spoiler visualizarDeco 29/08/2022
Não há guerra pior do que aquela travada entre irmãos.
O enredo desta obra se passa durante a Guerra Civil Espanhola (1936 até 1939), em uma área rural montanhosa, perto de Segóvia. Neste cenário surge Robert Jordan, um americano solidário as causas republicanas e comunistas que foi enviado como um “partisan” (uma espécie de sabotador ou guerrilheiro profissional) para cumprir uma missão especial. Durante um grande ataque que estava sendo planejado contra os franquistas, ele deveria destruir uma ponte que poderia ser usada para enviar reforços inimigos para aquele front. Uma missão quase suicida, tendo em vista que a detonação ocorreria de dia e não havia nenhuma boa rota de fuga da região.
O transcurso da história ocorre em apenas três dias de guerra, porém com uma intensidade arrebatadora. Neste curto período conhecemos cada um dos personagens com certa profundida, descobrimos suas histórias, seus sonhos e vemos sua ingenuidade morrer com o avanço da guerra.
Os ideais republicanos e libertários rapidamente deram lugar ao orgulho dos oficiais, à busca pelo poder dentro de cada partido político e dos movimentos revolucionários, e a brutalidades das lideranças campesinas, que justificavam sua crueldade como sendo necessária para a causa socialista. Algumas cenas icônicas como o “justiçamento” dos fascistas do povoado, a prisão dos mensageiros pelo general francês, e as diversas traições de Pablo, ao meu ver, retratam esse sentimento.
Apesar de ter lutado nesta guerra ao lado dos republicanos, Hemingway pintou seus personagens como imperfeitos, desleais e brutais, muitas vezes piores que os fascistas, contra quem ele mesmo lutou. Talvez seja isso que o autor sentiu quando participou deste conflito, assistindo a rápida decadência dos valores pelos quais se iniciaram a guerra, a divisão entre as tropas legalistas e a brutal violência que animalizou os homens.
Seus personagens, espanhóis criados como católicos fervorosos, sofriam com o dilema de ter que abandonar suas convicções cristãs para adotar a pragmatismo soviético, contudo, nos verdadeiros momentos de tensão, dor e desespero, voltavam-se para suas crenças originais. Nas palavras de Pilar: “talvez Deus ainda exista, embora O tenhamos abolido”.
No desenrolar da história, a intensidade e a violência com que são descritos os mais intensos combates, contrasta com o amor de Robert por Maria. Sua atração espontânea e quase imediata me pareceu ser a reação de ambos contra esta vida amarga no front. Seu amor foi a esperança e a força que os sustentou durante esses dias de extrema tensão durante as preparações para aquela missão suicida, algo como “a luz no fim do túnel”.
Esse livro reflete perfeitamente a brutalidade e a pressão psicológica de quem viveu uma guerra. Li alguns comentários reclamando do desenrolar da história, justamente por ser tão curto (apenas três dias, apesar das quase 700 páginas), principalmente sobre a impossibilidade do romance entre Robert e Maria, contudo, acredito ser justamente essa a ideia do autor. Seus diálogos simples, porém, intensos, refletem essa “nova vida” que nasceu, cresceu e morreu em três dias, tudo em um cenário implacável, solitário e desesperançoso. A intensidade dos fatos segue o turbilhão da guerra e mexe com o psicológico daqueles que são arrastados por ela.
Para mim, a obra é perfeita. Hemingway me fez entrar na cabeça de cada personagem, sentir todas suas emoções, entende-los como pessoas e viver intensamente o tempo que lhes foi dado.