PorEssasPáginas 21/03/2016
Resenha: Uma vida no escuro - Por Essas Páginas
Quando li a sinopse desse livro pela primeira vez, achei que se tratava de ficção, e das mais fantasiosas. Como assim uma pessoa não consegue viver na luz, nenhuma luz? Infelizmente, estava muito enganada. A história de Anna Lyndsey é real. Uma vida no escuro é uma das auto-biografias mais interessantes, angustiantes e belas que já li. Daquelas histórias que fazem com que você valorize cada pequena bênção em sua vida.
Imagine viver totalmente no escuro. Não estou dizendo apenas de evitar a luz do sol, como os vampiros das histórias de fantasia e terror, mas precisar se esconder num quarto completamente sem luz, seja natural ou artificial. Não é possível ler, nem livros de papel ou digitais, porque você não aguenta sequer a luz tênue do leitor ou a do computador. As necessidades básicas – comer, evacuar, tomar banho – precisam ser feitas rapidamente e na penumbra. Tudo isso de uma hora para outra, amputando sua liberdade e sua vida até o limite da sanidade.
“A amizade brota de uma sementinha discreta e, com o tempo, ganha raízes fortes que envolvem nosso coração. Quando um romance termina, a árvore é arrancada depressa numa operação dolorosa, mas clara. Já a amizade murcha silenciosamente, e sempre resta a esperança de que vá brotar de novo. Só depois de um tempo reconhecemos sua morte, e então passamos anos arrancando do peito fibras ressecadas.” Página 98
É assim que Anna Lyndsay vive. Por causa de uma doença que a incapacita de ficar sob qualquer luz, sob a punição de sua pele sofrer dores e feridas horríveis, ela passa seus dias dentro de um quarto escuro, ouvindo audiobooks, inventando jogos mentais de palavras cada vez mais desafiadores, tentando fazer o tempo passar. Ela tem o apoio incrível do marido, mas a vida não é nada fácil. É difícil continuar.
Mas ela vive, e é lendo esse livro que percebemos o quanto somos sortudos. Existem biografias completamente inúteis e equivocadas – e nós as vemos aos montes hoje nas livrarias -, mas essa é extremamente importante. A autora divide com o leitor suas angústias, desejos e inseguranças, sonhos, pequenas vitórias e inúmeros fracassos. É angustiante, mas também vibrante e inspirador. Anna Lyndsay descreve o antes da doença com nostalgia e a sua vida na escuro com melancolia e sensibilidade. Apesar da escuridão de seus dias, esse não é um livro sem luz, pelo contrário: é cheio de vida, cores e descrições repletas de sentimento e sinceridade.
“Chorar me traz alívio. Alguma substância química é liberada no cérebro, pelo que ouvi dizer, o que normaliza o humor, mesmo que a situação continue a mesma. Um sábio mecanismo de autocontenção, pelo qual, sem dúvida, devemos agradecer à evolução humana.” Página 105
A edição é confortável e caprichada, com uma capa aveludada repleta de pontinhos brilhantes, um deleite para a estante. Terminei o livro emocionada, torcendo de coração para que Anna (o nome é um pseudônimo e não se sabe realmente quem é a autora), onde quer que esteja, viva bem, viva feliz. E que as pessoas na mesma situação dela, ou em outras situações difíceis e limitadoras, fiquem bem e encontrem felicidade e paz da melhor maneira que conseguirem. Quanto a nós, privilegiados que somos, vamos valorizar o muito que temos.
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