Pedróviz 07/01/2023
Medo Imortal
Medo Imortal não me convenceu muito, embora não tenha sido uma má experiência literária. Embora seus contos não sejam de dar calafrios ou de fazer com que se fique imaginando coisas ao ouvir ruídos em casa na calada da noite, há momentos em que alguns contos desfilam a perversidade, a miséria humana. Mas decididamente o "medo" que procuro em histórias de terror (será que procuro mesmo?) está quase ausente neste livro. Não há o clima ideal na maioria dos contos.
Um dos contos que eu considero tenebrosos neste livro é A guarida de pedra, de Fagundes Varela, onde de fato é posto em cena o sobrenatural, o desconhecido, de forma franca.
Os contos, de Coelho Neto, também têm um belo toque sobrenatural, inquietante, especialmente A casa "sem sono".
Aluísio de Azevedo com seu conto Demônios mostra aquele estilo lovecrafteano que para mim são águas passadas.
Dos contos de Machado de Assis, os melhores, no livro, são os clássicos O motivo secreto e Pai contra mãe, contos que são menos medonhos do que inquietantes.
O clássico gótico Noite na taverna, de Álvares de Azevedo, reúne muita torpeza, vício e loucura, mas em nenhum momento acrescenta o que prezo no horror, isto é, o sobrenatural.
Valsa Fantástica, de Afonso Celso, exibe com detalhes o horror de uma morte violenta, mas não creio ser terror. É um texto para satisfazer a morbidez do leitor.
Inglês de Souza apresentou bons contos do gênero: Acauã, O gado do Valha-me Deus e O baile do Judeu, três contos com enfoque no sobrenatural, no folclore: Terror leve.
O conto Palestra a horas mortas, de Medeiros de Albuquerque relata um ato de amor bem horroroso, mas nada tem de terror.
O soldado Jacob é outro conto desse autor, também focado no realismo, não havendo elementos sobrenaturais.
Afonso Arinos e seu conto Assombramento é um bom exemplo de terror do sertão. Terror mediano.
Os contos de João do Rio falam do horror das misérias humanas. Não há terror.
Os contos de Júlia Lopes de Almeida mostram o grande talento dessa mulher que colaborou na fundação da Academia Brasileira de Letras. Seus contos, embora ótimos, não são terror, mas em boa parte horror moral.
O livro fecha com o conto O defunto, de Thomaz Lopes, um conto que não é possível dizer que não seja terror, apesar de não haver elemento sobrenatural envolvido. De fato, um conto bem macabro.
Cabe fazer uma distinção entre horror e terror. O trecho abaixo foi copiado do blog CINEMARINO (cinemarino.blogspot.com)
"Terror está relacionado com o medo. É geralmente descrito como o sentimento de pavor que precede o evento aterrorizante. A alegórica antecipação em defrontar-se com o horror. Terror é o desconforto do corpo causado por algo que transcende o mais forte instinto de auto-proteção. É algo que faz com que se queira enclausurar-se em um salvaguardado refúgio. É uma resposta mental ao acontecimento. Terror é ainda o apogeu do medo: o susto. Após o susto, abrem se as portas para o horror ou para o alívio.
Terror é querer se esconder embaixo do cobertor para evitar o bicho-papão. É adentrar na floresta escura. Ou até fugir de um psicopata. Terror engloba o mistério e o desconhecido, e não a violência e o sangue.
Horror, em contrapartida, está diretamente relacionado com a repulsa. A simples existência de algo indigesto, de uma realidade sórdida que sentimos vontade de fechar os olhos para não presenciarmos. Uma angustiante sensação de repugnância. Uma aversão irreprimível a alguma teatralidade horripilante. Uma impressão física de espanto causado por algo medonho.
Horror é a característica reação a cenas de mutilação, estupro e assassinatos a sangue frio. Ou ainda torturas, deformações e rostos desfigurados. Horror geralmente está relacionado ao sentimento de repulsa que ocorre após se presenciar atos desse tipo."
Por isso afirmo que grande parte dos contos do livro não implicam em medo (terror), mas em repulsa (horror).