stchnard 25/06/2024
Uma expectativa quebrada (em trilhões de caquinhos).
Eu não lembro muito bem o que me deu de querer ler Memórias Póstumas de Brás Cubas, do Machado de Assis. Sempre achei qualquer resenha e qualquer publicidade sobre o livro muito entediante ou, como posso dizer? Indiferente.
Para mim, MPBC (preguiça de citar) era um conceito. Sabe, uma coisa que todo mundo entra em consenso às vezes, mas que para mim, era indiferente. Um livro muito prestigiado que narra uma história importante, uau, que interessante!
Nenhuma resenha, nenhuma opinião pública, nenhuma recomendação ou imposição me trazia vontade de ler essa obra Machadiana. Para mim, era só um livro importante para a Literatura como muitos outros. Eu estava bem confortável lendo Fantasia e Ficção Científica, então, para que me aventurar nisso? Talvez só para encher minha lista de “lidos”, né?
Bem, então, do dia para noite pensei: Hm, e se eu ler? É curtinho, acho que eu consigo matar, e talvez depois eu me sinta mais portador de um CPF.
É, entendi porquê tem gente que faz mestrado baseado NESTA obra.
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## **Início da resenha**
Bom, no início do livro eu achei absurdamente difícil. Sério, de verdade. Nas páginas iniciais eu precisava ler com um dicionário ao lado, e às vezes, até com o google aberto, o que me desestimulava a continuar lendo. Era uma leitura com termos datados, extremamente maçante e desinteressante. Brás Cubas não se importava em me cativar, e eu não me importava em lhe dar minha atenção.
Não sei se isso configura como um relacionamento abusivo, mas essa falta de pretensão com o contato de leitor e autor, e essa falta atenção que eu queria receber, só me fizeram, e é importante acrescentar que isso só aconteceu a partir da página 90, querer continuar. É realmente irônico como Brás Cubas QUEBRA a sua expectativa contando sua história da forma que ele QUER. E você que se contente com isso. A história é dele para ele, e não para você, sinto muito.
Acho que é isso que me deixou, por tanto tempo, e por tantas páginas, de nariz torcido para esse livro. É um livro que, sem ou com você, não faz diferença. O defunto autor (desculpe o spoiler) não se importa com o que você vai achar de sua mediocridade, de suas divagações egocêntricas e nem de suas próprias redundâncias. Ele não vai narrar para você o que você quer, nem do jeito que você quer.
Diferente do romantismo, Machado parte ao meio (badum-tss) e encaixa, de forma abrupta e nada discreta, o cinismo, o sarcasmo, o humor cru, o egoísmo e a objetividade à literatura brasileira. Ou seja, o realismo estava colidindo com o romantismo na terra tupiniquim.
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## **Brás Cubas**
Brás Cubas é, para mim, um jovem medíocre. Ele não tem fortes ambições, não tem sonhos ou aspirações. Faz parte da elite brasileira, filho muito amado em uma família bastante prestigiada. Nunca precisou, até os dezessete, se importar com o que fazer para viver. Na mocidade, sofreu de amor, de paixão juvenil, e sua primeira paixão tinha nome, Marcela. Seu pai, ao perceber quanto o menino morria de paixão pela moça, e não pelo seu sobrenome, decidiu mandá-lo para Portugal, para que se formasse na faculdade.
Brás Cubas não se dá ao trabalho de descrever muito os anos em que passou estudando. Ele não se importa e nunca se importou com isso. E fora com uma carta de seu pai anunciando uma enfermidade na família que Cubas retorna ao Rio. Após a morte deste parente, seu pai decide apertar o calo do já então homem Brás Cubas, querendo elevá-lo à política. E sem muito protestar, Cubas aceita. Ele é, segundo o dito popular, o camarão que dorme. Entretanto, até este plano é frustrado, e em frustração morre o pai de Brás Cubas.
