadeia do dinheiro demonstram como o mundo em que vivemos está realmente do avesso e poucas coisas ainda são capazes de nos surpreender, após o Brexit, a regressão econômica mundial e a pandemia de COVID-19.
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Atual, sarcástico e feroz. Uma leitura para ler, sorrir (de desespero!) e refletir. Recomendo!

site: www.instagram.com/upliterario
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Felipe.Camargo 06/02/2022

Uma sátira dos tempos atuais...
Imaginem que uma barata acorda e de repente ela é o primeiro ministro do Reino Unido...

Essa é a ideia inicial do genial McEwan para ilustrar em uma breve narrativa sobre os absurdos kafkianos que passaram a ser cotidianos no cenário político global. De Boris Johnson, passando por Trump e Bolsonaro, o autor polemiza em uma grande sátira que demonstra o quanto a irracionalidade passou a ser a norma.

Autor genial, pretendo ler mais livros!
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Sil 10/04/2020

Para amantes de política
A Barata é uma sátira politica que faz um paralelo com um assunto muito atual: Brexit. Apesar de ser atual é um assunto que poucos sabem e/ou entendem, assim como eu. Então fui ler o livro pela curiosidade de ler algo do autor que eu sei ser tão renomado.⁠

Infelizmente eu não peguei a obra em uma boa época, seja pessoal ou literária. Então o livro não me agradou tanto quanto eu esperava. Não, isso não significa que seja um livro ruim, pois no meu ponto de vista o autor soube sim cumprir com a sua proposta.⁠

A Barata já começa fazendo uma referencia ao clássico A Metamorfose, de Kafka. Apesar de eu não ter finalizado a minha leitura do clássico ainda a referencia é muito interessante, apesar de ser feito o caminho inverso. Basicamente as baratas do livro são os políticos, que eram esses seres asquerosos e se transformaram em seres humanos. O conto, de uma forma geral, conta a rotina do primeiro ministro do Reino Unido e seu ponto de vista a respeito do Brexit e suas artimanhas para que ele seja aprovado. ⁠

Para quem adora politica esse livro é mais do que recomendado, assim como para quem ama Kafka e principalmente o próprio Ian McEwan.⁠

site: www.kzmirobooks.com
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Diogo 25/05/2020

Tinha grande expectativa em relação a esse livro por "Enclausurado", do mesmo autor, ter sido uma das melhores leituras que fiz ano passado. Mas em "A Barata" não senti a mesma verve criativa, infelizmente.

A ideia geral, satirizar as relações político-sociais em torno do Brexit, é muito boa. A execução deixou a desejar. Analogias óbvias (usar baratas no lugar de políticos, por exemplo), personagens unidimensionais e muito parecidos com suas contrapartes do mundo real (Trump, no texto, é Tupper, um político magnata, dono de prédios, misógino, racista, ultranacionalista, usuário fervoroso do Twitter com seus discursos inflamados e cheios de fake news) enfraquecem demais a obra. A homenagem à Metamorfose não faz juz ao livro de Kafka. Pior ainda quando ele explica, justifica e escancara todas as escolhas narrativas, como se já não estivesse claro o suficiente para os leitores.

Enfim, é uma obra infantilizada, mas que ainda assim consigue exprimir alguma graça por vezes.
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Paulo Silas 20/07/2020

Com o humor refinado de Ian McEwan, "A Barata" se situa como um romance satírico no melhor 'estilo Jonathan Swift'. O enredo traz uma sátira política sobre as vicissitudes da sociedade em geral em sua perspectiva política na contemporaneidade, estabelecendo um enfoque notório sobre a polêmica questão do Brexit. É através da narrativa ficcional, portanto, que o escritor lança luzes reflexivas (críticas através do riso) sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, além de questões tantas envoltas à problemática, narrativa essa que, conforme aponta o autor, fica aquém da própria realidade que visa questionar na obra.

"Naquela manhã, Jim Sams, inteligente mas de forma alguma profundo, acordou de um sonho inquieto e se viu transformado numa criatura gigantesca" - assim tem início a história de "A Barata", apresentando ao leitor a transformação pivô do enredo de uma barata em um humano. A partir disso, com um dos mais repugnantes dos insetos assumindo a forma do primeiro-ministro da Grã-Bretanha, tem-se início ao processo do reversalismo: uma proposta de inversão do fluxo do dinheiro - as pessoas recebem dinheiro ao consumir coisas, devendo gastá-lo com o trabalho. A barata, protagonista da história, não medirá esforços para concretizar sua proposta populista, por mais que isso fira as bases democráticas que sustentam a nação. É a desenvoltura de todo esse plano político posto em prática, com seus meandros e escombros não confessados abertamente, que o leitor acompanha nessa ácida narrativa de Ian McEwan.

