spoiler visualizarMützen 09/06/2024
Uma obra, que apesar de seu título, mais fala da vida do que sobre a própria morte. Creio que, assim como foi comigo, essa será a porta de entrada para muitos leitores que querem beber do vinho de Lev Tolstói.
Apesar de ser ?apenas? uma novela, esse livro passa por temas de extrema relevância: fé, arrependimento, prioridades, família, status social, et cetera.
Muitos são Ivan Ilitch, mas estes só percebem isso demasiadamente tarde.
*HÁ SPOILERS NA SEGUINTE RESENHA*
?Sobre o sucesso
O livro nos conta a história de Ivan Ilitch, o qual se encontra na alta classe, possuidor de um cargo de extrema importância no meio jurídico, sendo o topo do próprio topo, inclusive sendo invejado até por seus contatos próximos. Ivan Ilitch é sinônimo de sucesso mundano, até os mais gulosos se contentariam se estivessem na posição dele.
Apesar disso tudo, apesar de sua riqueza física, faltava-lhe o imaterial. Os seus problemas no relacionamento com a esposa, a falta de contato com os seus filhos, a falta de fé, a ausência daquilo que poderíamos chamar de ?coração? foi a própria doença de Ivan.
Antes de se tornar doente (referente ao fígado) e ter sua morte garantida, Ivan acreditava ser grandioso, imbatível. E acreditava que a sua doença era um castigo, mas não entendia o porquê dele, achava, como ilusão de indulto, que não morreria. Afinal, alguém de tanto sucesso e relevância não poderia ter sua vida ceifada por uma simples queda cotidiana, poderia? Ilitch sofreu de um mal que muitos sofrem, o de não saber valorizar o que deveria receber valor.
A doença que Ivan tanto dizia ser seu castigo, mostrou-lhe que, na realidade, o castigo dele havia sido as suas próprias escolhas e que os sintomas dessa doença, nova para ele, foi o mais profundo arrependimento. Ilitch não apenas se arrependeu de ter valorizado mais o sucesso profissional que o pessoal, como se desestabilizou na própria segurança gerada pela arrogância. Pois, ele percebeu que sem o lado humano, de nada adianta o homem ter rios de dinheiro.
?Chorava a sua impotência, a sua terrível solidão, a crueldade dos homens, a crueldade de Deus, a ausência de Deus.?
?O doutor dizia que os sofrimentos físicos dele eram terríveis, e dizia verdade; mas os seus sofrimentos morais eram mais terríveis que os físicos, e nisso consistia a sua tortura maior.?
O verdadeiro sucesso não se mede através do tamanho de sua carteira. Não se mede através da quantidade de matéria vazia que alguém possui. Mas no preenchimento do vazio interno existente, por natureza, dentro de si é que se encontra uma forma de se chamar como ?um homem de sucesso?. O possuir uma esposa amada, uma família agradável, um circulo social de qualidade, o bem-estar espiritual e uma fé (não apenas religiosa) é o que faz um homem ser bem sucedido.
E no final, apesar de tanto temer morrer, há um dos momentos mais profundos da obra: ?Procurou o seu habitual medo da morte e não o encontrou?...?Em lugar da morte, havia luz?.
Muitos tentam fugir da morte ? uma ação literalmente instintiva ? mas aceitá-la e ter consciência de que ela é quem significa toda a vida humana é não apenas um ato de coragem, mas também de grandiosidade.
?Sobre escolhas
?Como se eu caminhasse pausadamente, descendo a montanha, e imaginasse que a estava subindo. Segundo a opinião pública, eu subia a montanha, e na mesma medida a vida saía de mim... E agora, pronto, morre!?
Destaco aqui tal trecho, pois nele é nítido o quão traiçoeiro é seguir a fala pública, no que se refere às massas. Ivan de fato subiu a montanha, mas apenas a montanha financeira, que é para o nosso mundo competitivo o que importa. Ilitch chegou no topo e se viu acima de muitos, porém se tornou vazio, abriu mão do ?coração? pelo bolso.
Encontrar um motivo para viver é ótimo. Ter consciência de sua finitude, de sua morte inevitável e encontrar valor nisso tudo é incrível. Mas esse valor, essa busca, não deve ter como fim aquilo que também cessa, aquilo que é material e não possui nenhum sentido que transcende isso.
A morte não é um mal, mas um chamado para se viver, tentar, cair e levantar-se.
?Todos nós vamos morrer. Por que então não me esforçar um pouco??