Filino 10/01/2024
Simplesmente incontornável
Esse texto de Peter Gay é, sem sombra de dúvidas, uma obra de referência - tanto no gênero biográfico como na história da psicanálise. Descrever a importância de tal empreendimento é tarefa ingrata: porque nas centenas e centenas de páginas o leitor vai se deparar com um Freud vivo, quase palpável, em seus aspectos mais grandiosos e cotidianos. Sim, aqui acompanhamos a vida de Freud, em detalhes tão esmiuçados que só as páginas de referências vão no número das dezenas. E ao final, um ensaio bibliográfico em que o autor confronta, capítulo por capítulo, diversas obras e autores, dialogando com eles - e explicando por que assumiu tal ou tal decisão, ao escrever o seu próprio texto. Ou seja, um verdadeiro banquete para qualquer um que estuda a fundo o pensamento e a história de Freud e da psicanálise.
Isso não quer dizer, contudo, que essa obra esteja ao alcance apenas dos "iniciados". Longe disso! Mesmo quem nunca percorreu uma linha do texto freudiano pode aproveitar e muito essa obra. Peter Gay é um mestre da narrativa. Desenrolam-se os relacionamentos de Freud com Breuer, Fliess, Jung, Rank, Ferenczi e outros. Os episódios de rompimentos são narrados com riqueza de detalhes. As alegrias e agruras desse personagem ímpar do século XX são descritas de um modo que captura o leitor, que avança sem sentir peso algum (apenas o das próprias dimensões do livro, que é volumoso).
No decorrer da biografia, o leitor é brindado com uma descrição ímpar da Áustria nos períodos antes/durante a Primeira Guerra/depois da Guerra, além da ascensão do nazismo. A vida em Viena, a rotina universitária de Freud... isso tudo e mais um pouco cercam o relato da vida do personagem dessa biografia.
E o leitor não especializado em Freud também tem contato, de modo bastante didático, com suas ideias. Sim, Peter Gay discorre didaticamente sobre vários escritos freudianos, desde os mais clássicos aos não tão conhecidos (mas igualmente importantes para a compreensão do seu pensamento). E essa exposição não é, de modo algum, cansativa: está intrincada com o relato da própria vida de Freud, complementando-o.
Um marco literário. Recomendadíssimo.