O aspecto kafkiano presente na obra é outro elemento perceptível, porém, que nela está num sentido próprio - inverso, talvez: é a barata que se transforma no humano, servindo tal alusão como algo que constitui a personalidade do protagonista (e não apenas de Jim: num contato telefônico entre o primeiro-ministro e o presidente dos Estados Unidos, Tupper, questiona-se o personagem que faz uma clara referência à Donald Trump não seria também uma barata transformada). Como evidencia o próprio Ian McEwan no posfácio do livro. "muitos perguntam se o processo do Brexit extrapolou a sátira. Que romancista perverso seria capaz de imaginá-lo? Ele é, em si mesmo, uma tortuosa autossátira. Talvez só nos reste a zombaria, a tristonha consolação do riso" - e é justamente amparado nessa crítica evidente que o escritor constrói a sua história. Nacionalismo exacerbado, hostilidade aos "de fora", aposta em soluções simplistas para questões complexas e outras questões nesse âmbito são trabalhados nesse pequeno livro de Ian McEwan - merecendo a leitura!

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@szpbl 03/05/2020

E daí?
O livro saiu em janeiro de 2020. Mas, de alguma forma, já se tornou mais atual do que quando foi lançado. A pandemia mostrou como ser liderado por baratas que não querem outra coisa a não ser girar o mundo do avesso não parece tão surreal assim.

De maneira divertida, Ian McEwan apresenta a história da barata que se tornou o primeiro ministro do Reino Unido e apresenta o projeto reversionista que favorece a si e aos seus, sem se preocupar com o bem estar das pessoas. Muito pelo contrário, por sinal, o bem estar das pessoas é o que os reversionistas tentam combater.
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Andrizy 17/11/2020

“Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso.” Qualquer um reconhece o genial início de A Metamorfose de Franz Kafka, seja o verdadeiro bookworm ou mesmo o leitor casual. Ainda que não tenha lido a obra, já ouviu falar desta que é uma das mais célebres aberturas de livro da literatura e conhece de imediato sua procedência. E ainda que você não se encaixe em nenhum dos dois grupos citados, não curta e nem consuma livros, e ainda assim teve um clique ao ler o começo da desafortunada aventura de Gregor Samsa neste texto, deve ser porque certamente se deparou com o trecho em uma prova do vestibular ou Enem.

Ian McEwan, o badalado autor de Reparação, dá início à narrativa de A Barata prestando uma evidente homenagem ao clássico de Kafka. No entanto, a situação se inverte. Neste, é a barata que, certa manhã, acorda em uma cama transmutada em uma criatura monstruosa: um homem. Mas não se trata de um homem qualquer e, sim, do Primeiro Ministro do Reino Unido. Com a metamorfose, vem uma carga ininterrupta e inesgotável de responsabilidades e decisões a serem tomadas. Como a barata não tem nada a perder em um corpo que não lhe pertence, mas que será devolvido ao dono em breve, metamorfoseado em Jim Sams, a criatura dá início à execução de um tão engenhoso quanto absurdo plano, o Reversalismo. Isto é, além de inverter a lógica da clássica obra de Kafka, a ideia é inverter também o fluxo do dinheiro. Desse modo, as pessoas pagam para trabalhar e ganham dinheiro para consumir.

Medida econômica recebida não apenas com compreensível descrédito, mas com indignação por alguns membros de seu próprio partido, pelo ministro do Exterior, pela Chanceler Alemã e alguns setores da sociedade, mas que cresce gradualmente no conceito de Archie Tupper, Presidente dos Estados Unidos, e ganha o apoio fervoroso da classe trabalhadora e idosos. Em discursos inflamados, Jim Sams enfatiza que a proposta visa um futuro próspero para o país. A ordem é combater o staus quo. O protagonista lança mão de seu recém-adquirido carisma (desde que o inseto começou a habitar seu corpo) e de um sem-número de estratégias corruptas, antiéticas e dissimuladas para fazer passar sua doutrina. Inclusive, sem se importar em derrubar vorazmente os antagônicos à sua ideologia durante o processo, os chamados “continuístas”.

Embora, o ponto de partida remeta à Metamorfose de Kafka, o próprio autor admite que sua principal influência na criação e estruturação de seu conto longo de 103 páginas, é o texto satírico do panfletário Jonathan Swift e o resultado é uma metáfora bem sacada do Brexit. Nas palavras do próprio autor, o livro “foi concebido naquele ponto em que o desespero se encontra com o riso. Mas as pessoas se perguntam se o processo do Brexit extrapolou a sátira”.

