Aos outros só atiro o meu corpo

Aos outros só atiro o meu corpo Maria Isabel Iorio


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Aos outros só atiro o meu corpo





Existe literatura feminina? Essa pergunta nos é feita sempre a nós, poetas-mulheres, e de certa forma ela nos persegue. Ainda que gênero seja uma invenção, a divisão sexual do trabalho e os papeis sociais impostos às pessoas que se autoidentificam como mulheres* é muito real e esses fatores influenciam nossa escrita, óbvio, porque influencia a nossa vida. Assim sendo, é claro que existe uma literatura feminina, por mais raiva que eu sinta em aceitar. Só que esse aspecto, que por séculos foi limitação, vira elemento emancipador, a partir do momento em que nos acotovelamos para dar a nossa versão dos fatos: se é nesse mundo, e não em outro, que vivemos, e se as coisas são assim, e se há coisas que só um corpo de mulher sabe, então é disso, meu amor, desse corpo nesse mundo, de que falaremos.

Nesse sentido, a poesia de Maria Isabel Iorio vem como um coquetel molotov atirado por alguém que está sozinho, mas sozinho está no meio da multidão, dentro desse protesto infinito que é ser mulher, e que é ser mulher brasileira desde 2013. “Aos outros só atiro meu corpo”, que começa com a palavra chupar e termina com a palavra falar, é um livro sobre a solidão que historicamente nos persegue em todas as nossas facetas – poetas, mulheres, feministas, esquerdistas.

Como diz a própria autora, existem ofícios, hábitos e acontecimentos que só podem ser feitos quando estamos sozinhos – “cortar as unhas depois do banho”, “lembrar escovar os dentes de trás”. Ser preso político. Morrer. Morrer trabalhando. Morrer de desgosto, desistir. Morrer não em outro, mas neste mundo – o de Brumadinho, de Suzano, o de Damares, onde podemos contar com tão pouco, onde nem mesmo a dor é companhia certa, porque “parece que a dor também se atrasa”. Mas esse é o mesmo mundo onde nossos dedos tremem quando adentram o corpo que amamos, onde “qualquer boca é metade de um beijo”.

O livro de Maria Isabel Iorio não vai te afagar, talvez porque seja 2019, talvez porque ela confie que nós, seus leitores, precisamos menos de afago e mais de sustos. De menos aviso de gatilho e de mais coragem. Eu não sei o que Bel queria com esse livro, mas sei que ele está situado, pensando em nós e existindo entre nós, no Brasil 2019. É esse seu maior feito.

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Bárbara
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