O que é narrado em seguida é realmente interessante, mesmo que Brás Cubas não se interesse pelo meu interesse! A vida, suas divagações e digressões começam a ficar mais intensas, mais absurdas e mais melancólicas. É fato que algo começou a penetrar essa casca vazia que o defunto autor chamaria de carne, mas, por enquanto, minha única opinião sobre a personagem é esta: Brás Cubas não tem direção.
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## **Leitura**
Já se encaminhando pro final, eu ainda não faço a menor ideia de onde essa história vai parar. Creio que esta seja a experiência mor deste livro, você, a cada capítulo, se surpreende, tanto para o bem quanto para o mal. E, com para mal, me refiro ao ritmo. O livro é pesado em ânimo, e, por vezes, enfadonho, e que bom que o autor sabe disso. No capítulo “O senão do livro”, Brás Cubas revela que sabe como a leitura deve estar sendo para a maioria de nós, e que bom, pois isso me dá confiança de que ele sabe o que está fazendo!
Ainda sobre o ritmo, está realmente sendo difícil para mim continuar a imergir numa história que, até agora, não tem construção direta, são altos e baixos, assim como é a vida. Com capítulos curtos, percebe-se o fluxo de pensamento que Brás quer dar à sua obra, e com grande ênfase à paixão, é notório o ouro que guarda na obra, a de seu amor. Repito, não faço a menor ideia de para onde está se encaminhando a narrativa, assim como nunca a tive. Isso tanto me impulsiona pela curiosidade, quanto me repele pela lentidão. Mas, segundo Cubas, o grande defeito deste livro não é o seu ritmo e construção, e sim eu, que sou um leitor apressado.
E EU JURO que eu quero acreditar no potencial da obra, mas, de verdade, para quem está saindo de uma ressaca, é penoso e punitivo. Porém, para quem está com o sangue quente, deve ser uma experiência estupidamente única ver-se face à face com uma inteligência literária tão única. Reconheço a grandiosidade da obra por não querer ser o que não precisa.
Para o final, lá para 85/90% da obra, percebe-se que as personagens começam a ter seus finais. Eugênia, Marcela, Quincas, Neves… todos iam padecendo de coisas diferentes, até que, por fim, Brás. Isso trouxe à obra um clima mais sério do que a mesma gostaria de passar, eu penso. Talvez, Machado não quisesse que esse sentimento brotasse como aquela velha flor que brotou em Cubas, mas o solo foi, e não me pergunte de que forma, regado e adubado. Agora, não resta muito além das últimas palavras.
Brás morre de forma a lamentar seu saldo “negativo”: sem compadecer-se com a morte de Dona Plácida, e nem com a semidemência de Quincas; sem se tornar ministro; sem ser califa; o emplasto, não produziu ganhos; não desfrutou de um casamento. Nhã-Loló morrera, Marcela, passara, Eugênia, nem pensar, e Virgília? Inalcançável. E no final, não quis propagar a outro tudo o que tinha, isso é, não o ouro, mas a miséria.
Com certeza Brás Cubas foi um ser chato do início ao fim, e para mim, o Humanitismo de Quincas Borba me era sonolento. Calma, por que estou falando assim? Enfim. Acho que minha experiência com esse livro se baseia em duas coisas, a admiração e a penitência. Enquanto admirava a forma como Machado conduzia a história de Cubas, através de capítulos com humor sarcástico e que quebravam a quarta parede, sentia-me pagando por um crime que não cometi, pois o livro se arrasta, e se arrasta com força.
Creio que o que resume toda a minha experiência fora um capítulo que Machado acertara com precisão sobre mim: LXXI, O senão do Livro. Este capítulo é, sem sombra de dúvidas, aquele que resume a minha experiência como leitor. Ver que Machado ENTENDE isso, me dá confiança de que li o livro com olhos corretos, o que só me mostra quão brilhante o autor (não o defunto) é.
Brilhante, curioso, mas não, não leria de novo.
O livro é exatamente o que ele deve ser, e agora que terminei, mesmo não tendo tido uma experiência viciante, entendo melhor isso. Esse livro é o que é, da forma brilhante que é, sem ou com você, leitor, pois o maior defeito desta obra é, como diz Cubas, você.
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