Para os que não estão familiarizados e encontram-se sempre desatentos às notícias e desconectados da realidade (adeptos da filosofia de que a ignorância é uma bênção), Brexit trata-se de um acrônimo para British exit, isto é, saída britânica em bom português e refere-se à decisão do Reino Unido de retirar-se da União Europeia (união econômica e política formada anteriormente por 28 países independentes, em sua maioria europeus, fundada em novembro de 1993 e cujo objetivo é a prática do livre comércio entre os componentes do grupo e a facilidade de suas respectivas populações transitarem entre esses países, podendo residir e trabalhar em qualquer parte do território do UE). Em julho de 2016, foi realizado um plebiscito no qual os britânicos poderiam votar pela permanência ou pela saída da União Europeia. 52% dos eleitores votaram pela retirada do país do bloco. Inicialmente agendado para 29 de março de 2019, o processo foi adiado e, finalmente, concretizado em 31 de janeiro de 2020, o que torna A Barata de McEwan uma obra extremamente atual.

A escolha por representar a política por meio de um inseto considerado repugnante e desprezível por tantos não é aleatória. Além da aparência abjeta, de se infiltrar no meio da sujeira, de sua presença ser um indicativo de parca higiene e acúmulo de lixo, vem bem a calhar como representação do britânico Boris Johnson, Primeiro-ministro do Reino Unido e líder do Partido Conservador.

Em uma sátira política bem engendrada, Ian McEwan debate com agilidade e sagacidade surpreendentes as artimanhas e jogos sujos no meio político, o poder e a influência da imprensa sensacionalista e mais tradicional, e o caráter incisivo e acusatório das mídias digitais. Embora desnecessário e redundante, o posfácio elucida muitas de suas metáforas, mas esse aspecto em nada prejudica a obra. O escritor expressa preocupação se obteve êxito ou não com sua invenção de Reversalismo. Particularmente, estou certa de que sim. A narrativa é funcional e ainda conta com o charme de ser revestida de fina ironia. Pode não se converter em um clássico atemporal como A Metamorfose de Kafka ou ter a importância histórica do texto de Swift, que pautaram o enredo de A Barata. Mas, ainda assim, é um necessário e certeiro reflexo destes dias. E não à toa, o autor cita o Brasil em dois momentos em seu posfácio.

“Se a razão não prevalece, talvez só nos reste o riso.”

site: https://bloggallerya.com/2020/07/08/a-barata-ian-mcewan/
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Aguinaldo 12/03/2020

a barata
Neste pequeno conto Ian McEwan nos oferece uma terrível fantasia, uma sátira contemporânea, uma narrativa irônica, uma descrição alegórica dos desatinos aos quais se aferram quase sempre os homo sapiens, por mais educados, socialmente homogêneos e economicamente abastados que sejam. Invertendo a conhecida fórmula de Kafka, McEwan inventa uma barata cuja mente se apodera do corpo de um primeiro ministro inglês. E, a partir deste mote, oferece ao leitor imaginar um dos infinitos mundos possíveis decorrentes de nossas escolhas cotidianas (no caso específico dele, a decisão inglesa de romper com o Mercado Comum Europeu, o Brexit). Esse conto foi publicado antes que McEwan soubesse do desfecho das eleições inglesas de dezembro de 2019, eleições que confirmaram a maior vitória do partido conservado em sua história, e que garantiu a Boris Johnson, o atual primeiro ministro inglês ampla maioria parlamentar, caminho fácil para oficializar a saída definitiva do Reino Unido da união europeia. Caso soubesse do real tamanho da derrota trabalhista McEwan provavelmente seria ainda mais sarcástico e cruel em seu livro, sobretudo com a personagem que representa o tolo Jeremy Corbyn (já sabemos que a realidade sempre será muitas vezes mais surpreendente que qualquer invenção literária, não nos iludamos). Não há muito sobre o que falar deste livro sem roubar o prazer individual e solitário da leitura. McEwan povoa seu texto com críticas ao populismo e a ignorância do eleitorado inglês, fala num tom amargo das regras de conduta e hábitos dos ingleses, ilustra nossa especial vocação para destruição e morte, pulsão que quase sempre nos domina, nos define. Dificilmente um leitor pouco familiarizado com o Brexit e as circunstâncias que regram as eleições gerais na Inglaterra poderá aproveitar adequadamente este livro, mas quem se importa. Divertir-me à beça com as amalucadas associações de Ian McEwan, mas a vida segue, as baratas estão em todas as partes e certamente sobreviverão aos homo sapiens. Vale!
Registro #1501 (contos #171)
[início: 05/03/2019 - fim: 07/03/2019]
"A barata", Ian McEwan, tradução de Jorio Dauster, São Paulo: editora Schwarcz (Companhia das Letras / Penguin Random House), 1a. edição (2020), brochura 14x21 cm., 102 págs., ISBN: 978-85-359-3310-9 [edição original: The Cockroach (New York: Anchor Books Knopf Doubleday Publishing Group) 2019]
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regifreitas 25/03/2020

A BARATA (The cockroach, 2019), de Ian McEwan; tradução Jorio Dauster.

