Imaginemos um homem contemplando um espelho. O que ele enxerga? Sua imagem, sim. Mas entre sua imagem refletida e ele, o que existe? O tempo finito que se afirma na sua efêmera existência, sua impermanência. O espelho não nega o tempo nem as nossas rugas que são assinaturas da nossa mortalidade inscrita em nossos corpos. Nesta contemplação, o homem se percebe inteiro no espelho. Mas imaginemos esse espelho quebrado e o homem não consegue se ver mais em sua completude. Ele se percebe em imagens fragmentadas quando tenta reunir os pedaços. Recompondo o espelho em destroços sua imagem também fica tão quebrada quanto a do espelho. O que ele descobre? Não apenas o espelho, mas ele mesmo é feito de vidro. Mas este homem em reflexão ainda se pergunta - como não pude ver o fragmento da minha imagem antes do espelho quebrar? Maldita ilusão! Quando sei que sou vidro, a minha beleza está nesta consciência e não na minha ilusão. Não é o espelho que revela a minha finitude e fragilidade, é a minha consciência, é o conhecimento que tenho sobre a minha mais fundamental natureza: a do fragmento que se esconde por trás da aparente solidez de um espelho que nunca foi quebrado. No final não somos uma unidade, somos fragmentos. A minha beleza não está no que dura, mas na minha resistência em durar e durar com o que faço do vidro que sou, ou seja, com o que não dura. O fragmento me define, o vidro me revela. Mas ainda assim posso e devo brilhar, na exata compreensão da minha natureza legítima. Se não posso ser o sol, serei o espelho que o refletirá.
Filosofia / Psicologia