O que me chamou a atenção nesta obra foi a premissa - certa manhã, uma barata acorda transformada em um ser humano -, que dialoga diretamente com o clássico kafkiano, A METAMORFOSE. Contudo, somente a ideia inicial é boa, e após um promissor início, McEwan se perde no desenrolar da narrativa. Toda a sutileza que existe na novela de Franz Kafka, a mestria em deixar nas entrelinhas mais do que é dito no próprio texto, é convertido, no trabalho de um dos mais célebres autores ingleses contemporâneos, em uma crítica escancarada e irregular ao Brexit. Talvez por conta da proximidade histórica desse evento, essa crítica se torne óbvia demais e, daqui uns anos, a obra possa ganhar uma relevância maior, para uma geração que não presenciou esses acontecimentos.

Mas isso também me fez refletir se as armas da sutileza ainda funcionam ou são eficazes nesses tempos em que a ignorância, a burrice e o oportunismo predominam. Talvez nesses casos, um ensaio ou um artigo de opinião contundentes e diretos sejam mais produtivos do que tentar despertar a consciência através de algo mais perspicaz e menos panfletário, como deveria ser o texto literário.

Nesse sentido, o posfácio do autor funciona mais em transmitir suas ideias e opiniões sobre o assunto do que o próprio conto.
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Maria Clara 14/06/2020

Esperava outra coisa do livro, mas gostei bastante do que ele ofereceu!
Um livro muito interessante! O melhor, para mim, é que essa sátira, abertamente direcionada ao Reino Unido e ao Brexit, possui tons universais. Não é difícil traçar paralelos com a narrativa apresentada, tampouco reconhecer algumas baratas entre nós.
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Jonathas25 06/08/2020

A BARATA
"Naquela manhã, Jim Sams, inteligente mas de forma alguma profundo, acordou de um sonho inquieto e se viu transformado numa criatura gigantesca."
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Assim começa essa pequena novela de Ian McEwan, em uma clara referência ao livro "A metamorfose", de Kafka. No entanto, ao contrário do clássico do escritor tcheco, em "A barata" a transformação se dá de maneira inversa: é o inseto que se metamorfoseia em um ser humano.

A barata toma conta do corpo de Jim Sams, primeiro ministro da Grã-Bretanha, e tem como objetivo implementar o Reversalismo, uma política econômica que pretende reverter o fluxo do dinheiro: as pessoas pagariam para trabalhar e receberiam ao fazer compras.

Por mais absurda que essa proposta pareça, ela acaba ganhando popularidade. Os reversalistas apresentam a sua causa como a solução para todos os problemas da sociedade, manipulam o sentimento de nacionalismo e recorrem às fake news para atrair cada vez mais adeptos.

E é aí que está o brilhantismo dessa obra. Ela é uma sátira política sobre Brexit, saída da Grã-Bretanha da União Européia. Ian McEwan usa a imagem de uma barata (do latim "blattodea", criaturas que evitam a luz) para tecer uma crítica feroz aos movimentos populistas que vem ganhando força no mundo.

EUA, Brasil, Grã-Bretanha, Ucrânia, Índia, etc, todos esses países estão sendo dominados por um populismo de direita que têm bases comuns: "extrema irracionalidade, hostilidade contra estrangeiros, resistência à análise paciente, desconfiança dos 'especialistas', fanfarronice nacionalista, crença fervorosa nas soluções simples, anseio por uma suposta 'pureza' cultural - e um punhado de políticos cínicos desejosos de se aproveitar de tais impulsos".

Esses movimentos acabam abalando as instituições democráticas e se mostraram ainda mais perigosos diante da pandemia que estamos enfrentando. Não é por acaso que esses países lideram o ranking de mortes por covid-19 no mundo. O negacionismo e a irracionalidade cobram o seu preço.

Diante do absurdo em que a realidade se transformou, o livro de Ian McEwan nos aponta um caminho: "se a razão não abrir os olhos e prevalecer, então talvez só nos reste o riso".
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